Alcôa vai ocupar antiga Casa da Sorte e promete preservar património
Loja concebida pelo arquitecto Conceição e Silva, com azulejos de Querubim Lapa, vai acolher a famosa pastelaria de Alcobaça. Proprietária garante que "nada vai ser tocado".
“Sabemos que é uma loja emblemática e queremos preservar o património arquitectónico e cultural, que para nós é uma mais-valia”, disse Paula Alves ao PÚBLICO. A concepção do espaço, situado na esquina da Rua Garrett com a Rua Ivens, é da autoria do arquitecto Conceição e Silva, que desenhou também o balcão, em 1960, e a decoração inclui azulejos do Mestre Querubim Lapa. “Jamais iríamos beliscar qualquer uma dessas coisas, vamos preservar”, sublinhou a dona da Alcôa, que alugou o espaço a um privado, cujo nome preferiu não revelar.
A loja de lotaria Casa da Sorte, que ali estava instalada desde 1963, fechou no Verão do ano passado. Na altura, o movimento de cidadãos Forum Cidadania Lisboa alertou a câmara para a “enorme perda patrimonial” que poderia representar para a cidade “um eventual roubo/mutilação/remoção dos azulejos do Mestre Querubim Lapa”. Nesta segunda-feira, os membros deste grupo voltaram a chamar a atenção da autarquia para a “necessidade de salvaguardar e estimar” o espaço.
O próprio Querubim Lapa, em Novembro, admitiu ao PÚBLICO estar preocupado com o futuro da sua obra. Ficou "aterrorizado" quando soube do encerramento da casa de lotaria. “A Casa da Sorte é toda em cerâmica, no exterior e no interior, e o meu receio é que venha a suceder o mesmo que na Loja das Meias, onde destruíram a cerâmica e nem tiveram o cuidado de tirar as peças para as oferecer ao Museu da Cidade.” Segundo o Mestre, a Casa da Sorte "antigamente era uma tabacaria, onde o Eça ia comprar os seus charutos”. Depois, o espaço transformou-se, no início dos anos 1960, com o projecto do arquitecto Conceição Silva, que convidou o ceramista para ali fazer uma profunda intervenção.
Em resposta a perguntas do PÚBLICO em Novembro, o Departamento de Património Cultural da Câmara de Lisboa esclareceu que a loja está “protegida”, por se inserir no Conjunto Classificado como de Interesse Público – Lisboa Pombalina. “Nessa medida, vem referenciada na Lista de Bens Imóveis de Interesse arquitectónico, histórico e paisagístico do PDM [Plano Director Municipal]”.
A autarquia reconhece que a loja tem “particularidades arquitectónicas e/ou decorativas relevantes, frequentemente associadas ao uso original do espaço, exigindo-se que as operações urbanísticas, nomeadamente as que visam a sua modernização ou alteração do uso, conservem a sua identidade arquitectónica e decorativa”. Em particular, os azulejos de Querubim Lapa também estão sob protecção da câmara, segundo o mesmo departamento.
No entanto, não é a obrigatoriedade da lei que leva Paula Alves a preservar a traça antiga. “Quem me conhece sabe que eu adoro tudo o que é antigo e tem história, e por isso quero manter tudo o que está na loja, só tenho pena que não haja ainda mais para preservar”, afirma.
A Alcôa tem uma tradição de quase 60 anos e além dos pastéis de nata – que lhe valeram o 1º lugar na competição do Melhor Pastel de Nata de 2014 – dedica-se “à centenária arte de bem confeccionar, em recipientes de cobre, os doces conventuais, seguindo a tradição dos Monges de Cister que habitaram a região de Alcobaça”, lê-se no site. Até agora, a pastelaria marca presença em Lisboa com uma banca no centro comercial El Corte Inglés, em São Sebastião. Quando abrir no Chiado, ainda não se sabe quando, será a concretização de “um sonho” que Paula Alves tem há muitos anos.