Nuno Crato interrompido por alunos que pedem a sua demissão

Ministro falava numa conferência em Lisboa e os manifestantes deram-lhe ironicamente os parabéns pela ciência e o ensino nunca terem estado tão mal como agora.

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Faixa dizia "Parabéns Crato! O ensino e a ciência nunca estiveram tão mal" DR

Pouco depois de Nuno Crato começar a discursar na conferência “Ciência e Inovação no Portugal 2020”, um grupo de dez manifestantes que estavam sentados numa das últimas filas do auditório do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG) levantou-se com uma faixa que dizia: “Parabéns Crato! O ensino e a ciência nunca estiveram tão mal.” O desfraldar da faixa foi acompanhado pelo rebentar de um canhão de festa que fez um estoiro – um som parecido com um tiro – e lançou confetti para o ar.

O ministro começou por responder com um sorriso e agradeceu os parabéns aos presentes no auditório do ISEG – Lisboa School Of Economics & Management. Mas, segundos depois, um novo canhão foi rebentado e mais papelinhos apareceram no ar. Os alunos foram então convidados a abandonar a sala, o que fizeram sem qualquer resistência, mas a faixa passou para a fila de cadeiras da frente e o protesto continuou.

Nuno Crato não suspendeu o discurso e, poucos depois, cerca de 20 alunos do ensino superior e investigadores começaram a gritar repetidamente “demissão”. Quando abandonaram o auditório, e em resposta ao protesto, o ministro respondeu: “Quando não há razão, apresentam-se estes argumentos.”

Filipa Gonçalves, estudante do ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa, explicou à agência Lusa que a acção pretende reivindicar junto do Governo e do ministro melhores condições para a ciência e para a investigação em Portugal. “Estamos aqui para exigir os nossos direitos e protestar porque as respostas deste ministro têm sido catastróficas, resultando nos problemas que se viram no início do ano lectivo (ensino obrigatório) para pais, alunos e professores”, acrescentou a aluna do ISCTE.

Um ano de protestos na ciência
Todo o ano de 2014 foi marcado por contestação às políticas científicas aplicadas pelo ministro Nuno Crato, pela sua secretária de Estado da Ciência, Leonor Parreira, e pelo presidente da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), Miguel Seabra.

A contestação começou com a revelação do número de bolsas individuais de doutoramento e pós-doutoramento atribuídas em 2014: 399 bolsas de doutoramento e 438 de pós-doutoramento. A isto, juntam-se ainda 431 bolsas atribuídas pela primeira vez a programas de doutoramento e que são geridas pelas próprias universidades. Somando todas as bolsas de doutoramento individuais e dos programas doutorais, em 2014 atribuíram-se 830 – o que significou um corte de 31% face ao concurso anterior, que deu 1198 bolsas. Também as bolsas de pós-doutoramento tiveram cortes, passando de 677 atribuídas no concurso anterior para as já referidas 438 de 2014 – uma redução de 35%. Estes cortes levaram a uma manifestação dos cientistas à porta da FCT.

Seguiu-se a contestação aos resultados da primeira fase da avaliação dos centros de investigação portugueses, apresentados no final de Junho, que definirá o financiamento para despesas correntes nos próximos cinco anos. A controvérsia centrou-se no facto de cerca de metade dos centros não terem passado à segunda fase da avaliação, o que significa que pouco ou mesmo nenhum dinheiro vão receber para as suas despesas – e os cientistas consideraram que isso levaria ao fim de muitos laboratórios. Soube-se depois que estava pré-definido, mesmo antes do início do processo de avaliação, de só passarem à segunda fase metade dos centros.

O processo de avaliação, que está agora a terminar, chegou em Julho ao plenário da Assembleia da República. E o Conselho dos Laboratórios Associados (CLA), uma rede de 26 centros espalhados pelo país, acusou o Governo de “irresponsabilidade política” e o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP) acabou por dizer que a avaliação não tinha “a necessária qualidade”, apresentava inúmeros erros factuais e era “uma oportunidade perdida” para a ciência.

No protesto desta quarta-feira, o grupo de alunos e investigadores do ISCTE e do ISEG chamou a atenção precisamente para a situação dos bolseiros de investigação, sublinhando que a “FCT está um caos”.

A conferência no ISEG, o instituto onde Nuno Crato era professor e investigador antes de assumir a pasta da ciência e da educação, visa reunir ideias e suscitar o debate acerca da melhor forma de aproveitar os instrumentos de apoio que irão estar disponíveis para a área da ciência. Além do ministro da Educação e Ciência, estava presente Leonor Parreira e a conferência terá ainda a participação de Miguel Seabra, do secretário de Estado do Desenvolvimento Regional, Castro Almeida, assim como de peritos e personalidades do domínio das políticas de investigação e desenvolvimento.

Notícia actualizada às 12h43