O Natal na terra estrangeira

Montam a árvore de Natal porque nada há por celebrar, nada há a festejar longe da família e do calor deste abraço, tão largo como a saudade

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Kevin Dooley/FLICKR

Montam a Árvore de Natal, todos os anos montam a Árvore de Natal na terra estrangeira, a qual desde há sete anos desenterra as vidas e os dias dos desterrados, espantados, mortos, não vivos, expatriados. Porque nesta terra estrangeira sobrevive-se, não se morre.

Montam a árvore de Natal, e montam a Árvore de Natal sozinhos, em silêncio, porque nada há por celebrar, nada há a festejar longe da família e do calor deste abraço, tão largo como a saudade. E por isso montam a Árvore de Natal, mas sem raízes, apenas ramos, e por cada ramo um familiar distante, por cada ramo um beijo por dar, por cada ramo uma raiva por gritar, por cada ramo uma história por contar. Mas aqui estão tão longe que ninguém os ouve, ninguém os sabe ou quer saber.

Aqui estão tão longe que só se têm um ao outro para viver e perder. E por isso, perdem, perdem os dias e perdem os anos, perdem a juventude e a idade, perdem os cabelos e os dentes na medida da pele enrugada, na medida dos dedos ossados, dos olhos encovados, encolhidos à sombra da morte. Mas para quê? Tudo isto porquê? Uma vida desmembrada a sangue a troco de quê, se em Portugal se morre de fome e cá fora não há tempo para comer? Porque se é para morrer de fome, ao menos que se morra descansado.

Montam a Árvore de Natal na esperança de um Natal, na esperança de uma estrela e de um menino, na esperança de uma criança vinda ao mundo para salvar o mundo. Montam a Árvore de Natal porque acreditam e ainda acreditam. Não estão mortos, acreditam. E por isso sorriem, ramo após ramo, saudade após saudade, lâmpada após lâmpada, enquanto distribuem as luzes e as bolas, as prendas e as meias, as bengalas, os Reis Magos e o menino ao meio do presépio. Não vencidos, acreditam. E talvez seja essa um pouco da magia do Natal.

Não porque exista magia (não existe), mas porque num repente ateia-se um incêndio na esperança, não de um menino, não de uma fé, mas de um calor que está por vir quando Portugal acordar, quando Portugal votar, mais ou menos pela altura do Verão e do coração.

E por isso é que o Natal é de todos nós.. porque no dia Vinte e Quatro à meia-noite, bem o sei, não terei nem prendas nem amor, nem saudades nem calor, estarei demasiado longe para tal e o Pai Natal não tem dinheiro para voar. Mas terei esperança e alguém ao meu lado, ter-nos-emos um ao outro e, por tal, não estaremos sós, antes pelo contrário, unidos, não vencidos, hoje e sempre, nesta pequena aldeia Gaulesa, resistimos ao invasor enquanto, em silêncio, desejamos um feliz Natal, a ti e a mim, a todos nós.

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