A importância das camponesas moçambicanas para a segurança alimentar

Embaixador dos EUA alerta governo de Moçambique para que não marginalize camponesas.

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Entre 1990 e 2010, Moçambique perdeu 0,50% da sua cobertura vegetal por ano GIANLUIGI GUERCIA/AFP

"É prioridade investir nas camponesas", afirmou David Lane no Chimoio, centro de Moçambique, no fim de uma visita de cinco dias ao país, lembrando que as mulheres são "a chave para transformação da agricultura", mas também as que mantêm menos rendimentos por falta de financiamento.

Com uma enxada curta, Emília Saimone, 41 anos, trabalha incansavelmente para limpar uma minúscula exploração agrícola em Inhazonia, província de Manica, para se alinhar com a época de sementeira da agricultura de sequeiro. "Já há sinais de chuva, devemos lançar a semente. Este ano a chuva demorou e os que limparam cedo os campos devem fazê-lo de novo, para ter melhor colheita", explica a mulher, acrescentando que, "se lavrasse com charruas de bois, seria mais rápida e renderia mais".

O Plano Estratégico de Desenvolvimento do Sector Agrário (PEDSA) 2010/2019 avança que a agricultura ocupa 90% da força laboral feminina em Moçambique e 70% da masculina. Ao todo, 98% das explorações agrícolas praticam agricultura de sequeiro e a maioria não usa sementes de qualidade e fertilizantes. O grupo familiar domina o sector com 3,7 milhões de pequenas explorações com uma área média de 1,1 hectare por agregado.

"As mulheres produzem 30% menos do que os homens, não porque são frágeis, mas porque não têm apoio e incentivo necessários em equipamento, sementes e fertilizantes, que são caros", enfatizou David Lane.

Dados da Aliança para a Revolução Verde em África (AGRA) indicam que os governos africanos gastam em média 33 mil milhões de dólares (cerca de 23,3 mil milhões de euros) anualmente, na importação de bens alimentares. Estes números podem crescer com a baixa produção interna e a alta dos preços globais de alimentos.

O Banco Mundial, explicou David Lane, defende ser melhor investir seis vezes na agricultura do que em qualquer outro sector, adiantando que "a mesma percepção deviam ter os governos africanos", sobretudo no sector familiar, não o limitando apenas à agricultura de subsistência, mas apostando também na comercial e como isso dar educação formal aos filhos.

Através de uma iniciativa da AGRA e do Governo, lançada em 2011, espera-se que em 30 anos, 190 mil hectares de terras possuam sistemas de irrigação, 200 mil agricultores tenham acesso a financiamento e sejam criados 350 mil novos empregos.

O plano prevê também que pelo menos 150 comunidades beneficiem de energia e água potável, tirando da pobreza absoluta cerca de um milhão de moçambicanos

"É possível viver da agricultura, aliás cresci cultivando e já tenho sete filhos. Com apoio pode-se desenvolver mais e ter uma casa melhor e pagar os estudos e saúde dos filhos", diz Emília Saimone.

David Lane visitou Moçambique entre 8 e 13 deste mês, com vista a conhecer as comunidades rurais e observar as parcerias das agência da ONU para alimentação e agricultura, no domínio da segurança alimentar e do desenvolvimento agrícola.

Segundo um comunicado da embaixada norte-americana em Maputo, os Estados Unidos foram o maior doador da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), Programa Alimentar Mundial (PAM) e Fundo Internacional para o Desenvolvimento Agrícola (FIDA), contribuindo em 2013 com 1,7 mil milhões de dólares (1,3 mil milhões de euros).

Este valor representa um quarto do total que os Estados Unidos gastam anualmente em assistência humanitária e ajuda ao desenvolvimento na agricultura, segurança alimentar e nutrição, tendo Moçambique recebido 35 milhões de dólares (28 milhões de euros) no ano passado para estas áreas.

O objetivo, segundo o comunicado, é melhorar a situação de nutrição em 23 distritos do país, seis dos quais na província de Manica.