Papa volta a pedir opinião aos católicos sobre os desafios que a família enfrenta

Novo questionário a enviar às dioceses mostra que Francisco quer prosseguir caminho de abertura iniciado com o sínodo de Outubro. Perguntas servirão de base à reunião prevista para o próximo ano.

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O Papa defende que a Igreja tem de encontrar formas de integrar as "famílias feridas" ANDREAS SOLARO/AFP

Francisco não esconde que continua apostado em promover uma mudança na forma como a Igreja lida com os católicos que se divorciaram e voltaram a casar-se, os que vivem em uniões civis ou os homossexuais. Deixou-o claro na entrevista ao jornal argentino La Nación, publicada no fim-de-semana, em que lamentou a situação de exclusão em que vivem os fiéis recasados. “Não estão excomungados, é verdade. Mas não podem ser padrinhos de baptismo, não podem ler nas missas, não podem dar a comunhão, não podem ensinar catequese (…). Se começarmos a contar, parecem estar excomungados de facto”, disse Bergoglio, insistindo que a Igreja tem de encontrar formas de os integrar, mesmo que o sínodo de Outubro não tenha aprovado a proposta para que fossem autorizados a comungar.

Na mesma entrevista, o Papa assegurou que os bispos não debateram o casamento entre pessoas do mesmo sexo, tão-só o apoio que a Igreja deve dar às famílias católicas confrontadas com a homossexualidade de um filho. Também o parágrafo relativo à necessidade de acolher “com respeito e delicadeza” os gays não obteve a maioria de dois terços necessária à aprovação, mas, ao decidir divulgar na íntegra as propostas votadas pelo sínodo, Francisco abriu a porta à mudança e deixou claro que pretende manter o debate em aberto, apesar das críticas proferidas pelos bispos mais conservadores.  

A confirmação chegou terça-feira, quando o Vaticano anunciou o envio de um novo questionário às dioceses para preparar a segunda parte dos trabalhos que, depois do sínodo sobre “Desafios pastorais da família”, terá como lema “A vocação e a missão da família na Igreja e no mundo contemporâneo”. E se o inquérito sublinha que é necessário encontrar formas de valorizar o casamento católico e “a dignidade da família”, fica também claro que o Vaticano espera “que sejam as dioceses e os católicos a outorgarem, ou não, um impulso ao Papa no seu espírito reformista”, escreveu o diário espanhol El País, recordando que o primeiro inquérito confirmou o grande hiato existente entre as opiniões e práticas dos crentes e aquela que é a doutrina oficial da Igreja.

Na introdução que antecede as 46 perguntas agora enviadas, o Vaticano pede aos bispos para evitarem respostas baseadas unicamente na doutrina oficial e se “deixem guiar pela viragem pastoral que o sínodo extraordinário começou a traçar”. Exortando as dioceses a envolverem na discussão movimentos laicos, organizações académicas e associações religiosas, o documento insiste que no debate sobre os desafios que a família enfrenta “é necessário tudo fazer para que não se recomece do zero, mas se assuma como ponto de partida o caminho já feito”. Além da “viragem pastoral” iniciada em Outubro, o inquérito aponta como guias o Concílio Vaticano II e “o magistério do Papa Francisco”.

E, apesar do incómodo dos conservadores, o Vaticano volta a pedir a opinião dos crentes sobre o apoio a dar às “famílias feridas”: pergunta como deve a Igreja acolher os católicos que voltaram a casar-se, se os processos para a anulação do matrimónio devem ser agilizados e mais acessíveis, ou como pode contribuir para o fim da “injusta discriminação” dos homossexuais.

Mas Francisco sabe que tem de equilibrar o impulso de abertura com a necessidade de evitar rupturas. Por isso, na audiência geral desta quarta-feira, voltou a dizer que, em nenhum momento, foram postos em causa “os verdadeiros fundamentos do sacramento do matrimónio, seja a indissolubilidade, a unidade, a fidelidade e a abertura ao dom da vida”. “Tudo acontece na presença do Papa, o garante da ortodoxia [da discussão]”, sublinhou perante 13 mil fiéis reunidos em S. Pedro.

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