Lares de idosos têm “modelo deprimente”, mas será que isso é inevitável?
Em Portugal há "um grande desrespeito pelas pessoas idosas", lamenta o presidente da Associação dos Amigos da Grande Idade, que acredita que é possível "estar num lar e ser feliz".
Considerando que em Portugal, país em acelerado processo de envelhecimento, “há um grande desrespeito pelas pessoas idosas e pouca reflexão sobre os seus direitos”, Rui Fontes dá o exemplo de instituições, como lares e residências assistidas, onde se “proíbe os mais velhos de beber álcool e se põem de lado as questões do sexo”. “Se uma pessoa se apaixona por outra num lar de idosos o modelo é gozar [com aquela relação], torná-la uma gracinha”, lamenta.
Para o presidente desta associação criada há uma dezena de anos, os serviços e cuidados dirigidos a idosos estão mesmo a “falhar” em Portugal porque têm “um modelo deprimente” e porque a maior parte assenta num “comportamento caritativo e assistencialista”. Por alguma razão, nota, é que nos países do Norte da Europa 13,5% dos idosos vivem em instituições e, em Portugal, a percentagem se fica pelos 3,7%. Mas esta situação não é uma inevitabilidade, acredita.
No documento com “13 recomendações para a longevidade” apresentado no Parlamento, a Associação Amigos da Grande Idade propõe, entre outras coisas, um novo modelo de financiamento das instituições que recebem idosos. “Hoje financiamos mais a institucionalização do que a permanência em casa”, critica Rui Fontes, para quem o modelo actual – tanto o dos lares de idosos como o das residências ou hotéis assistidos – não serve para as pessoas mais velhas que continuam independentes e activas. “Acabam por ter de pagar como se estivessem incapacitadas”, frisa, lembrando que a legislação obriga a que as instituições para a terceira idade tenham “50% de camas articuladas”, além de outros requisitos, que encarecem sobremaneira este tipo de resposta.
A solução passa por “uma mudança radical do modelo de financiamento”, abrindo a possibilidade de investimento noutro género de serviços e cuidados mais destinados à vida livre, activa, preventiva e feliz”, advoga Fontes, ele próprio director técnico de um lar de idosos, o do Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas. Mas devia também abrir-se a possibilidade de comparticipação às famílias e dar mais valor aos cuidados domiciliários, de forma a manter as pessoas em casa, sempre que possível.“Não podemos pensar que vamos ter lares para dois milhões de pessoas”, por isso é necessária uma política de apoio às famílias e redes de vizinhança, diz o presidente da associação.
Garantindo que é possível "estar num lar e ser feliz" e ser-se "mais eficaz com menos gastos”, Rui Fontes defende que não faz sentido continuar a duplicar e a triplicar ofertas e serviços comparticipados pelo Estado, "sem qualquer orientação e sem qualquer resultado”, como acontece actualmente em Portugal. Propõe, a propósito, que se crie uma rede nacional de serviços e cuidados diferenciados com tipologias distintas, até porque "não se pode partir do princípio de que depois dos 65 anos estamos todos doentes, carenciados e incapacitados”.
Acima de tudo, e de imediato, o presidente da associação recomenda que se aposte fortemente na educação e na formação. "Não podemos continuar a ter cuidadores que necessitam de mais cuidados do que as pessoas de quem cuidam. Não podemos continuar a fechar os olhos à falta de capacidade técnica que existe na área dos cuidados às pessoas idosas”, sublinha.