O diagnóstico acerca das instituições políticas da III República está feito há muito. Os partidos fecharam-se sobre si mesmos e funcionam de forma pouco transparente e muito centralizada na figura do líder. O sistema eleitoral é, também ele, extremamente fechado, e a seleção dos deputados monopólio das cúpulas partidárias. A Oposição tem poucos incentivos a apresentar alternativas fundamentadas, preferindo aceder ao poder quando um qualquer Governo caia por esgotamento. E ninguém confia no Governo, embora do Governo tudo se exija.
A reforma do sistema político é uma reforma estrutural fundamental, e que ficou por fazer. Urge criar incentivos para que o Governo entre em funções preparado, e que a Oposição apresente alternativas substanciadas. Urge ter um sistema eleitoral mais aberto. E os partidos têm de ser mais transparentes na sua forma de atuar, mais dinâmicos internamente, e com maior capacidade de continuamente apresentar novas ideias para o país. Não podemos continuar como estamos. Precisamos de uma democracia mais aberta, mais dinâmica e, portanto, mais saudável.
Neste contexto, é inultrapassável o debate acerca da reforma do sistema eleitoral da Assembleia da República. O sistema eleitoral tem grande impacto na forma como os cidadãos encaram as eleições como votantes, e na forma como os partidos se organizam internamente e escolhem os seus candidatos a deputados. O sistema português atual, proporcional com base no método d’Hondt e com círculos plurinominais e listas fechadas, permite que os cidadãos escolham apenas o partido, e permite às cúpulas partidárias escolher quais os candidatos a deputados. O cidadão acaba por não saber quem é o seu deputado, e este acaba a responder mais perante a cúpula partidária que o selecionou como candidato do que perante quem nele votou.
Há alternativas a este sistema. Um deles, o sistema alemão, misto, é um sistema que combina a proporcionalidade com a personalização conferida pela existência de círculos uninominais. O sistema irlandês de voto único transferível permite ao votante, no seu voto, ordenar os candidatos por ordem de preferência. Em qualquer um destes sistemas, a proporcionalidade é assegurada, mas consegue-se uma maior responsabilização dos deputados diretamente perante os cidadãos-eleitores. A forma como os partidos escolhem os seus candidatos seria alterada, para melhor, apenas por este facto.
Há 17 anos que é possível alterar o sistema eleitoral em Portugal. Diversas obras foram já escritas sobre esse tema. Recentemente, o Instituto de Políticas Públicas Thomas Jefferson-Correia da Serra (de que sou associado), através da Prof.ª Dr.ª Marina Costa Lobo, tem apresentado propostas a este respeito. E em agosto, o manifesto “Por uma Democracia de Qualidade” juntou diversas personalidades, de diversos quadrantes políticos, a defender a urgência desta reforma. E quanto mais tempo a adiarmos, mais tempo damos a que ela venha tarde demais.