No “melhor ano” da reabilitação urbana no centro histórico do Porto, o Morro da Sé vai “começar do zero”

II Semana da Reabilitação Urbana decorre até ao próximo domingo, no Ateneu Comercial do Porto.

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No arranque da II Semana da Reabilitação, que decorre até domingo, Álvaro Santos revelou que, este ano, a Porto Vivo recebeu “850 pedidos de licenciamento”, o que representa “um crescimento de 70%, em relação ao ano passado”. O presidente da SRU falava aos jornalistas, à margem das conferências que decorrem no Ateneu Comercial, depois de ter afirmado, na sessão de abertura, que este “é o melhor ano de sempre para o centro histórico”.

Antes de abandonar o espaço, o responsável pela SRU admitiu, em resposta ao PÚBLICO, que vai ser necessário “começar do zero” nas operações para construir um hotel de 50 quartos e uma residência com 120 camas e que integram o programa mais vasto do Morro da Sé.

O programa, que previa também a reabilitação de vários edifícios para habitação, teve o financiamento aprovado, ainda em 2010, mas o facto de a construção dos dois projectos-âncora estarem dependentes de uma parceria que envolvia uma construtora levou a que o financiamento para estas duas operações fosse questionado.

Em Fevereiro de 2012, o então administrador da SRU Rui Quelhas admitiu que os trabalhos estavam parados “há mais de um ano”, apesar de os custos relativos a limpeza e trabalhos arqueológicos, relacionados com estes dois projectos, ascenderem já a “400 mil euros”.

O impasse prolongou-se, com vários pedidos de esclarecimento por parte das instâncias europeias responsáveis pelo financiamento, mas Álvaro Santos admite agora que não foi possível ultrapassar os constrangimentos criados, pelo que a SRU “revogou o contrato de parceria” que tinha com o consórcio liderado pela Novopca.

Uma decisão que não afecta a reabilitação do edificado destinado à habitação, pelo que alguns prédios estarão prontos a habitar em breve, revelou Álvaro Santos na edição de ontem do Jornal de Notícias. Para o hotel e a residência universitária serão lançados concursos públicos internacionais. “Nós lançamos o concurso, depois os vencedores poderão ter a oportunidade de se candidatar” a financiamento, afirmou o responsável da Porto Vivo.

O que não significa que os processos anteriores estejam completamente encerrados. Recusando-se a comentar o valor já gasto com o hotel e a residência universitária, e avançado pelo Rui Quelhas, Álvaro Santos garante que, neste momento, os juristas ao serviço da Porto Vivo estão a trabalhar no caso. “Vamos accionar uma garantia bancária com uma das parceiras. Todos os custos serão reivindicados”, disse. Questionado pelo PÚBLICO sobre se o valor investido no programa foi, inteiramente, da SRU, Álvaro Santos confirmo apenas que a sociedade “teve encargos”, que estão neste momento a ser “exaustivamente apurados, para reivindicá-los”. O responsável disse “desconhecer” se poderá haver também pedido de ressarcimento de valores investidos por parte dos parceiros.

Também à margem da sessão de abertura da II Semana da Reabilitação, o presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, confirmou a intenção de avançar “em Campanhã e no Bonfim com um modelo similar ao que foi criado na zona histórica”.

A autarquia já aprovou uma proposta para que a Campanhã seja uma Área de Intervenção Urbana (ARU), mas Rui Moreira não revela, para já, que tipo de desenvolvimento espera ter na zona mais oriental da cidade. Por enquanto, afirmou o autarca, a câmara está a trabalhar em “instrumentos de planeamento e em instrumentos fiscais de promoção da reabilitação”.

Rui Moreira admitiu, contudo, que gostava de ver em Campanhã “valores [de investimento] idênticos” aos conseguidos no centro histórico, embora os considere “ambiciosos”. Minutos antes, Álvaro Santos garantira à plateia que nos últimos dez anos, cerca de “60 milhões de euros” de investimento público alavancaram “740 milhões” de investimento privado no centro histórico, fazendo o valor total chegar aos 800 milhões de euros.

Defendendo a importância de reabilitação urbana para o país, o secretário de Estado do Ordenamento do Território, Miguel Castro Guedes, que também discursou na sessão de abertura, realçou o facto de “pela primeira vez” ser disponibilizado “financiamento para projectos de reabilitação urbana em habitação”. “No Orçamento de Estado já está consagrado o [programa de apoio] Reabilitar para Arrendar para privados”, disse. O governante lembrou ainda que será concentrado num único fundo todo o tipo de incentivos à reabilitação urbana e que poderá ascender a “2,5 mil milhões de euros”.

Quem fica com o licenciamento?
O memorando de entendimento assinado entre o Estado Português e a Câmara do Porto, que delineou o novo modelo de funcionamento da SRU, previa que competências como o “licenciamento, fiscalização e embargo de obras” regressassem ao município, acompanhadas dos respectivos trabalhadores “destacados na sociedade que nela exerçam, actualmente, funções dessa natureza”. Uma decisão que reflecte o ponto de vista do vereador do Urbanismo, o socialista Correia Fernandes, que, há cerca de um ano, dizia ao PÚBLICO que o licenciamento  em áreas de intervenção da SRU com planos estratégicos aprovados iria passar a ser uma competência da câmara. “Não pode haver um Estado dentro do Estado, isto é fundamental. Isso é algo que tem de ser corrigido”, disse, na altura. Contudo, o processo pode não ser tão linear. Apesar de Rui Moreira admitir que essas competências regressem à câmara, deixando em aberto a possibilidade de serem, em parte, delegadas na SRU (“não procuramos uma concentração de competências, queremos uma articulação maior, entre a câmara e a SRU”, disse o autarca, aos jornalistas), Álvaro Santos diz que o plano estratégico que a SRU está a ultimar “consagra a manutenção de competências e fiscalização” na sociedade a que preside. E tem um argumento que, garante, deixou “receptivos” os dois accionistas da Porto Vivo - o Governo, através do Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (60%) e a Câmara do Porto (40%) - a esta pretensão: “Os investidores apreciam muito a rapidez com que conseguimos licenciar os processos. Conseguimos ter uma licença em cinco semanas e isto é uma vantagem”, disse.

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