Lisboa, Cidade Triste e Alegre vai voltar às rotativas
Célebre fotolivro de Victor Palla/Costa Martins, publicado em 1959, será reeditado pela Pierre von Kleist, chancela responsável pela segunda edição da obra, em 2009. Distribuição daquele que é considerado o livro dos livros de fotografia portugueses deverá acontecer em Maio de 2015.
“Sempre quisemos que Lisboa, Cidade Triste e Alegre não fosse um objecto raro. Até porque não faz sentido que a maior obra bibliográfica da fotografia portuguesa não esteja disponível”, afirma José Pedro Cortes, para quem este fotolivro é uma obra “intemporal”. Para o fundador da PvK, especializada em livros de fotografia, Lisboa… “tem uma linguagem gráfica universal” e é procurado por “um grupo alargado de pessoas com interesse em fotografia, em poesia e em livros sobre cidades”.
A decisão de reeditar o primeiro livro de fotografia a constar nas listas dos melhores do mundo está também a relacionada com a constante procura. “Estamos sempre a receber mensagens de pessoas à procura dele. Continua a ter interessados e metade dessas mensagens é de estrangeiros, o que significa que é uma obra conhecida e respeitada fora de Portugal”, revela Cortes que, em 2006, com André Príncipe, decidiu reanimar um processo de reedição moribundo que estava nas mãos da chancela alemã Steidl.
Para já, José Pedro Cortes não quer revelar a tiragem desta edição, mas avança que será impresso na Alemanha, na gráfica Optimal, onde serão experimentadas tintas que garantam a densidade máxima dos tons escuros. O objectivo é aproximar o mais possível esta edição da versão original que foi impressa em rotogravura (desaparecida em Portugal), um processo de impressão directa que permite aplicar diferentes quantidades de tinta em localizações diferentes de uma superfície.
A PvK conta ter a terceira edição de Lisboa, Cidade Triste e Alegre pronta em Maio de 2015. O livro será acompanhado pelo mesmo suplemento publicado em 2009, que incluía um texto de apresentação do crítico inglês Gerry Badger e o índice (onde os autores explicam a obra) traduzido em inglês. O preço foi fixado em 90 euros, mas haverá um desconto de 10 euros para quem encomendar com antecedência.
Em 2004, em The Photobook: A History vol.1 (Phaidon, 2004), Martin Parr e Gerry Badger consideraram-no um dos melhores livros de fotografia da Europa do pós-guerra. Criado na sequência de duas exposições em 1958, em Lisboa (Galeria Diário de Notícias) e no Porto (Divulgação), com imagens que fugiam da tónica da fotografia de salão mais ou menos alinhada com o regime, Lisboa… foi um rotundo falhanço comercial na época.
No final dos anos 50, Palla/Martins mergulharam no Bairro Alto e em Alfama. “Deixaram de trabalhar e todos os dias – dia e noite – deambularam pela cidade, fotografando, falando, comendo, divertindo-se com pessoas e coisas. Vinham a casa apenas para revelar e ampliar [os negativos]”, escreve António Sena (Uma História da Imagem Fotográfica em Portugal - 1839-1998). Inspirados na espontaneidade da fotografia humanista à maneira de Henri Cartier-Bresson e num modo de ver cinematográfico e neo-realista, consumaram um livro graficamente arrojado, onde se sente a “sinfonia da cidade”.
“Lisboa… é, certamente, um livro mais complexo do que aparenta ser à primeira vista. (…) Se menciono que a chave do seu sucesso é o design e a tipografia, não é para denegrir as fotografias ou outros aspectos desta obra, mas para dizer que a exuberância do design cria largamente a exuberância do livro”, escreve Gerry Badger no ensaio publicado no encarte da edição da Pierre von Kleist.
Depois da primeira edição, o livro hibernou, foi esquecido, até que, em 1982, António Sena o retirou da sombra através da exposição Lisboa e Tejo e Tudo, na galeria Ether. Nessa altura, juntaram-se muitos dos fascículos que estavam por encadernar e fizeram-se cerca de 200 cópias. Esta segunda vida deu-lhe alguma cotação internacional e começou a ser conhecido e transaccionado por valores elevados em leiloeiras da especialidade.
Em 2009, a dupla Cortes/Príncipe garantia ao PÚBLICO que caso a edição com a sua chancela esgotasse, voltariam ao livro. Diziam então: “Se esta edição esgotar, tentaremos fazer outra, porque os grandes livros de fotografia têm de ser como os clássicos da literatura – têm de estar sempre disponíveis.” Promessa cumprida.