O “teste de paternidade” que resolveu o enigma da Legionella
Análises feitas no Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge trouxeram as respostas para o surto que foi identificado a 7 de Novembro. As amostras da Legionella nos doentes coincidem com as das torres de arrefecimento.
Foi ainda no dia 7 de Novembro que a Direcção-Geral da Saúde (DGS) alertou várias entidades e criou uma task-force que às 21h entregou as primeiras amostras de água da rede pública e que se vieram a revelar uma pista no sentido errado. No entanto, não foi muito depois que conseguiram chegar ao suspeito que se veio a comprovar culpado. As autoridades de saúde recolheram amostras das torres de arrefecimento das principais empresas da zona a partir das 20h30 de sábado e as autoridades do ambiente completaram este trabalho na madrugada de segunda-feira – quando já todas as torres da zona estavam encerradas.
Desde essa altura que as amostras tanto ambientais como dos doentes têm estado em estufas. As primeiras colónias já se desenvolveram e deram respostas que não deixam margem para dúvidas. As estirpes de Legionella pneumophila encontradas nas torres “apresentam uma estrutura molecular semelhante” às que infectaram os doentes, sintetizou o presidente do Insa, Fernando Almeida.
Do lado ambiental, foi encontrada a bactéria em 27 das 91 amostras e aguardam-se resultados das restantes. Em duas delas as bactérias conseguiram multiplicar-se, o que significa que em teoria também o conseguiriam no local de onde foram retiradas.
Nas análises às amostras de 164 doentes, em 57 já foi possível confirmar que se trata mesmo de Legionella pneumophila. “Há 12 amostras de 12 doentes que têm exactamente o mesmo perfil molecular da Legionella das torres”, adiantou Fernando Almeida, que explicou que o trabalho do instituto passou por confirmar numa primeira fase que as amostras de água e as amostras dos doentes tinham de facto ADN da bactéria e, depois, a estirpe concreta das mesmas. Francisco George chama-lhe um “teste de paternidade”.
A história do surto que está entre os três maiores de sempre no mundo conta-se também com a ajuda dos modelos matemáticos trabalhados pela equipa de Paulo Nogueira, que coordena a Direcção de Serviços de Informação e Análise da DGS, e que apontam para duas hipóteses: os sintomas do primeiro caso de doença do legionário com relação com este surto ou foi detectado a 14 de Outubro ou a 21 de Outubro. A forma como os casos foram surgindo, estando especialmente concentrados entre os dias 3 e 9 de Novembro, apontam para que 21 de Outubro seja mesmo a data certa.
Isso significa que entre o primeiro caso com sintomas e o alerta de 7 de Novembro passaram quase 20 dias, durante os quais a Direcção-Geral da Saúde conseguiu perceber, com estes trabalhos posteriores, que houve quase 200 pessoas já com sintomas. Os cenários traçados por Paulo Nogueira estimam que o número de óbitos ainda possa aumentar de sete para dez (com uma margem de erro que variará entre os nove e os onze mortos) e que a partir de 20 de Novembro deixem de aparecer novos casos.
Por agora, até sexta-feira, de acordo com o balanço da Direcção-Geral da Saúde, foram identificados em todo o país 316 casos de Legionella com ligação ao surto de Vila Franca de Xira. A idade média dos doentes é de 58 anos, tendo o mais novo 22 anos e o mais velho 92. Na maior parte dos casos (195) a infecção aconteceu em homens, sendo as faixas etárias mais comuns dos 35 aos 75 anos.