Advogados avisaram executivo de Rio para enviar ao Tribunal de Contas alterações ao contrato do Aleixo

Antiga directora municipal de Rui Rio defende que existiram "razões técnicas que explicam a actuação seguida quanto à alteração do contrato".

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Rui Rio envolvido na polémica da implosão das torres do Aleixo Paulo Pimenta

O memorandum da sociedade de advogados que acompanhou o processo de implementação da solução encontrada pela gestão de Rui Rio para o Bairro do Aleixo, tem a data de 12 de Março de 2012 e foi pedido pela então directora do Departamento Municipal Jurídico e de Contencioso, Manuela Gomes, numa altura em que a autarquia procurava decidir se devia “suprir a participação no fundo do investidor Vítor Raposo”, sem condições financeiras para suportar a prevista participação de 60% no Invesurb, ou, simplesmente, recorrer “à resolução contratual”, face ao incumprimento em que, naquela altura, o fundo já incorria.

Esta segunda hipótese era levantada uma vez que, para além dos incumprimentos do fundo, a própria Gesfimo, gestora da Invesurb, revelava, já na altura, “incapacidade total de encontrar investidores substitutos” e estava a manifestar “perda de interesse […] na execução do contrato”, segundo o memorandum, a que o PÚBLICO teve acesso. O documento refere mesmo que “a Gesfimo tem indiciado não ter condições financeiras para suportar a construção do empreendimento de luxo planeado para o local do Bairro do Aleixo”.

Com Vítor Raposo com uma “efectiva falta de condições financeiras e de financiamento” para cumprir as suas obrigações no FEII e a gestora do fundo a denunciar “perda de interesse” na execução do contrato, Rui Rio poderia ter resolvido o contrato, já em 2012, mas, em vez disso, transferiu para a câmara a responsabilidade de aumentar o capital do Invesurb, apesar dos vários problemas jurídicos apontados pela sociedade de advogados.

A Abreu & Associados avisava, desde logo, que o aumento de capital à custa da entrada de imóveis colocava a questão “de ditar a escassez de liquidez do fundo”, que só poderia ser suprida à custa do endividamento, o que, para a sociedade de advogados, levantava outro problema à autarquia. Passando ela a assumir, como estava em cima da mesa, “30 a 40%” do Invesurb, a câmara corria o risco de ficar mais exposta “a decisões de endividamento do fundo, que podem ter reflexos sobre os níveis de endividamento do próprio município”, alerta. E aconselhava “uma análise mais profunda acerca das repercussões financeiras para o município que este cenário acarreta”.

Além disso, os advogados chamavam a atenção da directora municipal de Rui Rio para as “dificuldades ao nível político”, caso a câmara decidisse aumentar a sua participação no fundo, uma vez que “a entrada de novos imóveis municipais no Fundo poderá ser interpretada como a assunção de custos adicionais”.

Apesar disto, os causídicos consideravam que era possível alterar os investidores e as percentagens de participação no Invesurb, mas ”só […] mediante uma alteração ao contrato”. E, nesse caso – refere o memorandum – “deverão ser seguidos todos os trâmites que levaram à assinatura do contrato inicial, ou seja, deliberação camarária, da assembleia municipal e submissão a visto do Tribunal de Contas”.

O documento elenca ainda todos os casos em que a Gesfimo já se encontrava em incumprimento – desde a constituição do fundo com o valor mínimo de cinco milhões de euros, à incapacidade para cumprir os prazos na entrega de imóveis reabilitados ou novos para realojar os moradores do Bairro do Aleixo. Incumprimentos que poderiam ter levado a câmara, caso o desejasse, a “resolver unilateralmente o contrato por incumprimento contratual imputável à Gesfimo”.

Ao PÚBLICO, Manuela Gomes diz que, “na altura, foram analisadas e avaliadas as circunstâncias e existem razões técnicas que explicam a actuação seguida quanto à alteração ao contrato, aprovada pela câmara e assembleia municipal”. A antiga directora municipal refere ainda, em resposta escrita: “As razões técnicas são complexas e só podem ser explicitadas num ambiente processual, o que infelizmente não aconteceu, por não nos ter sido dada essa oportunidade, o que nos permite ter reservas sobre a boa fé e isenção deste trabalho/relatório”.

O contrato inicial referente à Invesurb previa que este fosse participado por Vítor Raposo (60%), a Espart, do universo Espírito Santo (30%) e a Câmara do Porto (10%). Em Julho de 2012, depois deste memorandum, o executivo e a Assembleia Municipal aprovaram uma adenda contratual que permitiu o aumento de capital do fundo, com a entrada de bens em espécie e em dinheiro, e o aumento da participação municipal até aos 30%.

No relatório preliminar ao “Apuramento das condições de constituição e funcionamento do Invesurb – Fundo Especial de Investimento Imobiliário Fechado”, realizado pelo Departamento Municipal de Auditoria Interna da câmara, que aponta várias irregularidades ao processo, os auditores defendem que esta adenda contratual deveria ter sido enviada para o Tribunal de Contas, “para efeitos de fiscalização prévia” e que o facto de isto não ter acontecido “constitui uma infracção susceptível de apuramento de responsabilidade financeira sancionatória”.

No exercício do contraditório, o Departamento Municipal de Finanças e Património defende, contudo, que “em termos contabilísticos, esta operação não gerou nenhum encargo patrimonial, na medida em que apenas gerou um facto patrimonial permutativo, e não modificativo, ou seja, provocou uma alteração na composição do património mas não no seu valor”.

A falta de liquidez do fundo, já expressa no memorandum da Abreu & Associados de 2012, nunca foi suprida e levou a Gesfimo, em 2013, a pedir à câmara um novo aumento de capital, que o actual presidente da câmara, Rui Moreira, recusou. O terramoto que se abateu, entretanto, sobre o grupo BES torna ainda mais difícil a sobrevivência do Invesurb.

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