Altice procura na PT "oportunidade única" para consolidar presença na Europa

Empresa fundada pelo francês Patrick Drahi, com ajuda de um português, tem operações de telecomunicações em nove países e garante ter "visão de longo-prazo para a PT".

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Compra da PT Portugal pode obrigar a Altice a vender a Oni ou a Cabovisão Público

Ainda na semana passada, em entrevista ao Diário Económico, em Lisboa, o presidente executivo da Altice, Dexter Goei, defendeu que já não há razão para que se olhe para a empresa como um fundo especulativo. “Percebo porque é que, historicamente, as pessoas têm dito isso. Mas nos últimos cinco anos esse ruído já deveria ter desaparecido, porque nem sequer pensámos em vender um negócio”, afirmou o gestor de 43 anos, que está na liderança da Altice desde 2009.

O grupo fundado em 2002 por Drahi entrou em bolsa este ano e emprega actualmente 20 mil pessoas. Tem operações de cabo e telecomunicações em nove países e protagonizou recentemente em França uma operação milionária com a aquisição da operadora móvel SFR (a segunda a seguir à Orange) por cerca de 17 mil milhões de euros, derrotando a Bouygues. Foi uma operação durante a qual o Governo francês não se coibiu de mostrar preferência pela Bouygues, nem de expressar receios por eventuais despedimentos ou pelo grau de endividamento da empresa resultante da fusão.

Além da SFR, em França a Altice tem também uma posição de relevo na operadora de cabo Numericable e é neste país que gera actualmente 80% das receitas. Se a PT vier a entrar nestas contas, Portugal passará de um contributo de cerca de 1,5%, para cerca de 15% a 20% do volume de negócios total.

A Altice entrou em Portugal em 2012, com a compra da Cabovisão e, no ano seguinte, comprou a operadora de comunicações empresariais Oni. No conjunto, terá investido cerca de 120 milhões. Com a compra da PT Portugal, que Dexter Goei classificou como “uma oportunidade única”, a Altice passaria de player secundário a líder de mercado.

A compra da PT seria a segunda maior transacção da Altice e “um movimento estratégico para a consolidação” da empresa no sector das telecomunicações na Europa, disse Dexter Goei ao Diário Económico. As receitas do grupo atingiram 13.600 milhões de euros em 2013 e o contributo da Oni e da Cabovisão foi de 210 milhões. Se a Altice comprar a PT, a venda destes activos poderá ser um dos remédios impostos pela Autoridade da Concorrência. “Esse não é um problema que nos preocupe agora”, disse ao PÚBLICO o porta-voz da empresa.

Se Dexter Goei — que veio da Morgan Stanley, onde co-dirigiu a unidade de media e telecomunicações do banco de investimento para a Europa, Médio Oriente e África — dá a cara pelas ambições de crescimento da empresa em Portugal, o rosto por detrás da Altice é efectivamente o do empresário de ascendência israelita e francesa que entrou este ano para a lista de multimilionários da Forbes.

“Graças a uma política de comprar barato para vender caro, [Patrick Drahi] construiu a Altice através de 20 aquisições de empresas de cabo e operadoras móveis em dificuldades, muitas vezes por preços baixíssimos, em países como a França, Bélgica, Isarel, Portugal e República Dominicana”, diz o perfil publicado pela Forbes. Filho de professores de Matemática, nasceu e viveu em Marrocos, mas hoje vive com a mulher e os dois filhos em Genebra, na Suíça. Foi com o português Armando Pereira e com o francês Bruno Moineville que fundou a Altice.

De acordo com informação disponibilizada pela empresa, Patrick Drahi formou-se na École Polytechnique e Ecole Nationale Supérieure de Télécommunications de Paris e fez o primeiro investimento numa empresa de cabo em 1991. Hoje está em 133.º lugar na lista de multimilionários da Forbes, com uma fortuna pessoal avaliada em 9500 milhões de dólares (mais de 7 mil milhões de euros). De acordo com a revista francesa Challenges, Drahi está na lista das 15 maiores fortunas da França.

Os primeiros rumores do interesse da Altice na PT Portugal surgiram no início de Outubro (no site da agência norte-americana de informação especializada para os mercados financeiros Redd) e, ironias do destino, materializaram-se quando Zeinal Bava abandonou a liderança da Oi. Quase no mesmo dia em que o gestor português deixava o Rio de Janeiro e aterrava em Lisboa, a equipa de gestão da Altice pedia um encontro de cortesia ao vice-primeiro-ministro Paulo Portas, no Palácio das Laranjeiras, para lhe dar conta do interesse na PT Portugal e da vontade de criar no país cerca de 4000 empregos na área dos call center, para aproveitar as aptidões linguísticas dos portugueses. Contratado o assessor para a comunicação, a Cunha Vaz, o assessor jurídico, a Uría Menéndez Proença de Carvalho, e os assessores financeiros, Goldman Sachs, Morgan Stanley e Perella Weinberg, a Altice desdobrou-se em contactos com os accionistas portugueses da Oi para garantir que a oferta seria bem recebida.

Apesar de todas as garantias da Altice de que tem planos de longo prazo para a PT Portugal, os trabalhadores continuam receosos quanto ao futuro da empresa. “Dizem que não são um fundo, mas também não são um operador de referência e por isso achamos que não são uma mais--valia”, disse ao PÚBLICO Francisco Gonçalves, da comissão de trabalhadores da PT.

Também o Sindicato dos Trabalhadores da Portugal Telecom (STPT) voltou a manifestar ontem preocupação com o futuro da PT Portugal. Em comunicado, o STPT apelou “à intervenção do Governo” para que evite, “com uma acção adequada e atempada, a possível compra da PT Portugal por este fundo de investimento”.

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