Guggenheim: pode um museu mudar uma cidade? Olhem para Bilbau

O Museu Guggenheim de Bilbau, que tem um orçamento de 24 milhões de euros, autofinancia-se em 70 por cento e os restantes 30 por cento são provenientes de instituições públicas

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Vincent West/Reuters

 A decisão de criar um Museu Guggenheim em Bilbau, inaugurado há 17 anos, transfigurou a cidade basca, resgatando-a da "crise económica tremenda", e tornando a entidade num caso de sucesso, com cerca de um milhão de visitantes anuais.

A história do museu foi contada esta quinta-feira pelo director do Departamento de Desenvolvimento de Projectos do museu, Xabier Peréz Gaubeca, na conferência internacional "Património Cultural e Turismo: Conceitos, realidades e perspectivas", que se iniciou esta quinta-feira e que vai decorrer até sábado, na Universidade Lusófona, em Lisboa.

Os 16,8 milhões de visitantes recebidos em 17 anos de existência, um auto-financiamento em 70 por cento, que o eleva a museu europeu mais auto-financiado, de acordo com os dados apresentados pelo responsável, impressionaram o auditório, onde se encontravam especialistas da área da cultura, do ensino e do património.

No museu desenhado pelo arquitecto norte-americano de origem canadiana Frank Gehry, 65 por cento dos visitantes são estrangeiros, sendo dois a três por cento portugueses, 10 por cento do País Basco e, os restantes, das outras regiões de Espanha.

O "segredo" do sucesso do museu — cuja concretização foi muito contestada inicialmente — tem sido, segundo Xabier Gaubeca, o modelo de gestão, o rigor, a planificação, a criatividade e o intercâmbio e trabalho em rede com os outros museus Guggenheim (Estados Unidos da América, Itália e Abu Dabi).

"Um museu não pode ser um mausoléu de obras de arte. Esse modelo de museus dedicados sobretudo à investigação e à conservação está ultrapassado, tem vindo a mudar", salientou o responsável, acrescentando que também mudou o uso exclusivo de dinheiros públicos nestes espaços.

O Museu Guggenheim de Bilbau, que tem um orçamento de 24 milhões de euros, autofinancia-se em 70 por cento e os restantes 30 por cento são provenientes de instituições públicas. Tem um grupo de 16 mil amigos, que apoia as suas actividades, e uma programação cultural que vai além das exposições de arte, com cinema e teatro, entre outros eventos. Gaubeca recordou que, nos anos 1990, Bilbau era uma cidade "que vivia uma crise económica tremenda, e a decisão de criar o museu e apostar na cultura mudou radicalmente a vida económica e cultural" da região, que não tinha qualquer tradição de arte contemporânea.

Situada no norte de Espanha, Bilbau, com cerca de 300 mil habitantes e mais 600 mil na área metropolitana, vivia há 30 anos sobretudo da indústria naval e da siderurgia, que entraram em decadência, e o turismo ascendia a 100 mil pessoas por ano, para negócios e lazer em férias.

A zona onde o museu foi construído era "abandonada e cheia de contentores, mas a criação do museu transfigurou a cidade e mudou a vida das populações", salientou o responsável, comentando que actualmente as multinacionais e as marcas de luxo estão instaladas na cidade.

Nestes 17 anos, o museu — que custou 90 milhões de euros — adquiriu 128 obras de arte de 73 artistas, que custaram 110 milhões de euros, "mas estão hoje avaliadas em 14 vezes mais do que o seu preço inicial". Ao todo, o Guggenheim Bilbao apresentou 68 exposições, com base no acervo permanente, e 73 mostras temporárias, acompanhadas por cerca de 50 programas educativos, uma área que a entidade também considera essencial.

António Filipe Pimentel, director do Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA), em Lisboa, participou na conferência para falar na evolução, nos últimos quatro anos, das iniciativas e do número de visitantes da entidade, que esta semana bateu o recorde anual, com mais de 200 mil entradas.

O director, que apostou nos últimos dois anos em parcerias público privadas para a realização de exposições temporárias, sublinhou que o mais importante é "criar uma marca internacional e não perder o ritmo" de uma programação intensa e de nível elevado. O responsável apontou que o MNAA tem uma grande diferença em relação ao Guggenheim de Bilbao, porque as receitas são absorvidas pelos serviços centrais, que depois as distribuem pelos museus, indicou, na sequência de perguntas do auditório.