John Zogby: “É prematuro declarar que os Republicanos vão conquistar a maioria no Senado”

É um dos mais conhecidos nomes do mundo das sondagens e as suas opiniões sobre a política americana vão contra a corrente: o Partido Republicano vai desaparecer tal como o conhecemos, não é certo que Hillary Clinton se candidato à presidência.

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O Partido Republicano pode desaparecer tal como o conhecemos, diz Zogby Spencer Platt/AFP
O especialista diz que Bill Clinton está a "empurrar" a mulher para a candidatura à presidência
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O especialista diz que Bill Clinton está a "empurrar" a mulher para a candidatura à presidência AFP

Muitos analistas dão como certo que o Partido Republicano vai conquistar a maioria no Senado e passar a controlar as duas câmaras do Congresso até ao fim do mandato do Presidente Barack Obama. Qual é a sua opinião?
Os Republicanos têm uma boa possibilidade de conquistarem a maioria no Senado, mas acho que esse cenário não pode ser já apresentado como um dado adquirido.

As eleições para o Congresso costumam ser uma espécie de referendo sobre a actuação do Presidente. É isso que está a acontecer também este ano?
Sim, é verdade que as eleições para o Congresso são, normalmente, uma espécie de referendo sobre a situação do país tal como ela é reflectida pela imprensa, e penso que este ano a situação não é diferente.

Que aspectos da governação de Barack Obama poderão pesar mais na decisão dos eleitores para a escolha dos membros do Senado e da Câmara dos Representantes?
Penso que o principal tema é a segurança nacional, o que inclui não apenas os assuntos de política externa, como a forma de lidar com o Estado Islâmico e a situação no Médio Oriente, mas também o terrorismo e o vírus do ébola.

Em relação ao ébola, acha que o primeiro caso de infecção confirmado em Nova Iorque, na quinta-feira, poderá ter algum peso na votação?
Acho que não. Estou convicto de que o medo provocado pelo ébola nos Estados Unidos já influenciou tudo o que tinha a influenciar em termos de decisão de voto.

Porque as pessoas confiam na forma como as autoridades do país estão a lidar com a situação?
É uma boa pergunta. A sondagem mais recente que eu tenho, que é da semana passada, coloca a taxa de aprovação do Presidente nos 46%, uma subida de três pontos percentuais em relação à anterior. Há outras duas sondagens que apresentam os mesmos valores e várias que colocam a aprovação um pouco acima dos 40%. Isto significa que o Presidente não tem uma aprovação muito elevada, mas mantém uma base de apoio sólida. Em segundo lugar, o Partido Republicano ainda tem muitos problemas para resolver, daí a minha resposta à primeira pergunta, que me leva a dizer que é prematuro declarar que os Republicanos vão conquistar a maioria no Senado.

Tem insistido muito na questão geracional como factor determinante para estas eleições. Quem ganha e quem perde com a afluência ou com a abstenção dos mais jovens?
Nas duas últimas eleições Presidenciais, os “millennials” (a geração das pessoas nascidas entre 1979 e 1994) não apenas votaram em grande número no Presidente Obama, como também votaram, em geral, em número muito superior em relação a anteriores eleições para a Casa Branca. Em 2010, nas eleições para o Congresso, registou-se uma afluência muito inferior.

Os “millennials” representaram 19% da totalidade dos votos nas eleições Presidenciais de 2008 e 2012. Em 2010, representaram 10%. A minha estimativa, neste momento, é que a afluência no próximo dia 4 de Novembro rondará os 14 ou 15%.

Uma afluência dessa ordem será suficiente para o Partido Democrata manter a maioria no Senado?
A questão é precisamente essa. Se se ficar pelos 12 ou 13%, os Republicanos ganham; com mais de 14%, quem ganha são os Democratas. É por isso que esta geração é a chave desta eleição para o Congresso. E há um outro aspecto que está relacionado com esse: cerca de 40% dos “millennials” são não-brancos, e a esmagadora maioria dos não-brancos rejeita o Partido Republicano.

No seu livro “First Globals: Understanding, Managing, and Unleashing Our Millennial Generation” (2013), descreve a geração de norte-americanos nascida entre 1979 e 1994 como a mais socialmente activa de sempre, a primeira com um sentimento de identidade que ultrapassa os limites das fronteiras do seu país. Isso tem-se traduzido também numa maior participação eleitoral para a escolha dos líderes políticos?
Sim, estão a votar cada vez mais, e mais do que qualquer outra geração nas mesmas idades. São mais participativos e votam mais, mas o que é realmente importante perceber é que vão manter-se bastante envolvidos para o resto das suas vidas, concentrados na resolução de problemas e nas suas comunidades. Se, para além disso, vão também continuar a votar em grande número, isso é outra questão. Porque eles querem resolver problemas, não querem eleger pessoas que criem mais problemas.

O “shutdown” do Governo americano, no ano passado, por causa das divergências entre o Partido Republicano e o Partido Democrata, contribuiu para esse sentimento de que os actuais líderes políticos apenas criam mais problemas?
Mais do que qualquer outra coisa, o “shutdown” do Governo deu origem a uma perda de confiança entre os “millennials”. Na sua grande maioria os “millennials” não odeiam o Governo, e ainda acreditam que é possível fazer coisas positivas. Mas ficaram ainda mais desiludidos com os Republicanos. O “shutdown” não ajudou a manter a boa imagem que tinham do Presidente Obama, mas sem dúvida que piorou a imagem dos Republicanos. Em segundo lugar, há um número crescente de “millennials” que são libertários. Acreditam na liberdade e na privacidade, não querem um Governo que invada as suas vidas privadas, e odeiam de uma forma visceral o aumento das dívidas, tanto as dívidas pessoais como as dívidas do Governo.

Esse sentimento pode dar mais força a um terceiro partido, que quebre a hegemonia de Democratas e Republicanos?
Acho que os “millennials” estão a apressar o início de um debate diferente. Não uma divisão entre liberais e conservadores, mas entre libertários e comunitários. Neste sentido, acredito que um dos dois grandes partidos vai desaparecer. Vendo a forma como os Republicanos estão desfasados das preocupações dos “millennials”, acho que o Partido Republicano será o primeiro a desaparecer. O cenário mais provável é que se reconstrua como um partido libertário.

Esse fenómeno está também relacionado com as divisões internas, com as alas mais conservadoras a conseguirem ditar muitas vezes a política do Partido Republicano?
Sim, isso está a acontecer. Acho que estão consideravelmente divididos, com pelo menos três grupos que não gostam mesmo nada uns dos outros.

Isso significa que a possível conquista da maioria nas duas câmaras do Congresso pelo Partido Republicano este ano poderá ser uma vitória sem muitos motivos para festejos?
É bastante provável que essa leitura seja a mais correcta. Quer o Partido Democrata mantenha a maioria no Senado, quer o Partido Republicano conquiste a maioria, nenhum dos dois irá interpretar uma vitória como um mandato claro para resolver qualquer assunto. O actual Presidente foi eleito duas vezes com maiorias substanciais, mas teve sempre muitas dificuldades para cumprir o seu programa. Por isso, se os Republicanos conquistarem a maioria do Senado, e passarem a controlar ambas as câmaras, vão propor muitas leis que o Presidente não irá assinar. E não vão ter capacidade para anular qualquer veto do Presidente. Por outro lado, se os Democratas vencerem, e continuarem a controlar o Senado, tudo continuará a ser como tem sido até agora.

Se o Partido Republicano conquistar a maioria nas duas câmaras, não poderá assumir uma postura menos agressiva para aumentar as hipóteses de vencer as Presidenciais em 2016?
A conquista da maioria nas duas câmaras do Congresso põe o Partido Republicano numa situação muito difícil. Em primeiro lugar, será mais fácil para um candidato a Presidente pelo Partido Democrata concorrer em 2016 contra um Congresso dominado pelos Republicanos. Mas é verdade que uma maioria do Partido Republicano nas eleições de Novembro poderá servir de incentivo para resolver a questão da imigração. Eles têm de fazer alguma coisa, já que não têm quase apoio nenhum entre os hispânicos. Assim que a poeira assentar depois das eleições de Novembro, também teremos de ver o que aconteceu ao Tea Party. Se o Tea Party sair enfraquecido, isso será mais um incentivo para a reforma da lei da imigração.

No fundo, defende que as eleições de Novembro não vão mudar nada de essencial no panorama político dos Estados Unidos, seja qual for o resultado.
Sim, acho de facto que não vai mudar nada. Salvo algum acontecimento excepcional em termos de segurança nacional, o Presidente Obama não vai conseguir concretizar mais nada até ao final do seu mandato. É claro que tudo pode mudar se nos envolvermos numa guerra ou ser formos vítimas de um atentado terrorista, mas numa situação normal o Presidente apenas poderá usar a sua posição privilegiada para dizer o que pretende para o país, independentemente de as suas propostas serem aprovadas ou rejeitadas.

Com a provável candidatura de Hillary Clinton à Presidência em 2016, vê alguém no lado do Partido Republicano que possa batê-la?
Vou ser muito honesto consigo. Sou uma das poucas pessoas que não tem a certeza se Hillary Clinton vai candidatar-se. Mas isto é uma conversa para outro dia, porque seria muito longa. Os Republicanos têm tendência para escolher os seus candidatos como se estivessem a atribuir um prémio de carreira, por isso acho que a escolha será entre Mitt Romney e Jeb Bush, apesar de achar que Rand Paul é um candidato muito forte.

Vai depender muito da forma como os candidatos Republicanos do movimento Tea Party se comportarem nestas eleições?
Sim, sem dúvida. Rand Paul é interessante porque os Republicanos têm de conseguir chegar aos mais jovens. Esta geração vai constituir cerca de 30% do eleitorado em meados da próxima década. Terão entre 18 e 35 anos de idade e o Rand Paul é o único candidato do Partido Republicano que pode agradar aos mais jovens e aos hispânicos.

Mas por que considera que Hillary Clinton não vai candidatar-se à Presidência em 2016?
Eu sabia que ia voltar a isso. A explosão da bomba foi forte de mais para passar despercebida. Acho que ela tem o mesmo problema que tinha há oito anos (quando concorreu, e perdeu, nas primárias do Partido Democrata contra Barack Obama). Ela é inevitável de mais. Sempre que olho para os números das suas sondagens, nos 57% ou 58%, vejo um cenário de expectativas que não pode ser igualado. Ninguém consegue ter 57% ou 58% numas eleições Presidenciais. Em particular em estados como o Iowa ou New Hampshire. Em segundo lugar, tal como há oito anos, ela estaria à espera que a sua eleição para a Casa Branca fosse uma espécie de coroação.

Mas muitos analistas já dão como certa a sua candidatura…
O que eu vou dizer é pura especulação, mas acho que quando se viveu toda uma vida com um determinado objectivo, e ele fica muito perto de ser concretizado numa determinada idade, uma pessoa começa a questionar-se se realmente é isso que quer. Não ficaria surpreendido se for esse o raciocínio de Hillary Clinton.

Acha que ela está a travar uma luta interior?
Sim, não tenho dúvidas de que ela quereria muito ser a primeira mulher Presidente dos Estados Unidos. Acho também que um homem muito alto, que ela encontra de tempos a tempos, está a empurrá-la. Não vou dizer nomes. Acho que ele [Bill Clinton] nunca chegou a sair da Casa Branca. Mas eu não sou psicólogo.

Se Hillary Clinton não concorrer às Presidenciais de 2016, quais são os nomes mais bem posicionados no Partido Democrata?
É muito difícil de dizer, mas posso avançar alguns nomes que dariam bons candidatos, como os dois senadores da Virginia, Mark Warner e Tim Kaine. Mas vou avançar um nome em quem ninguém está a pensar: John Kerry. Ele ficou muito perto da vitória em 2004 (contra George W. Bush) e obteve quase 58 milhões de votos. Se os Democratas não quiserem nomear alguém sem experiência, então ele é um dos nomes mais indicados.

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