Chaves cria rede europeia de cidades romanas termais
Autarquia vai “reabrir” termas medicinais romanas em 2015, valorizando um legado que a colocou entre um grupo de cidades essenciais para o sistema de saúde imperial, há dois mil anos.
O pontapé de saída para esta rede de cidades com termas medicinais romanas vai ser dado esta semana, à margem do congresso internacional sobre o tema, que a autarquia está a organizar com a coordenação científica do seu arqueólogo, Sérgio Carneiro. De quinta a sábado, vários especialistas internacionais vão reunir-se em Chaves mostrando estudos e experiências internacionais de salvaguarda e valorização de achados – ou de ocultação, como aconteceu em Allianoi, na Turquia, onde uma cidade termal ficou submersa pela albufeira de uma nova barragem.
A memória de Allianoi vai ser lembrada em Chaves por Ahmet Yaras, da Universidade de Trakya, um dos convidados para este simpósio que tocará várias regiões do antigo Império. Em paralelo a esta iniciativa, a Câmara de Chaves reunir-se-á com pelo menos oito municípios – espanhóis, italianos e os portugueses de Vizela – para lançar as bases de uma rede que, num primeiro momento, permita a candidatura a fundos para estudos e estratégias de valorização deste património e, numa segunda fase, que possa conduzir a uma eventual candidatura deste conjunto patrimonial pan-europeu à UNESCO.
O presidente da Câmara de Chaves, António Cabeleira, espera que os esforços que a cidade está a levar a cabo permitam aumentar o número de pessoas que visita o concelho e que acabe também por potenciar a utilização das actuais termas de Chaves, indicadas, pelas suas águas quentes, para as mesmas doenças que já aqui se tratavam quando as legiões, no seu esforço de conquista desta parte da península, perceberam que, na Via XVII - ligação entre duas sedes de convento, Bracara Augusta (Braga) e Asturica Augusta (Astorga) - este lugar nas margens do Tâmega possuía condições para instalação não de um vulgar banho público, como o que existia em todas as cidades, mas de termas medicinais.
Segundo Sérgio Carneiro, é isso que distingue as termas romanas de Chaves e de outros cem lugares na Europa. As obras de construção destes “hospitais” – parte de um sistema de saúde pública imperial pensado, primeiro para os soldados, depois para toda a população – eram suportadas pelo Imperador, não pela cidade. E Chaves, a primeira povoação a receber estatuto de município no Noroeste, depois das sedes de convento, tinha a água, que ainda hoje brota no local a 65 graus, essencial para a recuperação das tropas, na retaguarda da sétima legião instalada na zona da actual cidade de Leão, e que, muito por isso, acabou por também ficar com o controlo das importantes minas de ouro da região, nos territórios dos actuais concelhos de Boticas e Vila Pouca de Aguiar.
A fama de Aqua Flaviae viajava então império fora. Era caso para se dizer que “Quem tem boca vai a Chaves”, tal a profusão de elementos que comprovam a presença de cidadãos vindos de Roma ou, mais perto, de Lugo, como os anéis em azeviche ali produzidos e que foram encontrados junto dos corpos dos aquistas que morreram soterrados, algures no século IV, quando o tecto das termas lhes caiu em cima. Passaram 17 séculos e, para o ano, vamos poder ali entrar, num edifício novo, que, numa segunda fase, vai ser equipado com tecnologias digitais que nos ajudarão a viajar no tempo, explica o presidente da câmara.