O ano do desagravamento do IRS também tem metas orçamentais exigentes

Em 2016, o futuro Governo terá, para cumprir as regras europeias, de continuar a reduzir o défice e a dívida a um ritmo elevado, arriscando-se a ter de suportar uma perda de receita fiscal.

Foto
Maria Luís Albuquerque eveitou impacto negativo do IRS em 2015 RUI GAUDÊNCIO

Em causa está um valor que pode chegar aos 760 milhões de euros, o montante estimado pelo Governo para os 3,5 pontos da sobretaxa de IRS actualmente em vigor. A opção tomada pelo Governo – e que deverá ser confirmada esta quarta-feira na proposta de Orçamento do Estado para 2015 – é a de evitar que um desagravamento desse imposto tenha um impacto negativo no cálculo do défice do próximo ano.

O Executivo tem esta preocupação porque continua a apontar para a meta de défice de 2,5% acordada com a troika e, face ao que tinha previsto no Documento de Estratégia Orçamental (DEO) de Abril, acabou por recuar na aplicação de um novo corte nas pensões e suavizou os cortes salariais aplicados na função pública. Passar de um défice de 4% para 2,5% é uma tarefa já muito difícil e cortar na sobretaxa, mesmo que parcialmente, seria mais um rombo nas contas de 2015.

A decisão foi por isso de, não deixando cair a imagem de desagravamento fiscal, passar uma eventual devolução do imposto para 2016, caso o andamento da receita fiscal em 2015 o permita.

O problema desta estratégia orçamental é, claro, o facto de os objectivos orçamentais para 2016 ficarem mais difíceis de atingir. E eles já eram, mesmo sem esta mudança, bastante pesados.

No DEO que negociou com a troika, o Governo apresenta como objectivo para 2016 uma redução do défice de 2,5% para 1,6%. O défice estrutural (aquele que não leva em conta o impacto do ciclo económico) tem de registar também uma redução de 0,5 pontos percentuais, cumprindo aliás o que são as regras para países em desequilíbrio orçamental na União Europeia. Por último, Portugal tem também de garantir uma trajectória de redução do rácio da dívida pública.

O Governo  espera que isso possa ser feito com a economia a registar um crescimento de 1,7%, ligeiramente mais alto do que os 1,5% esperados para 2015.

As dificuldades orçamentais para 2016 acentuam-se, se virmos que a meta traçada depende de uma redução de 0,3 pontos percentuais do PIB no peso das despesas com pessoal. Isto é particularmente exigente tendo em conta que não é ainda certo o que é que o Governo poderá fazer aos salários da função pública. Em 2015, é realizada a reposição de 20% do corte salarial actualmente em vigor, mas para 2016 nada é dito. O Governo retirou o artigo da lei chumbado pelo Tribunal Constitucional que apontava, de forma pouco concreta, para uma eventual devolução de mais 20% do corte salarial em cada ano até 2019.

A forma como o Governo pretende realizar a redução da sobretaxa faz com que também seja possível que o encargo orçamental ocorra no ano em que a economia não está a contribuir para a consolidação. É que, ao fazer da receita fiscal garantida em 2015 o indicador para decidir se haverá ou não um desagravamento fiscal em 2016, o executivo arrisca-se a colocar as finanças públicas do país numa situação em que, em 2015, o OE não é afectado, apesar de a economia estar a responder de forma positiva, verificando-se depois que o OE sai prejudicado, mesmo com a economia a fraquejar em 2016.

Este problema de desencontro entre a causa e o efeito deste desagravamento fiscal será um problema para resolver pelo futuro Governo.

Sugerir correcção
Comentar