Especialistas estão tranquilos com plano para responder ao ébola em Portugal

Vice-presidente da Sociedade Portuguesa de Doenças Infecciosas avisa que "o que é preciso é travar a epidemia de pânico e de medo".Unidades de saúde devem criar salas para doentes suspeitos.

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O equipamento usado pelo INEM para enfrentar eventuais casos de ébola INEM
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“Nos últimos dias esteve num país afectado pela epidemia por vírus ébola ou em contacto com um doente infectado por vírus ébola? E tem febre superior a 38 graus de início súbito?",  são as perguntas que devem fazer soar campainhas de alarme. Em caso afirmativo,os doentes serão encaminhados para salas preparadas pelas unidades de saúde para o efeito. Razões para divulgar agora em massa este cartaz? É preciso evitar o contacto de eventuais casos suspeitos com outros doentes que se encontrem nos estabelecimentos de saúde. Por isso, as pessoas com sintomas de doença e com este tipo de “ligação epidemiológica” devem “desde logo ser encaminhadas para um local separado”, explica o director-geral da Saúde, Francisco George, numa circular. Entretanto, na sexta-feira saber-se-á que alterações concretas ao plano de contingência vão ser propostas e adoptadas.  Francisco George prevê que, por exemplo, aumentem as exigências de segurança na colheita e no transporte do sangue dos doentes considerados suspeitos. "Actualmente o sangue não é inactivado, mas deverá ser no futuro", explicou ao PÚBLICO.

“O fundamental, agora, é travar a epidemia de pânico e de medo e dar uma boa informação às pessoas”, defende o vice-presidente da Sociedade Portuguesa de Doenças Infecciosas, Henrique Lecour, que está firmemente convencido de que não há condições para haver uma epidemia de ébola nos países ocidentais. “Pode haver um caso secundário, ou dois ou três, mas rapidamente ficarão contidos”, sublinha o médico e professor da Universidade Católica. “Se estivesse em causa uma epidemia de transmissibilidade aérea, como a da gripe, seria diferente”, nota Henrique Lecour, para quem as medidas até agora decretadas são “as medidas certas”, com o internamento dos casos suspeitos nos três hospitais de referência definidos para o efeito, o Curry Cabral e o D. Estefânia, em Lisboa, e o S. João, no Porto.

Quanto ao caso da auxiliar de enfermagem espanhola que ficou contagiada, Lecour especula que pode ter havido “algum problema, por exemplo ao retirar o fato de segurança”, mas que isso pode sempre acontecer.

Até ao momento, apenas quatro casos levantaram suspeitas em Portugal. O Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM), que tem um papel determinante no plano de contingência, especificou ontem que os quatro casos em que foi solicitado transporte (dois em Agosto, um em Setembro e outro na semana passada) se vieram a revelar todos negativos e que num deles o paciente nem chegou a ser internado porque se percebeu entretanto que não cumpria os critérios clínicos para ser considerado caso suspeito. “Estamos preparados para ir buscar qualquer doente, em qualquer situação, a qualquer sítio”, afirmou à Lusa o presidente do instituto, Paulo Campos, revelando que o INEM investiu cerca de 200 mil euros em material de protecção, como cinco “biobags”, uma espécie de casulo para transportar o paciente com toda a segurança, e fatos de protecção que instituto possui uma quantidade “suficiente.

Porém, apesar de todas as medidas e precauções, será sempre impossível reduzir o risco a zero. O Sindicato Independente dos Médicos (SIM) publicou ontem no seu site o “desabafo” de um médico não identificado que se queixa do facto de, no seu hospital, a “formação” feita se ter limitado a “uma circular a listar o material a vestir e usar em casos suspeitos”. O médico adianta ainda que, no Verão passado, um português que veio da capital da Libéria foi tratado no hospital por ter tido um enfarte e numa primeira fase lhe disseram que não eram necessários cuidados especiais para, "48 horas depois", afirmarem que "devia estar em isolamento". Mais tarde as análises revelaram que não estava contagiado.

"Não vamos embarcar no pânico"
Mas, apesar da decisão de publicar no site o testemunho anónimo do médico, o presidente do SIM, Jorge Roque da Cunha, desvalorizou o “desabafo” e fez questão de asseverar que não se trata da posição oficial do sindicato. “Não vamos embarcar no pânico”, frisou. Também Merlinde Madureira, da Federação Nacional dos Médicos (Fnam), acredita que os profissionais de saúde estão suficientemente  esclarecidos (“só precisamos de saber que o contágio é feito através de fluídos orgânicos”) e defende que o que é fundamental nesta fase é informar devidamente a população.

Para o bastonário da Ordem dos Médicos, que acredita que Portugal “está razoavelmente preparado para o aparecimento de casos suspeitos, até porque os hospitais estão habituados a decretar medidas de isolamento noutro tipo de doenças", o que faz sentido é “ redobrar os cuidados com os cidadãos que vêm de países de risco” e ter mais atenção ao tratamento dos resíduos.

Uma voz dissonante neste coro é a de Guadalupe Simões, do Sindicato dos Enfermeiros Portugueses, que adianta que alguns profissionais do D. Estefânia ( o hospital de referência em Lisboa para os casos pediátricos) se queixaram de não ter acesso “ a qualquer tipo de informação”.  “O problema é: se um doente não entrar directamente pela infecciologia, o que se faz?”, pergunta. “Não temos que entrar em pânico, mas temos que estar preparados para saber o que fazer”, conclui.

O Centro Hospitalar de Lisboa Central, a que pertence o D. Estefânia, garante, em resposta escrita, que "realizou os exercícios de simulação e as acções de formação na quantidade considerada adequada à boa informação e treino de todos os profissionais envolvidos".

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