Finanças avisam autarquias com 35 horas que estão a violar a lei

Governo homologou parecer da PGR sobre negociação colectiva nas autarquias. STAL exige divulgação do documento e Sintap receia bloqueio dos processos.

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Ministra das Finanças deverá voltar ao parlamento Enric Vives Rubio

No comunicado ontem divulgado, o executivo lembra que um ACCEP “só entra em vigor e, por isso, apenas produz efeitos depois de ser publicado em Diário da República”. Até lá, acrescenta, aplica-se a legislação geral em vigor. Por outras palavras, as autarquias que aplicaram de imediato os acordos que assinaram com os sindicatos, e que estão pendentes no Ministério das Finanças, não têm base legal para praticar as 35 horas. Têm de aplicar as 40 horas previstas na lei desde Setembro do ano passado.

De todas as formas, o Governo diz que será necessário negociar o conteúdo das quatro centenas de ACCEP que lhe foram enviados ao longo de quase um ano e que não foram publicados. “Em consonância com as conclusões do Parecer n.º 9/2014 do Conselho Consultivo da PGR, irá o Governo dar resposta fundamentada às propostas de ACEEP remetidas pelas autarquias locais e desenvolver os necessários processos negociais no sentido de se alcançar o entendimento e consenso quanto aos diversos aspectos das propostas”, refere o comunicado divulgado ontem à tarde, quatro meses depois de o parecer ter sido enviado ao secretário de Estado da Administração Pública, José Leite Martins.

Nesse processo, serão tidos em conta vários critérios, nomeadamente “os objectivos globais e individuais de equilíbrio financeiro das autarquias (em particular em matéria de endividamento e saldo orçamental), de não agravamento da respectiva massa salarial (incluindo em horas extraordinárias) e de efectivos ganhos de eficiência”.

O Ministério das Finanças não divulgou o parecer da PGR, mas diz que das suas conclusões “resulta o reconhecimento da  legitimidade dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das Finanças e da Administração Pública para a celebração de ACEEP em conjunto com as autarquias locais, devendo a sua actuação ser conjunta e articulada durante todas as fases da negociação”.

E embora a intervenção do Governo não se possa traduzir “na emissão de ordens ou directivas às autarquias locais”, cabe-lhe garantir o respeito pelos “princípios de racionalidade orçamental e de gestão e de coordenação das políticas de recursos humanos em toda a Administração Pública, cabendo-lhe dar resposta fundamentada e sugerir soluções negociais que assegurem a equidade interna no âmbito das Administrações Públicas e garantir a legalidade destes instrumentos de regulação colectiva de trabalho”.

Sindicatos reagem
Em reacção ao anúncio das Finanças, a Federação de Sindicatos da Administração Pública (FESAP) lamenta que o Governo "tenha aguardado tantos meses até homologar este parecer e apresentar uma solução para esta importante questão, sobretudo se tivermos em consideração que a posição assumida no comunicado vai no sentido de desenvolver novos processos negociais sobre as propostas de ACEEP negociadas e celebrados entre os sindicatos e as autarquias".

José Abraão, um dos dirigentes, disse ao PÚBLICO que vão reunir com o secretário de Estado, Leite Martins, “o mais rapidamente possível, para que sejam prestados esclarecimentos e apresentadas soluções" para desbloquear os acordos, garantindo as 35 horas de trabalho semanal".

A FESAP considera "inaceitável" que o Governo "continue a manter em segredo o conteúdo integral do parecer da PGR e que, depois de tanto tempo de espera, continuemos sem saber como e quando serão resolvidos os processos relativos aos ACEP negociados". Também a Associação Nacional de Municípios Portugueses reclamou a divulgação do parecer.

Por sua vez, o Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local (STAL) defendeu que o Governo publique os acordos colectivos para a manutenção das 35 horas de trabalho semanais nas autarquias e divulgue o parecer sobre a matéria.

 "Acabámos [ontem] de enviar um ofício ao Ministério das Finanças [MF], sendo parte interessada, a comunicar que se homologaram o parecer já não têm nenhuma razão para não dar o parecer", afirmou à agência Lusa Francisco Braz, presidente do STAL.

 Francisco Braz revelou que o secretário de Estado da Administração Pública, após ter sido intimado judicialmente, em segundo instância, a justificar a suspensão da publicação dos mais de 400 acordos na posse do Governo, "foi notificado para dar conhecimento do parecer da PGR, mas ainda não o entregou".

 A origem do problema está num diploma, de Setembro do ano passado, que institui as semanas de 40 horas na administração pública. Confrontado com um pedido de fiscalização sucessiva, o Tribunal Constitucional entendeu dar luz verde ao diploma, com o argumento de que nada impedia que sindicatos e entidades empregadoras acordassem horários inferiores.

 Confrontado com uma avalanche de ACEEP que lhe chegaram às mãos, Leite Martins pediu então à PGR para se pronunciar, especificamente, sobre a autonomia das autarquias para celebrarem esses acordos, sem a intervenção do Governo. Desde que o pedido foi feito, em Fevereiro passado, nenhum acordo de organismos autárquicos do Continente foi publicado em Diário da República. Mas em muitas câmaras, como Cascais, Lisboa e Sintra, entre outras, trabalha-se sete horas por dia e 35 por semana.

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