Associação denuncia "erro matemático" na colocação de professores
A Associação Nacional de Professores diz que, com base nos dados disponíveis, "chegou à única tese possível": o MEC terá cometido "um erro informático" que levou a uma ordenação incorrecta dos docentes que esta segunda-feira começam a chegar às escolas.
Qualquer grupo de professores ou blogue sobre Educação se encontra desde sexta-feira recheado de fórmulas, que fazem parte das tentativas para descobrir qual a utilizada pelo Ministério da Educação e Ciência (MEC) para ordenar milhares de professores sem vínculo que concorrem à Bolsa de Contratação de Escola (BCE).
A BCE vem substituir as chamadas ofertas de escola nos 304 estabelecimentos em Território Educativo de Intervenção Prioritária (TEIP) e com autonomia, que contratavam directamente os professores em falta, depois da colocação dos do quadro e da contracção inicial dos docentes sem vínculo. Com a BCE, o MEC centralizou o processo e tentou eliminar factores de subjectividade na selecção de professores, ao validar previamente os critérios e subcritérios de selecção que os directores podiam indicar e que correspondem à “avaliação curricular”.
A indignação, contudo, é crescente, desde que foram conhecidas as listas da BCE, sexta-feira. Os docentes são contratados pela ordem em que ficaram nessas listas; e procuram entender como pode uma pessoa ter sido posicionada centenas ou mesmo milhares de lugares à frente de outra, em comparação com o que aconteceria se a ordenação fosse feita de acordo com a graduação profissional (determinada pela nota de curso, pelo número de anos de serviço e pela avaliação).
Números absolutos e relativos
O MEC defende que as listas feitas de acordo com a graduação profissional e as da BCE são incomparáveis. A mudança de lugar, argumenta, resulta do facto de a ordenação na BCE ser feita com base na classificação de cada professor, que por sua vez depende da média ponderada de 50% da graduação profissional e 50% da avaliação curricular.
Os professores não se conformam com a explicação. “O valor de 50 por cento dado à avaliação curricular não explica a discrepância de centenas ou mesmo milhares de lugares na lista”, afirma César Israel Paulo.
Segundo diz, “depois de colocar muitas hipóteses", tendo como base os dados conhecidos sobre cada professor (a graduação profissional e a classificação final na BCE), a ANVPC está convicta “de que há um erro matemático”. “O MEC terá ignorado que a graduação profissional é um valor de base 20 [numa escala de números absolutos, e não uma percentagem] e somou 50% desse valor com 50% da percentagem obtida na resposta aos subcritérios relativos à avaliação curricular sem converter uma das grandezas”, afirma.
A confirmar-se, diz o dirigente da ANVPC, a graduação profissional (que estabelece a ordenação nos restantes concursos de colocação de professores), tem um peso muito inferior na classificação final em relação ao que é dado à avaliação curricular, contrariando o que a lei determina que aconteça na BCE.
A ANVPC faz notar que, ao contrário do que diz o MEC, os professores não sabem quais os subcritérios de selecção especificamente associados a cada escola, para a avaliação curricular. Na aplicação, os docentes tinham acesso aos critérios colocados pelas escolas em geral, mas não conseguiam saber a que escola, em concreto, reportavam.
César Israel Paulo sublinha, ainda, que alguns professores concorreram a mais de duas centenas de escolas e a vários grupos de recrutamento (áreas disciplinares), e que existe uma lista para cada um dos grupos de recrutamento de cada uma dessas centenas de escolas a que concorreram. Em cada uma o mesmo docente ocupa um lugar diferente.
Directores com dúvidas
Para apurar “o que de facto se passa” César Israel Paulo exige saber as cotações associadas a cada item de resposta, em cada escola e em cada grupo de recrutamento; e também a cotação por candidato, por escola e por grupo de recrutamento. “Só assim os professores poderão fazer comparações e avançar com um processo de recurso hierárquico coeso, justo e objectivo", justifica.
Os directores de escolas também têm dúvidas. A lei determina que um professor que não aceite a colocação fica impedido de se candidatar a este ou a outro concurso para dar aulas, este ano. As instruções que os directores receberam sobre a BCE, na sexta-feira, estabelecem, contudo, excepções a esta regra. Uma das excepções é o facto de os dados da candidatura não serem comprovados.
“Isto significa que no caso de um professor ter prestado falsas declarações e elas não se comprovarem ele não fica impedido de se candidatar neste concurso? Quero crer que não, mas é lamentável que tenha esta dúvida a 24 horas de receber na escola estes professores”, disse ao PÚBLICO Filinto Lima, da Associação Nacional de Dirigentes de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP).
Filinto Lima também considerou não estar claro que os directores têm obrigação de comprovar a veracidade das declarações dos docentes, apesar de admitir "que, provavelmente, todos o vão fazer, por curiosidade natural e para conhecerem o percurso das pessoas que chegam para trabalhar nas suas escolas, podendo, assim, aproveitar melhor as suas potencialidades”.
Em resposta a uma das questões colocadas pelo PÚBLICO sobre este assunto, o MEC refere que "cada director deve adoptar a metodologia que considerar adequada". E esclarece que "os casos em que se levanta a suspeita de haver falsas declarações são enviados para a Inspecção-Geral de Educação" e "que, até decisão final, os candidatos continuam nos concursos" e "nas escolas".
Na noite de sábado o PÚBLICO pediu esclarecimentos ao MEC, pelos quais aguarda. O ministro, os secretários de Estado e o próprio primeiro-ministro têm insistido que o início do ano lectivo está a decorrer dentro da normalidade. Na sexta-feira o MEC garantiu que 2500 dos 3473 horários que ainda estão em falta serão preenchidos esta segunda-feira, precisamente através da BCE.