A emigração foi a solução para o emprego de 4% dos engenheiros desde 2011
Secção do Norte da Ordem dos Engenheiros não vê “um drama” na saída do país e lança programas para ajudar profissionais a encontrar emprego. O apelo internacional também pode ser uma forma de contrariar a diminuição dos candidatos no ensino superior.
Brasil, Angola e Moçambique são os três países mais procurados: juntos acolheram 57% dos profissionais que saíram do país desde o início de 2011. No mesmo período, deixaram Portugal um total de 1893 engenheiros, que representam 4,3% do total de inscritos na Ordem neste momento. Reino Unido (137) e Noruega (33) são os outros dois mercados mais apetecíveis para os engenheiros nacionais.
Face à crise económica nacional e às dificuldades do mercado de trabalho interno, a tendência para a emigração de engenheiros esteve em constante crescimento nos últimos três anos – mais do que duplicou entre 2011 e 2012 e aumentou 30% no ano seguinte. No entanto, no início deste ano, o ritmo de saídas sofreu uma redução: no primeiro semestre deste ano, a Ordem emitiu 289 declarações que permitem a estes profissionais trabalharem fora do país, um valor que corresponde a um recuo de cerca de um terço das saídas face a igual período do ano anterior. Entre os engenheiros que emigraram em 2014, cerca de metade (137) foram para Angola, Moçambique e Brasil, que continuam a ser os destinos mais procurados.
“Sair do país não tem que ser um drama. O mercado está hoje globalizado”, defende o presidente da Secção do Norte da Ordem, Fernando Almeida Santos. Como o ensino de engenheira em Portugal “tem boa qualidade”, estes engenheiros podem ser “uma mais-valia” em muitos países, sobretudo no Norte da Europa, no caso das tecnologias, ou em economias emergentes, no caso das engenharias clássicas, especialmente a civil.
Para dar resposta às necessidades dos engenheiros que emigram, a OE liderou o estabelecimento de uma série de acordos com as associações congéneres de cerca de uma dezena de países, dando prioridade aos Estados Unidos, Reino Unido e Espanha, bem países Lusófonos e da América Latina. Além disso, Portugal inscreveu-se na federação mundial de organizações de engenheira – era o único país da Europa fora da organização.
“Hoje, se um engenheiro não tiver emprego em Portugal e surgir uma oportunidade na Colômbia ou em Angola, sabe que sua Ordem tem um convénio com essas organizações congéneres que lhe reconhecem o exercício da profissão nesses países em reciprocidade”, explica Almeida Santos.
Para os recém-licenciados, a OE lançou também um programa de promoção do acesso à profissão. O Percurso de Integração Profissional do Engenheiro e Estagiário (PIPE2) parte de um conjunto de parcerias com empresas como a Siemens, a Nestlé ou a Colep, que vão receber os jovens engenheiros, e tem como objectivo ajudar os diplomados na procura e realização do primeiro estágio.
O PIPE 2 procura responder às dificuldades hoje sentidas pelos recém-formados para encontrar um estágio, o que é um passo fundamental para a inscrição na Ordem. Sem o estágio, os engenheiros não podem ser reconhecidos pela OE e, sem passarem por esse crivo, têm menos oportunidades de emprego. Mesmo as possibilidades de emigração serão mais difíceis sem esse passo, dadas as especificidades da profissão que obrigam ao reconhecimento profissional para que os engenheiros possam assumir determinadas responsabilidades num projecto.
A OE vai lançar também uma campanha de promoção da engenharia junto dos estudantes do ensino de secundário e das famílias. “Neste momento são os próprios pais a dizer aos filhos 'Vais para engenheiro? Estás tramado'. Nós queremos contrariar isso”, explica Almeida Santos. A âncora desta iniciativa será a Casa do Engenheiro, um parque interactivo dedicado à engenharia, onde os estudantes do ensino secundário podem conhecer as várias especialidades de engenharia e as suas aplicações. O equipamento deverá ficar sediado no litoral Norte do país – neste momento decorrem negociações com a Câmara do Porto – e abrir dentro de três a quatro anos.
Para o presidente da Secção do Norte da OE, iniciativas como estas são a forma de contornar a perda de atractividade da engenharia. Os últimos dois anos trouxeram uma quebra acentuada na procura da área no ensino superior. Apesar de o grupo da “engenharia e técnicas afins” continuar a ser o terceiro na lista das preferências dos estudantes que se candidatam a uma universidade ou instituto politécnico, entre 2012 e 2014, houve menos 747 colocados nestes cursos. Este ano, nos cerca 200 cursos de engenharia, há 46 sem qualquer aluno na 1.ª fase do concurso nacional de acesso ao ensino superior – 38 em politécnicos e oito em universidades. Metade dos 20 cursos de engenharia civil não recebeu ainda qualquer aluno.
Para o líder da Secção do Norte da OE, esta situação explica-se com a ´”perda de prestígio” da profissão de engenheiro. “O étimo está banalizado e há muita confusão nas designações dos cursos”, avalia. Almeida Santos recusa a ideia de que a perda de atractividade da engenharia, sobretudo a civil, se deva à crise na construção. “Se assim fosse também haveria diminuição nos cursos de Arquitectura e isso não está a acontecer”, defende.
O próprio bastonário da Ordem dos Engenheiros, Carlos Matias Ramos, já manifestou a sua preocupação por causa da diminuição do número de alunos que entram em engenharia civil. E disse mesmo que a continuar neste ritmo, Portugal poderá não ter a curto prazo engenheiros civis para acompanharem as obras públicas que irão ser lançadas até 2020 com o novo quadro comunitário de apoio. O Governo prevê investir mil milhões de euros em cada um dos próximos cinco anos.