Sequenciado o primeiro rascunho do genoma da planta do café

Equipa internacional sequenciou o primeiro rascunho do genoma da Coffea canephora. Estudo mostra que a produção de cafeína nas plantas surgiu separadamente pelo menos duas vezes na evolução.

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A Coffea canephora é a segunda espécie mais cultivada de café, produzindo a variedade robusta Wouter Hagens

O primeiro rascunho do genoma desta planta foi finalmente sequenciado, a informação vem publicada na edição de hoje da revista Science e mostra que a produção da cafeína nesta planta evoluiu independentemente com a produção da cafeína na planta do chá ou na planta do cacau.

“O genoma do café ajuda-nos a compreender o que há de entusiasmante no café”, disse Victor Albert, investigador da Universidade de Buffalo, Nova Iorque, Estados Unidos, um dos autores deste artigo, que contou com cientistas de instituições de 12 países. “Ao olhar para as famílias de genes nesta planta, e a relação da estrutura do genoma do café e de outras espécies, pudemos aprender mais sobre o caminho independente que o café teve na evolução [das plantas], incluindo a história da cafeína”, explicou.

A sequenciação do genoma permite identificar as letras constituintes das longas moléculas de ADN, a famosa dupla hélice. Esta molécula constitui o material genético dos seres-vivos, guardada nos cromossomas, que estão nos núcleos de todas as células de cada organismo. Os humanos têm 23 pares de cromossomas, já a Coffea canephora tem apenas 11 pares.

Muitos segmentos de letras das moléculas de ADN representam genes. As células usam a informação destes segmentos para produzirem as suas proteínas. Num sentido mais lato, é a informação dos genes que define a cor dos olhos ou do cabelo das pessoas.

Ao sequenciar-se o genoma de uma espécie, é possível compará-lo com o genoma de outros seres vivos, tirando-se assim conclusões sobre o parentesco entre as espécies e ficando a conhecer mais aprofundadamente a história da sua evolução. Ou, como aconteceu neste caso, compreender se a evolução da produção de cafeína aconteceu independentemente, mais do que uma vez, na evolução das plantas.

A Coffea canephora é também conhecida como Coffea robustas, e é endémica da África subsariana Central e Ocidental. Juntamente com o Coffea arabica, estas duas espécies de plantas são “donas” do café que bebemos. A variedade robusta, conhecida pelos grãos terem mais cafeína, tornando o café mais amargo, representa 30% da produção mundial de café. Plantam-se 11 milhões de hectares de café, o lucro de exportação foi de 15,4 mil milhões de dólares (11,83 mil milhões de euros) em 2009-2010. Em 2013, produziram-se 8,7 milhões de toneladas de café.

A planta Coffea arabica foi produzida a partir de um híbrido da Coffea canephora e da Coffea eugenioides. “A nível mundial, a produção do café arábica depende de um pequeno número de cultivos com muito pouca diversidade genómica”, explicou Dani Zamir, investigador da Universidade Hebraica de Jerusalém, em Israel, que não integrou o estudo mas escreveu um artigo de perspectiva na Science a acompanhar a descoberta. “A chave para assegurar que o café pode sobreviver como uma espécie de cultivo depende na variação genética encontrada nas espécies africanas.”

A Coffea canephora é uma das 11.000 espécies da família Rubiaceae. Os investigadores sequenciaram 25.574 genes, que codificam proteínas. Ao contrário de muitas outras espécies de plantas, os cientistas não descobriram nenhum fenómeno de duplicação do genoma inteiro no antepassado da família do café. O fenómeno de duplicação dos cromossomas é comum nas plantas como o tomate, que pertence a uma família próxima à família da planta do café.

Mas terá sido outro fenómeno o que levou à diferenciação de tantas espécies na família Rubiaceae. “A diversificação evolutiva do genoma do café foi provavelmente mais impulsionada por duplicações de famílias de genes, em vez de uma duplicação em massa”, explicou Patrick Wincker, do Centro Nacional de Sequenciação, na França, que faz parte da equipa.

Os investigadores notaram que a Coffea canephora tem uma colecção grande de genes que codificam enzimas N-metiltransferases, essenciais na produção de cafeína. “A cafeína é sintetizada nas folhas, onde tem propriedades insecticidas, e nas bagas e sementes, onde inibe a germinação de sementes de espécies competidoras”, lê-se no artigo.

Tanto a planta do chá como a planta do cacau produzem cafeína. Ao compararem os genes das enzimas N-metiltransferases nestas duas plantas com os da Coffea canephora, os investigadores concluíram que a sua origem era completamente diferente. “Pode-se inferir que há pelo menos duas origens diferentes da actividade biosintética do café das enzimas N-metiltransferases”, defendem os autores.

Para Dani Zamir, o próximo desafio é tornar a informação genética útil para o cultivo do café para enfrentar as alterações climáticas e as pragas. Mas a biodiversidade do café pode estar em causa. “Uma pesquisa dos recursos genéticos do café na Etiópia encontrou um rácio alarmante de erosão genética devido à desflorestação e a esforços de conservação inadequados”, apontou o investigador. “Este perigo deve ser um incentivo para as partes interessadas [na indústria do café] iniciarem uma colaboração internacional em projectos de reprodução assistida e de conservação de germoplasmas com os países pobres exportadores de café.” 

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