Reino Unido financia equipa que investiga estrutura e crimes do Estado Islâmico

"Percebemos que não estamos perante uma organização militar, estamos a testemunhar o processo de criação de uma nação", disse um investigador à BBC.

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Abu Bakr al-Baghdadi, o líder de uma estrutura muito bem organizada e disciplinada AFP

Os elementos do grupo de investigadores que falaram à BBC disseram que os jihadistas estão muito bem organizados e que existe uma grande disciplina: "Muito mais do que esperávamos", admitem. "O grande avanço [na investigação] deu-se há dois ou três meses, quando pudemos olhar para o conjunto do material que recolhemos. Eles estão a construir um estado islâmico no deserto".

A equipa, que recebe o equivalente a 53 mil dólares por mês do Governo britânico, está sediada numa cidade europeia cujo nome não é revelado. O nome dos especialistas — com experiência de investigação em crimes de guerra — também não é divulgado. E o trabalho da equipa é descrito como "secreto", apesar da notícia e de vários investigadores (entre eles o chefe do grupo) terem falado à estação de televisão, todos sob anonimato.

Diz a BBC que o grupo tem caixas de provas que saíram clandestinamente da Síria. As provas consistem em documentos, cartões de memória e relatos de testemunhas. Entre os documentos há actas das reuniões provinciais do Estado Islâmico, uma delas de Alepo e com pormenores como a proibição dos guardas dormirem depois das 7h30.

Foram esses documentos que ajudaram os investigadores a perceber que o EI não pode ser considerado apenas um grupo militar — estão a ser assegurados a prestação de serviços e outros aspectos do bem estar da população do Califado, como acontece noutro estado.

O EI tem uma estrutura "um mais quatro", perceberam os investigadores. O Califado — no início do Verão o território que o grupo controla passou a ser denominado assim — tem um líder, o califa, Abu Bakr al-Baghdadi. Abaixo deste há quatro conselhos, o da sharia (lei islâmica), o da shura (consultivo), o militar e o de segurança; os dois últimos são mais importantes. Esta estrutura hierarquica é replicada de cima para baixo, até ao nível local.

"Gostaríamos de ver os assassinos de James Foley levados à Justiça", disse o chefe da investigação sobre o primeiro jornalista americano decapitado pelo EI como represália pelos ataques aéreos dos Estados Unidos contra posições dos jihadistas no Curdistão iraquiano. Depois disso, outro jornalista americano, Steven Sotloff, foi decapitado e no vídeo da sua morte surge um britânico a ser ameaçado de morte.

"Dito isto — continuou o investigador chefe —, esses agressores em particular e outros como eles não são o foco da nossa investigação. Estamos à procura dos membros do EI ao mais alto nível, pois esses são tão responsáveis pelos infindáveis crimes como os que matam com as suas próprias mãos. Na verdade, os líderes são mais responsáveis porque não matam uma ou duas pessoas, são responsáveis por todas as mortes".

A equipa já reuniu mais de 400 processos relativos a crimes, estando documentada a "responsabilidade da estrutura de comando" nas atrocidades cometidas nas zonas que os jihadistas controlam. Os crimes são muitos e incluem raptos, decapitações, crucificações e execuções sumárias. Alguns dos processos sobre crimes deverão ficar concluídos antes do fim do ano, mas os responsáveis admitem que será muito difícil julgar os criminosos, pelo menos de momento.

Outra das frentes da investigação é o recrutamento. O grupo de especialistas já concluiu que após a criação do Califado o recrutamento aumentou, estimando que os membros do EI sejam, de momento, entre dez mil e 30 mil. Há uma grande diversidade entre os membros, com os tunisinos e os tchetchenos a serem os preferidos dos emires (os comandantes) pela sua "ferocidade e experiência em campo de batalha". Os britânicos que chegam ao Estado Islâmico têm pouca ou nenhuma experiência militar e entram no Califado sobretudo a partir da Turquia. Após um treino de três meses, são enviados para os seus postos.

"Os ocidentais são treinados para tarefas menos importantes, pois chegam ao terreno sem experiência de combate. Assume-se então que devem dar assistência ao grupo na área dos serviços porque não têm a experiência religiosa e militar que os especialistas do EI procuram".

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