Novas regras da ADSE compensam corte de financiamento do ensino superior maior do que o anunciado
Proposta do Governo parte de corte de 2,6%, mas redução dos custos fixos das instituições com os funcionários faz baixar perdas. Porto tem situação particular e pode perder 3% do seu orçamento.
A operação decidida pelo Governo para o orçamento do ensino superior para o próximo ano é complexa. A dotação proposta para 2015 é de 950 milhões de euros, o que corresponde a um corte de 1,5%. Mas o ponto de partida para a proposta do MEC é uma redução nas transferências públicas de 2,6%, que é depois compensada com as novas regras para a ADSE: os serviços públicos, entre os quais estão as instituições de ensino superior, deixam de participar com 1,25% nos descontos dos funcionários, que agora são totalmente suportados pelos beneficiários.
Na prática, as universidades e politécnicos perdem apenas os 14 milhões anunciados na terça-feira pelo ministério, porque diminuem as suas despesas fixas no próximo ano, uma informação sublinhada pelo MEC quando confrontado com o PÚBLICO com as críticas feitas pelos reitores de duas das principais universidades portuguesas a propósito dos impactos da redução orçamental.
“Não sabemos ao certo como isso se vai processar, portanto não podemos falar em valores como os que o Governo anunciou”, contesta o reitor da Universidade de Coimbra, João Gabriel Silva, segundo o qual “o corte é bastante superior ao anunciado”.
E nem as novas regras parecem acalmar este responsável: “Entre o vai e vem destas medidas, alguma coisa se perde. E nós temos ficado sempre a perder.”
Na Universidade do Porto, o impacto real será, nas contas da instituição, de 3,01%. O Porto vive uma situação particular, uma vez que ainda vai receber verbas relativas ao PIDDAC, que agora passam a estar incluídas na dotação global, o que implica uma perda de financiamento real. E nem as novas regras para a ADSE descansam estes responsáveis, que colocam várias dúvidas sobre os efeitos práticos da medida.
A nova redução orçamental vai colocar “uma universidade pujante, numa situação muito complicada”, defende o reitor da Universidade do Porto, Sebastião Feyo de Azevedo: “Estamos a caminhar muito rapidamente para uma política de subsistência e isso é muito preocupante para o futuro do país.”
Em Coimbra, o reitor diz que a situação vai obrigar à manutenção de uma política de “minimização de estragos” que tem sido seguida nos últimos anos, por força dos cortes de financiamento já acumulados. João Gabriel Silva sublinha que “seria inexplicável que uma instituição com sete séculos fosse abaixo no século XXI”.
Em declarações à agência Lusa, o presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CCISP), Joaquim Mourato, lembra que neste momento as instituições já não estão a “conseguir honrar toda a despesa”, uma situação que vai agravar-se no próximo ano: “Se pagarem salários, não pagam descontos, se pagarem descontos não pagam fornecedores. Não dá para fazer todos os pagamentos.” A situação também tornará impossível “manter o nível de actividade e ter tanta oferta formativa”, garante.
Não foram só as universidades e politécnicos a criticar o novo corte anunciado. Os partidos da oposição também criticaram a decisão. António Galamba, do PS, acusa o Executivo de “já não se contentar em destruir o presente”, estando agora a “hipotecar o futuro do país” com este corte no ensino superior. Em comunicado, o PCP considera “inaceitável” que, “apesar dos esforços que as instituições têm feito para ultrapassar as dificuldades”, ainda seja preciso “cortar mais”.
A defesa do Governo foi feita pelo deputado do PSD Duarte Marques, que considera o corte anunciado “bem menor que os anteriores”, lembrando que as verbas para a acção social se vão manter e que foram recentemente lançados os programas Mais Superior e Retomar, tentando levar mais jovens para o ensino superior.
Notícia corrigida às 10h57 do dia 14/08/2014 Inicialmente esta notícia foi escrita com base no pressuposto de que as novas regras da ADSE se aplicam apenas a universidades e institutos públicos, quando na verdade se aplicam a todas as instituições públicas