Como a queda da poupança está a ajudar a economia a crescer
Portugueses estão a poupar uma parte menor do seu rendimento. Isso tem sido decisivo para o crescimento da economia nos últimos meses, mas causa preocupação em relação à sustentabilidade da retoma.
De acordo com os dados publicados pelo Instituto Nacional de Estatística esta sexta-feira, a taxa de poupança das famílias (que mede a percentagem do rendimento disponível que não é usado para consumo) desceu no primeiro trimestre deste ano para 11,9%. Acentua-se assim, uma descida que se iniciou depois de no segundo trimestre de 2013 se ter registado uma taxa de 13,5%, o valor mais alto desde a criação do euro em 1999.<_o3a_p>
É essencialmente esta redução da poupança que consegue explicar a aceleração do consumo privado registado no país durante o mesmo período. O consumo, que apresentava uma variação homóloga negativa de 2,3% no segundo trimestre do ano passado, registou um crescimento de 1,5% no primeiro trimestre de 2014, tal como já tinha revelado o INE nos dados das contas nacionais publicados no mês passado. A subida de consumo não aconteceu contudo como uma resposta a um aumento do rendimento disponível, um indicador que registou taxas de variação homólogas negativas nos quatro últimos trimestres.<_o3a_p>
O que se passou foi que, depois de um longo período em que os portugueses, em média, cortaram o mais que puderam naquilo que consumiam, começam agora a recuperar a confiança e a arriscar gastar uma maior parte do seu rendimento. Há vários factores a contribuírem para esta mudança. Por um lado, os níveis de confiança dos consumidores têm vindo a subir, registando-se uma menor preocupação relativamente à evolução da economia, do desemprego e da situação financeira particular de cada família. Depois da chegada da troika e do agravamento da austeridade, a confiança atingiu níveis mínimos históricos. Por outro, há consumos de bens duradouros, como automóveis, que foram adiados durante anos consecutivos e que agora se torna natural que registem alguma recuperação.<_o3a_p>
Este cenário de recuperação da confiança dos consumidores até pode ser considerado normal e desejável à medida que a economia recupera. O preocupante é se o crescimento da economia estiver apenas sustentado nesta melhoria de expectativas. Nesse caso, e tendo em conta o elevado nível de endividamento das famílias portuguesas, esta subida do optimismo poderia revelar-se rapidamente insustentável.<_o3a_p>
Há alguns sinais de que isso possa estar a ocorrer em Portugal. É o consumo – baseado na redução da poupança – que tem vindo a sustentar a aceleração da economia portuguesa. O crescimento homólogo do PIB de 1,3% no primeiro trimestre foi garantido graças ao contributo positivo de 2,8 pontos da procura interna (consumo mais investimento). Pelo contrário, a procura externa líquida (exportações menos importações) teve um contributo negativo de 1,6 pontos.<_o3a_p>
Não é por isso coincidência, como revelou também esta sexta-feira o INE, que Portugal tenha voltado a registar um défice externo negativo durante os primeiros três meses deste ano. Abrandamento das exportações e, principalmente, aceleração das importações (também ajudadas pelo consumo), levaram a um saldo negativo com o exterior equivalente a 1,4% do PIB, algo que já não acontecia há três trimestres.<_o3a_p>
Ao nível das finanças públicas, o INE revelou que o défice público registado em Portugal durante o primeiro trimestre deste ano foi de 6% do PIB. Estes são os primeiros dados oficiais publicados para este período utilizando a metodologia aplicada pelo Sistema Europeu de Contas, aquele que conta para a avaliação do cumprimento das metas com que o Estado português se comprometeu junto das autoridades europeias e da troika.<_o3a_p>
O valor de 6% registado durante os primeiros três meses do ano fica acima da meta de 4% projectada pelo Governo para a totalidade deste ano, o que significa que, no resto de 2014 este resultado terá de ser compensado com défices mais baixos por forma a que o objectivo seja atingido.<_o3a_p>
No entanto, é de notar que olhando para a série histórica dos saldos orçamentais em Portugal, se verifica que o primeiro trimestre de cada ano é aquele em que normalmente o défice é mais elevado. No ano passado, o valor registado foi de 10% do PIB, o que não impediu que, também com a ajuda de receitas extraordinárias, se registasse um défice de 5% no total do ano.<_o3a_p>