Ansiedade escolar prejudica desempenho e saúde de cada vez mais crianças

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Há alunos que vêem sucesso escolar como a única característica boa Adriano Miranda

Carla Barbosa, estudante universitária, tem perturbações de ansiedade desde o secundário, que se manifestam em ataques de pânico, transtornos alimentares e do sono. Casos como o de Carla são cada vez mais frequentes e precoces, afectando crianças desde o primeiro ciclo. Os especialistas alertam para as doenças psicológicas que podem ser provocadas pela pressão pessoal, familiar e do próprio sistema educativo.

“Começa com as pontas dos dedos adormecidas, depois sinto-me com falta de ar, os músculos contraídos, sem conseguir andar e choro compulsivamente.” É assim que Carla, 21 anos, descreve os ataques de pânico provocados pela ansiedade escolar. A estudante da Faculdade de Direito da Universidade do Porto explica que as situações de stress eram mais graves na escola secundária. “Ao primeiro os meus colegas estranhavam, mas depois houve uma fase em que muita gente tinha”, continua.

Ainda hoje a ansiedade escolar tira sono e apetite à estudante: “na época de exames de Janeiro e Fevereiro perdi seis quilos.” O nervosismo é consequência da pressão social: “Sinto que tenho que me distinguir”, justifica.

Para Adelaide Telles, psicóloga dos Serviços de Acção Social da Universidade do Porto, a principal razão que leva os alunos a recorrer aos serviços de apoio é a dificuldade em lidar com a ansiedade, particularmente nos exames, acrescentando que “por vezes, a ansiedade leva a situações de depressão, isolamento e desistências.”

Mélanie Tavares é psicóloga e coordenadora da Mediação Escolar do Instituto de Apoio à Criança. Convive de perto com a ansiedade escolar, que diz ser “bastante frequente e não escolhe idades.” Cada vez mais cedo as crianças apresentam sintomas de ansiedade porque também cada vez mais cedo são expostas a situações de avaliação.

De acordo com a Ordem dos Psicólogos, não existem dados concretos sobre o stress na escola, mas numa compilação de dados de estudos portugueses e internacionais, a Ordem revela que os jovens que experienciam ansiedade na infância têm 3,5 vezes mais probabilidade de sofrer de depressão ou perturbações da ansiedade na idade adulta. Os mesmos estudos alertam para o aumento das doenças psicológicas, concluindo que numa turma de 30 alunos existem cerca de seis crianças com problemas de saúde psicológica.

Ana Catarina Jesus está no 5.º ano e lembra-se bem dos exames que fez no ano passado na sede do agrupamento. “Não estava nervosa, mas não conhecia a escola, não conhecia muita gente e ninguém reparou que eu comecei a chorar”, conta. Ana Catarina deixou o exame em branco. A mãe, Susana Jesus, recorda que a filha “ficou chateada, andava triste nos dias seguintes”, já que costumava ter boas notas nos testes.

Psicóloga de crianças e adolescentes, Catarina Policarpo explica que actualmente “há uma grande competitividade entre os jovens que começa no 1.º ciclo, há pressão para o sucesso por parte da escola, dos pais, de todo o meio envolvente e há pressão que os jovens colocam sobre si próprios. Quem não é bem-sucedido, não é bem visto pelos pares e pode até ser rejeitado, e isto é muito stressante.”

A psicóloga Joana do Carmo explica o fenómeno da ansiedade: “a criança tem uma determinada percepção da tarefa que lhe é proposta [como um exame] e compara o grau de dificuldade desta com a percepção que tem das suas capacidades, daí podendo resultar uma discrepância que quanto mais acentuada, mais ansiedade provoca.”

O meio envolvente contribui para a percepção da dificuldade da tarefa e para a auto percepção da criança ou jovem. Pais, professores e psicólogos concordam que os exames têm uma dimensão exagerada. “Os órgãos de comunicação social e os pais exacerbam a situação dos exames, que já tem muita carga dos professores. Os pais não transmitem segurança, fazem pressão e muitas vezes numa base de ameaça”, lamenta Joana do Carmo.

Os pais tendem a projectar nos filhos as suas expectativas e idealizações, muitas vezes inconscientemente, outras não. A psicóloga Mélanie Tavares recorda o caso de uma criança de um colégio, de uma família aparentemente estruturada, a quem os pais bateram com violência por ter um “bom” e não um “excelente”.

Existem também casos em que são os jovens que colocam uma grande pressão sobre si próprios. Mélanie Tavares refere, como exemplo, uma criança que desenvolveu uma úlcera no estômago porque exigia muito dela. A psicóloga explica que com elevados níveis de ansiedade “uma pessoa pode descompensar e isso leva a doenças psicológicas.”

São casos muito pontuais, mas preocupantes, de acordo com o psicólogo Nuno Sousa. Há alunos que vêem o sucesso escolar como a única característica boa e quando falham a vida deixa de fazer sentido. “Fazem de uma falha o falhanço da vida”, explica. Dá como exemplo uma aluna que sentia que o elemento de ligação com os pais era o sucesso escolar. Quando falhou, começou a descompensar e “a mistura de tristeza com a revolta foi o ponto de partida para uma tentativa de suicídio.”

No entanto, Victor Coelho, membro da direcção da Ordem dos Psicólogos, afirma que níveis de ansiedade e de stress, com conta e medida, podem funcionar como protectores e motivadores. O importante, mas também difícil, é encontrar o ponto de equilíbrio: “É preciso dotar crianças de capacidades para lidar com situações de stress.”

Texto editado por Nuno Pacheco

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