Oposição pede eleições, Governo quer colar Cavaco às suas opções

Se o Presidente enviar a contribuição para a sustentabilidade ao TC para fiscalização preventiva, como sugere o Governo, dá ideia de ter cedido à pressão do Executivo. Se promulgar a medida sem mais, dá ideia de o apoiar.

Foto
Tiago Machado

As eleições antecipadas não saem do discurso da oposição há quase três anos, sempre pela voz do PCP e Bloco de Esquerda, durante algum tempo também pelo PS, e agora ganharam novo fôlego com os resultados das eleições europeias, que a coligação governamental perdeu. No Parlamento a contestação já tomou a forma de seis moções de censura, todas chumbadas.

Depois de o Presidente ter deixado a porta semi-aberta ao cenário de eleições antecipadas, na sequência da crise governamental do Verão passado, neste momento a solução terá poucas, se não mesmo nenhumas, hipóteses. Apesar de o pedido vir da oposição, ele poderia, na verdade, acabar por ser favorável à direita, realça o politólogo André Freire.

Tal como estará, para já, fora de questão satisfazer o pedido de António José Seguro de convocação do Conselho de Estado na sequência das críticas do primeiro-ministro e de outros ministros aos juízes do Tribunal Constitucional (TC).

Pelo Governo, os sinais são mais discretos e vão no sentido da legitimação do seu poder. O episódio mais evidente, depois de o chefe de Estado não ter enviado o orçamento deste ano para o TC – que acabou por chumbar três das quatro normas para as quais lhe pediram fiscalização –, foi a aprovação, na passada semana, em Conselho de Ministros, da contribuição de sustentabilidade, a solução permanente que virá substituir a CES – Contribuição Extraordinária de Solidariedade. O Governo espera que Cavaco Silva envie a medida  para o TC com um pedido de fiscalização preventiva, para que o Executivo perceba o caminho que deve seguir para continuar a fazer cortes.

Tal antecipação é tida como uma pressão sobre Cavaco e a sua resposta, quando o diploma lhe chegar às mãos, será, no mínimo “interessante”, afirma André Freire. O politólogo considera a atitude do Governo uma “viragem”, já que, até aqui, desejava que o TC não interviesse e agora quer o contrário, como se o TC “tivesse que dizer o que o Governo deve fazer para governar”. Será interessante perceber se Cavaco vai, por um lado, “passar a fazer mais pedidos de fiscalização preventiva e, por outro, se será menos minimalista nos pedidos de fiscalização constitucional” – como foi com o orçamento deste ano que promulgou sem recorrer ao TC.

Para o politólogo António Costa Pinto, é de facto “uma pressão” que o Governo está a exercer sobre o Presidente, com o claro intuito de fazer o chefe de Estado assumir uma posição a favor do Executivo de Passos Coelho. Se Cavaco promulgar o diploma, concorda com o Governo; se o enviar para fiscalização preventiva, cede à pressão. “Significa colar o Presidente à estratégia governamental, diminuir a sua autonomia e associá-lo ao Governo de uma forma mais clara do que decerto o chefe de Estado gostaria”, nota António Costa Pinto, acrescentando que isso “diminui o lugar da instituição presidencial” ao nível de um regime parlamentar.

Depois de ontem ter sido conhecido que o Presidente promulgou a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, há ainda, por exemplo, por finalizar, a tabela salarial única para os funcionários públicos. E aguardam-se as medidas para tapar o buraco nas contas deixado em aberto pelo chumbo do TC, que o Governo já avisou que só serão definidas depois de conhecido o acórdão sobre as duas medidas do orçamento rectificativo acerca dos aumentos da contribuição para a ADSE e da CES deste ano.

Sugerir correcção
Comentar