Com tinta, floreiras e bancos, a câmara quer devolver o coração dos bairros aos lisboetas

O programa Uma Praça em Cada Bairro contempla 30 intervenções "prioritárias", que poderão tornar-se uma realidade já a partir do próximo ano.

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O vereador do Urbanismo lembra que “são os espaços públicos que dão identidade às cidades” e sublinha a necessidade de estes voltarem a constituir “o ponto de encontro de todos” Carla Rosado

Uma Praça em Cada Bairro é o nome deste programa, que foi apresentado na última reunião camarária. No documento distribuído na ocasião, o vereador do Urbanismo lembra que “são os espaços públicos que dão identidade às cidades” e sublinha a necessidade de estes voltarem a constituir “o ponto de encontro de todos” e não apenas “um espaço sobrante, um resto, sem autonomia nem estrutura própria”.

Definir quais são afinal os bairros de Lisboa foi, admite o chefe da Divisão de Projectos e Estudos Urbanos, Pedro Dinis, um dos primeiros desafios que se colocaram à equipa que desenvolveu este programa. Essa ideia é também vincada no texto de enquadramento do mesmo, no qual se frisa que “o bairro não possui uma definição precisa”, sendo “uma unidade teórica que na maioria dos casos não possui uma expressão administrativa física”, pelo que a sua delimitação é “algo imprecisa e discutível”.

Segundo as contas do município, em Lisboa existem 230 bairros, nos quais haverá qualquer coisa como 150 "centralidades", ruas e praças com características que lhes permitirão ter “um papel de aglutinação social”, como explica o arquitecto Pedro Dinis. Em conjunto com as juntas, foram escolhidas as 30 consideradas “prioritárias”, que incluem pelo menos uma em cada uma das 24 freguesias da cidade. Ajuda, Arroios, Avenidas Novas, Campo de Ourique, Estrela e Santo António têm, cada uma, duas intervenções previstas.

A intenção, de acordo com o chefe da divisão de projectos e estudos urbanos, é que para alcançar um desses espaços os munícipes não tenham de andar mais do que dez ou 15 minutos a pé. O arquitecto diz que as ruas e largos em causa têm “escalas muito distintas” (que variam, por exemplo, entre a do Largo do Rato e a da Praça Norte, nos Olivais), mas acrescenta que “em muitos casos” a solução a adoptar passa no essencial por promover a pedonalização de áreas hoje consagradas aos automóveis. A Avenida Duque de Ávila é apresentada como um bom exemplo daquilo que agora se pretende.    

Na documentação que distribuiu, o vereador Manuel Salgado reconhece que este “é um programa ambicioso”, por estarem em causa “muitas intervenções que necessitam de projectos mais ou menos complexos e exigem um investimento significativo na sua concretização total”. Daí que, justifica, se tenha decidido, “para adequar o programa à capacidade financeira e de realização do município e das freguesias, mas também para testar algumas das soluções de reorganização viárias propostas”, apostar numa primeira fase na “adopção de soluções reversíveis”.

Como? “Alterando a organização do espaço público com recurso a pintura no pavimento, floreiras e outros elementos de mobiliário urbano amovíveis”, explica o autarca com os pelouros do Urbanismo e do Espaço Público. Questionado pelos jornalistas sobre o horizonte temporal em que este programa será concretizado, Manuel Salgado sustentou que “muitas das intervenções têm condições para ficar prontas neste mandato”, até porque não necessitam de muito mais do que “umas latas de tinta, uns bancos e umas floreiras”.   

Da apresentação entregue aos vereadores e jornalistas, consta um “faseamento” que parece mais optimista: aí diz-se que as “intervenções low cost” serão realizadas ao longo de 2015 e que no ano seguinte serão lançadas e concluídas as empreitadas que irão permitir tornar definitiva a instalação de uma praça em cada bairro. Sobre os custos que isso terá não se fala em lado nenhum.

Na reunião da Câmara de Lisboa que se realizou na passada semana foram apresentadas, de forma sucinta, as soluções que se prevê concretizar em Picoas, Saldanha, nos largos do Calvário, do Rato e da Igreja de Benfica e na Praça Norte. No caso do Largo do Calvário, por exemplo, está a ser equacionada, por sugestão da Junta de Freguesia de Alcântara, a reposição de um fontanário antes existente, além da criação de um novo pavimento e da plantação de árvores. Quanto ao Largo do Rato, o arquitecto Pedro Dinis adiantou que está a ser pensada a instalação de uma rotunda, que já ali existiu no passado, e o regresso do eléctrico.

“São as pessoas que fazem a rua, a praça, o espaço público. O importante não é a obra, é a forma como o espaço é adquirido. Preocupam-me muito pouco os desenhos apresentados”, comentou o vereador dos Direitos Sociais. João Afonso considera que nesta fase o mais importante é mesmo “alargar a discussão” sobre este programa, para lá dos executivos da câmara e das juntas de freguesia.

O Plaza Program, que desde 2008 se vem realizando anualmente em Nova Iorque, é um dos exemplos de que a Câmara de Lisboa se socorreu para o desenvolvimento do programa Uma Praça em Cada Bairro. No caso da cidade norte-americana, a iniciativa é do departamento dos transportes, em articulação com entidades sem fins lucrativos, e visa garantir que todos os habitantes têm acesso a um espaço público “de qualidade” e “vibrante”, que fique a menos de dez minutos a pé dos locais em que se encontram.

Em Lisboa, Manuel Salgado explica que aquilo que no essencial se prevê fazer é "requalificar cada uma destas microcentralidades aumentando as áreas de estar ao ar livre, tornando-as mais confortáveis e seguras – alargar passeios, instalar esplanadas, plantar árvores, criar sombras, reintroduzir a água como elemento de paisagem urbana, atenuar o impacto do tráfego automóvel –, mas também incentivar a instalação de comércio e equipamentos colectivos de proximidade". Para, resume o autarca, citando o arquitecto e urbanista brasileiro Jaime Lerner, se transformar a cidade "no ponto de encontro das pessoas que alimenta a centelha criativa do génio urbano". 

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