Seguro não fecha a porta a Congresso Extraordinário
Cada vez mais pressionado para convocar directas e agendar um congresso, Seguro não foi tão taxativo como os seus generais nesta quarta-feira. Declarações expressas e demissões assumidas entremearam reunião com António Costa.
O sinal foi dado depois do encontro com o presidente da câmara de Lisboa. Num comunicado, o líder socialista confirmou que o seu adversário tinha considerado “importante a realização de um congresso” e que esse processo devia mesmo ser desencadeado pelo próprio secretário-geral. A comunicação terminava de forma lacónica: “O secretário-geral registou a posição do doutor António Costa.” Traduzida, a frase significava que Seguro tenciona anunciar a sua decisão na Comissão Nacional do Vimeiro no próximo sábado.
A Comissão Nacional, como António Costa referiu nesta quarta-feira, é uma das “três circunstâncias” através das quais o PS pode avançar com um novo processo electivo interno. Nesse órgão, as directas e a realização de um congresso fora de prazo podem ser aprovadas por uma maioria de dois terços. Actualmente, após a agora efémera cerimónia de cachimbo da paz celebrada em Janeiro do ano passado, a facção costista tem 33 por cento de assentos na Comissão.
Tudo começou na passada segunda-feira, quando António Costa anunciou a sua disponibilidade para disputar a liderança do principal partido da oposição. Na quarta-feira deu mais um passo em direcção ao embate ao confirmar a intenção de propor, na Comissão Nacional que se realiza este sábado, a convocação de directas e extraordinário.
“O secretário-geral do PS deve ponderar se toma a iniciativa ou não toma a iniciativa. Há uma Comissão Nacional marcada para sábado — e eu acho que é útil que haja congresso do PS. Naturalmente, se o secretário-geral do PS não apresentar a proposta de congresso, eu apresentarei a proposta na Comissão Nacional para que exista um congresso", disse António Costa depois de uma reunião de mais de uma hora com Seguro.
Definido como está assim o prazo por ambos, ficam a sobrar três dias para que os dois lados arregimentem aliados para a contabilização de apoios que dêem força aos seus argumentos. Ao que o PÚBLICO apurou, o dia de hoje serviu para isso mesmo, com os dois socialistas e respectivos partidários a desdobrarem-se em contactos. Costa praticamente não saiu do seu gabinete. E no Parlamento a azáfama era visível a olho nu com inúmeros deputados socialistas agarrados ao telefone, enquanto se dispersavam pela praça ajardinada localizada entre o velho e o novo edifício da AR.
Entretanto, os sinais visíveis da pressão colocada sobre Seguro foram-se acumulando ao longo do dia. Jorge Lacão e Susana Amador demitiram-se da direcção do partido, o secretariado nacional. O primeiro explicou que o tinha feito por não concordar com as “orientações” veiculadas por outros elementos da direcção, que manifestavam a indisponibilidade de Seguro para avançar para a marcação das directas. “Este não é o momento para invocar formalismos estatutários”, disse antes de acrescentar ser a favor de “devolver a palavra aos militantes”.
Idália Serrão, a terceira da quota de Costa no Secretariado Nacional, não foi tão longe. Limitou-se a solicitar uma reunião com Seguro, onde lhe transmitiu a “preocupação pelo momento que o partido está a viver” e defender a convocação de directas e congresso. Confirmou ao PÚBLICO que ficaria à espera até sábado pela decisão do líder. Ao mesmo tempo, continuavam a surgir declarações de nomes sonantes — como o ex-secretário-geral Ferro Rodrigues — a defender a “clarificação” através das eleições.
Essa posição parece indiciar a opção dos contestatários em “dar espaço a Seguro para abrir a decisão sobre o partido aos militantes”, como disse um dirigente ao PÚBLICO. OU seja, esperar até à Comissão Nacional para que o secretário-geral tome a sua decisão.
Contudo, resta saber o que vai fazer essa força da natureza que o fundador Mário Soares ainda é. Ao que o PÚBLICO apurou, o ex-Presidente da República quer a resolução sem mais atrasos do impasse criado. E esteve também durante o dia de quarta-feira em contactos com outros nomes “históricos” do partido, preocupado por o seu partido estar “a passar por uma situação destas”.
Direita capitaliza cisão no PS
Quem tentou lucrar com a situação foi a direita. Depois do líder parlamentar do PS ter tomado a palavra para falar de umas europeias “marcadas pela maior derrota de sempre da direita”, punindo assim “o Governo mais radical da nossa história democrática”, teve de ouvir o social-democrata Carlos Abreu Amorim, a retorquir-lhe que não era "a maioria e o Governo que se encontra em crise de identidade, nem em debates internos dos quais não se sabe o desfecho".
Também o deputado do CDS, Telmo Correia, aproveitou a deixa para sublinhar a "evidente discrepância" entre as proclamações de vitória dos socialistas e a leitura da realidade do "dia seguinte". "O centro-direita perdeu as eleições, o PS ganhou. Muitos parabéns, mas não deixo de registar que a sua declaração triunfal não parece ter gerado um entusiasmo por parte da sua bancada tão triunfal assim. Fiquei com a sensação de que muitos dos seus camaradas já estão no debate seguinte, no dia seguinte. O PS teve uma vitória, mas não o triunfo que o seu cabeça de lista antevia. Os eleitores do centro-direita ficaram em casa e não se juntaram ao PS", alfinetou.
A Alberto Martins não restou outra solução senão a de lembrar a "tradição" parlamentar de "não se discutir a democracia interna dos outros partidos". com Lusa