Críticos de mini-hídrica no Mondego começam a acreditar que obra não avançará

Ambientalistas, autarcas e operadores turísticos estão unidos contra um projecto cujo estudo de impacte ambiental também alerta para os impactos negativos.

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A lampreia é fundamental para a economia local Carla Carvalho Tomás

O projecto de construção do AHPP iniciou-se, adianta o Ministério do Ambiente Ordenamento do Território e Energia, em 2010 com a “publicitação de um contrato de implementação e de concessão publicado em Diário da República” tendo como concorrente vencedor o agrupamento Mota-Engil, denominação alterada posteriormente para Hidroeléctrica de Penacova e Poiares, Lda. (HEPP).

Após o processo de consulta pública do AHPP, que terminou no final do mês passado, a Quercus defendeu o cancelamento do projecto, uma vez que apresenta “impactos cumulativos negativos ao nível ambiental e socioeconómico, não só durante o período de construção, mas também na fase de exploração”. Esses impactos verificam-se a nível da transformação, fragmentação e degradação dos ecossistemas na bacia do rio Mondego, incluindo a criação de uma barreira para espécies migradores como a lampreia-marinha, o sável, a enguia-europeia e a savelha.

De acordo com um responsável da Quercus, Pedro Lucas “a construção deste empreendimento vai ser nociva” e vai “desconstruir o investimento feito no sentido contrário”. De acordo com este responsável, já havia sido aprovado um projecto pela Agência Portuguesa do Ambiente (APA) – co-financiado pelo programa PROMAR – com o objectivo de “reabilitar, restaurar e melhorar o estado de conservação das espécies migratórias”. Sendo assim, a construção da mini-hídrica “não tem lógica” uma vez que está a ser desenvolvido um projecto para colocar açudes, quando o objectivo é a remoção dos mesmos.

Além deste problema, de acordo com a Quercus e o município de Penacova, a construção de uma albufeira poderia levar à “degradação da qualidade da água, em resultado da existência de pontos de rejeição de águas residuais a montante com diferentes níveis de tratamento”. Esta situação é agravada pelo facto do rio Mondego ser classificado como “Massa de Água Rios em Risco”.

As razões para a apologia da não construção deste projecto não se ficam por aqui. Pedro Lucas explica que a zona é “um pólo dinamizador da actividade económica”, quer no que diz respeito à animação turística, com a prática de descida do rio em caiaque, como também à restauração e alojamento e actividades de lazer. A nível de turismo gastronómico, o rio Mondego tem um grande papel na economia local, uma vez que há uma grande exploração da lampreia-marinha por parte da restauração.

O responsável da Quercus adianta que ainda que a lampreia seja considerada “uma espécie de elevado valor económico e comercial”, há que ter em conta que é o “meio de subsistência das comunidades piscatórias da zona” e a colocação de açudes levaria à diminuição da espécie. “Não se pode pensar apenas na energia, temos pensar também na biodiversidade e na economia local que tem sido esquecida”, reforça Pedro Lucas.

Além da Quercus e do Município de Penacova, também a Plataforma Mondego Vivo contesta a construção do AHPP devido aos impactos que provoca. Após a discussão pública da Avaliação de Impacte Ambiental (AIA) do projecto que terminou a 28 de Abril, a Plataforma enviou para o ministério do Ambiente um documento com dez pareceres de diversas entidades a mencionar lacunas encontradas no estudo.

A Plataforma Mondego Vivo é um movimento de cidadãos, empresas e instituições que surge em 2011 precisamente para combater a construção da mini-hídrica no rio Mondego com argumentos turísticos, económicos, sociais e ambientais. O responsável da Plataforma, Paulo Silva explica que se tratou de uma medida do anterior governo “para reduzir o défice” através “da venda de lotes para construir mini-hídricas”. Paulo Silva adianta que o procedimento ocorreu ao contrário do que é, habitualmente, feito: “Primeiro o Estado concessionou e só depois é que foi feito o Estudo de Impacte Ambiental (EIA)”, EIA esse que resultou num “parecer desfavorável com impactos negativos muito significativos e não minimizáveis”. Ainda que o primeiro estudo, agora reformulado, tenha sido considerado pelas autoridades ambientais como incompleto, já revelava alguns impactos irreversíveis.

Ainda assim, a Plataforma e algumas entidades, entre as quais os municípios de Coimbra e Vila Nova de Poiares, decidiram enviar à Agência Portuguesa do Ambiente alguns documentos que pretendiam provar que este novo EIA continuava, ainda assim, incompleto. “O EIA não levou em conta um açude de V. N. de Poiares para construir uma praia fluvial, algumas infra-estruturas de captação de água em Penacova que com a construção teriam de ser deslocadas, bem como algumas infra-estruturas a jusante do local de construção da mini-hídrica”, aponta Pedro Silva. O responsável pela Plataforma diz que agora basta esperar que a APA tenha em conta estes dados adicionais, mas é da opinião que o promotor “já desistiu do projecto, uma vez que a construção implica o pagamento de elevadas indemnizações às empresas da zona”.

Dado ainda não ter havido uma evolução no sentido da aprovação ou chumbo do projecto de HEPP, o Grupo Mota-Engil SGPS, S.A., não comenta o assunto.

Contactada pelo PÚBLICO, a APA explicou que o primeiro EIA teve de ser reformulado, afirmando que, “18 de Março de 2013, foi declarada a conformidade do mesmo, após a apresentação dos elementos adicionais solicitados pela Comissão de Avaliação, o que permitiu dar continuidade à avaliação”.

Neste momento está a ser feita a avaliação do EIA por parte da Comissão de Avaliação que terá em conta “a informação apresentada pelo proponente, as exposições apresentadas em sede de consulta pública e pareceres externos recebidos” e até 2 de Julho saber-se-á, finalmente, se a mini-hídrica vai ou não para a frente.

Texto editado por Ana Fernandes

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