Amarelos, vermelhos e golpes

Foto

Ao fim de sete meses de agitação, e dois dias depois de terem instaurado a lei marcial, as Forças Armadas tailandesas tomaram o poder na quinta-feira. É o 19º golpe de estado em 80 anos. O chefe do Exército, general Prayut Chan-O-Cha, anunciou pela televisão que os militares assumem o poder “para restaurar a ordem, normalizar o país e fazer reformas políticas”. Foi decretado o recolher obrigatório.

Banguecoque é, desde Novembro de 2013, palco de confrontos com um saldo de 28 mortos. Sob a liderança de Soutep Thaugsuban, antigo líder do Partido Democrata, os “camisas amarelas”, que se dizem fiéis ao rei Bhumibol (86 anos), queriam derrubar o Governo de Yingluck Shinawatra. Esta é irmã do antigo primeiro-ministro Thaksin Shinawatra, exilado no Dubai. Do outro lado da barricada estão os “camisas vermelhas” rurais, que apoiam o clã Shinawatra. Os “amarelos” exigiam a nomeação de um “governo neutro”. Opunham-se a eleições porque Yingluck as venceria graças ao voto rural. Queriam a intervenção dos juízes e dos militares. No dia 7, ocorreu o “golpe judicial”: o Supremo destituiu a primeira-ministra por “abuso de poder”. Agora, os militares concluem a operação.

É uma longa história. A Tailândia foi pioneira na democratização no Sudeste Asiático, na sequência do arranque económico que alargou as classes médias. A última ditadura militar caiu em 1992, após maciças manifestações de estudantes e uma sangrenta repressão militar, a que Bhumibol mandou pôr termo. Seguiram-se eleições e a aprovação da Constituição de 1997. Mas os democratas cometeram um erro: aprovaram o voto universal. 

Foto
Soldados esta semana numa das ruas movimentadas de Banguecoque, a capital CHRISTOPHE ARCHAMBAULT/AFP

O pesadelo das elites de Banguecoque começou nas eleições de 2001. Thaksin, um magnata das telecomunicações, convenceu os pobres e os rurais a usarem o voto para mudarem as suas condições de vida. Fez uma campanha populista e — surpreendentemente — cumpriu as promessas eleitorais: desde um sistema de saúde a empréstimos com baixos juros para os camponeses. A “elite” e as classes médias reagiram mal. Denunciaram a democracia “numérica” e protestaram contra o “roubo” dos seus impostos. 

Em Setembro de 2006, Thaksin é derrubado pelo Exército. Entre 2008 e 2010, a capital torna-se palco de batalhas campais entre “vermelhos” e “amarelos”, perante uma polícia dividida: houve dezenas de mortos. Realizam-se eleições em 2011: Yingluck é eleita triunfalmente. Dois anos depois recomeça a agitação.

Os “amarelos” denunciam a “tirania da maioria” e o voto universal que entrega o poder a “oportunistas e corruptos”. Os “vermelhos” dizem que sem justiça social não há democracia e revoltam-se contra “a arrogância da elite”. Não se prevê um happy end

Sugerir correcção
Comentar