Mesmo que eu quisesse evitar o assunto, não me seria possível. Sempre que digo a alguém que divido o meu tempo entre Lisboa e Berlim, a primeira pergunta que me fazem está relacionada com os skinheads alemães, cujo comportamento é globalmente conhecido. Nunca me cruzei com nenhum, felizmente, e caso me cruzasse faria o que qualquer negro sensato faria: fugia a mil pés. Conheço muitas histórias sobre esse encontros entre diferentes grupos étnicos e neonazis e poucos são os que tiveram um final feliz.
Existe um "manual de sobrevivência" informal que nos é passado pelos solidários berlinenses, quando descobrem que estamos para ficar mais do que um fim de semana e provavelmente nos iremos aventurar para fora do raio do Check Point Charlie e da Brandenburg Gate. Disponibilizam uma lista das coisas a evitar na cidade, e uma das que merece especial atenção é o 1º de Maio, dia dos trabalhadores e também dia escolhido pelos grupos de extrema direita para a sua procissão anual pelas ruas da cidade, com maior foco para zonas como o Mauerpark e Kottbusser Tor, na multicultural Kreuzberg.
Basicamente, o que nos é dito é para sentarmos o rabo em casa e só sairmos no dia seguinte. Assustador, não é? Quando partilho essas histórias com a minha mãe e outros parentes na minha distante e mulata cidade de Benguela, é quase divertido olhar para o olhar incrédulo que me lançam, do tipo “quem no seu juízo normal iria escolher imigrar para um sitio com gente tão xenófoba e violenta?”.
Mas, a verdade é que, ao mesmo tempo que lamentamos o ódio racial e a intolerância que nos é lançada pelos neonazis, skinheads e extrema direita alemã, existe um número infindável de razões que nos/me fazem gostar dos alemães. Admiro-lhes a seriedade e o sentido de responsabilidade e, em muitos casos, a coragem e audácia que demonstram ao combater o racismo, ridicularizando-o e expondo-o, como aconteceu com a campanha lançada pela Laut Gegen Nazis (Loud Against Nazis), uma organização que decidiu escolher outro método de luta contra o Partido Nacional Democrático da Alemanha, conhecido também como NPD, uma organização política com ligações neonazis, conhecida pelas suas posições polémicas no que toca à imigração e ao projeto Europeu.
Através das redes sociais, os pensamentos, palavras de ordem e ataques contra os imigrantes ou alemães de outras etnias são largamente difundidos. Como lutar contra esses ataques carregados de ódio? A agência Jung Von Matt/Elbe, que se juntou à Laut Gegen Nazis, parece ter encontrado a solução ideal: combater essa cultura do ódio com amor, isso mesmo, amor. A agência publicitária, baseada em Hamburgo, juntou umas centenas de residentes no país, imigrantes ou com ascendência estrangeira, com posições contrárias àquelas abraçadas pelo extrema-direita, para inundar as páginas do NPD nas redes sociais com mensagens "fofinhas" e cheias de amor.
Em 48 horas, uma campanha solidária e quase a custo zero, conseguiu juntar mais de 100.000 pessoas que partilharam as mensagens e imagens, celebrando o mais belo dos sentimentos, o amor, e assim promovendo o respeito e a tolerância. Ao chegar a 7 milhões de pessoas, arrastando a atenção dos media, provou-se que o amor não só é a resposta, como é o único caminho realmente eficaz para erradicar o racismo da face da Terra.