Separatistas declaram independência em Donetsk e Lugansk já a sonhar com "Nova Rússia"

Após o referendo de domingo, separatistas começam a tomar decisões. Moscovo disse "respeitar a expressão da vontade das populações" e apelou ao diálogo.

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Uma mulher celebra a vitória do "sim" no referendo em Lugansk DIMITAR DILKOFF/AFP
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Denis Pushilin (de barba) na altura em que foram apresentados os resultados do referendo em Donetsk Konstantin Grishin/REUTERS
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Autoproclamado governador de Lugansk, Valeri Bolotov, no comício em que foi declarada a independência DIMITAR DILKOFF/AFP
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Participantes no comício de Lugansk DIMITAR DILKOFF/AFP
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As armas não desapareceram depois dos referendos DIMITAR DILKOFF/AFP

"Nós, o povo da república popular de Donetsk, declaramos que a república se torna um Estado soberano", declarou Denis Pushilin, um dos líderes dos separatistas daquela região, numa conferência de imprensa onde foram apresentados papéis com os "resultados oficiais" do referendo: 89% dos votos expressos foram a favor da autogovernação de Donetsk.

Mas, logo a seguir à declaração de independência – e tal como aconteceu em Março, na Crimeia–, veio o pedido de entrada na Rússia: "Para restabelecer a justiça histórica, pedimos à Rússia que avalie a possibilidade de uma ligação da república de Donetsk à Federação Russa", continuou Pushilin. "O povo de Donetsk sempre fez parte do mundo russo. Para nós, a história da Rússia é a nossa história", justificou.

O autoproclamado governador de Donetsk, Pavlo Gubarev, deu uma entrevista à televisão Rússia 24 em que, ao congratular-se pelo nascimento da república popular de Donetsk, agarrou no mote da "Nova Rússia": "Esta nova entidade é apenas uma primeira etapa para a construção da 'Nova Rússia', o ex-Leste da Ucrânia."

Em Lugansk, onde os votos expressos no referendo terão alcançado os 96,2% a favor, houve também uma declaração de independência, mas pelo menos por agora não foi feito um pedido de integração na Rússia. Os separatistas desta região anunciaram que querem fazer mais um referendo sobre este assunto. "É à população da república popular de Lugansk que cabe pronunciar-se sobre assuntos desta importância", sublinhou o porta-voz dos grupos armados pró-russos locais, Vassil Nikitin, citado pela AFP.

A pergunta feita no referendo de domingo referia apenas a vontade de "autogovernação" das regiões de Donetsk e Lugansk, e não fazia referência a uma possível adesão à Federação Russa.

Dialoguem, diz Moscovo
A Rússia ainda não comentou estas declarações vindas do Leste da Ucrânia. Antes, numa declaração cuidadosa, tinha afirmado respeitar os resultados do referendo nas regiões de Donetsk e Lugansk, mas sem dar indicações de querer anexar o território, como aconteceu na península da Crimeia.

A ênfase é posta no diálogo: "Em Moscovo, respeitamos a vontade do povo das regiões de Donetsk e de Lugansk, e contamos que o resultado do referendo seja aplicado no terreno de uma forma civilizada, através do diálogo e sem a repetição da violência", disse o ministro dos Negócios Estrangeiros, Sergei Lavrov.

O cuidado na linguagem usada no comunicado da diplomacia russa foi notado pelo presidente em exercício da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE), o suíço Didier Burkhalter. "A resposta da Rússia exprime respeito, mas não o reconhecimento do referendo. Não é, portanto, um reconhecimento dos resultados, e isso é que é importante", disse Burkhalter, que se reuniu na semana passada com Vladimir Putin.

Mas, paralelamente, Moscovo ameaçou cortar o fornecimento de gás à Ucrânia a partir de 3 de Junho, se Kiev não passar a pagar a sua factura adiantadamente. A dívida ucraniana à Gazprom disparou de cerca de 2000 milhões de dólares (1,4 mil milhões de euros) em Março para 22 mil milhões de dólares (16 mil milhões de euros), quando a Rússia deixou de vender gás natural com desconto a Kiev e accionou uma série de outras cláusulas após ter anexado a Crimeia.

"Eles têm dinheiro. Sabemos que a Ucrânia recebeu dinheiro ao abrigo da primeira tranche do empréstimo do Fundo Monetário Internacional", no valor de 3,2 mil milhões de dólares (2,3 mil milhões de euros), desbloqueados na semana passada, disse o primeiro-ministro russo, Dmitri Medvedev.

Ainda assim, o presidente em exercício da OSCE disse ainda que acredita na "vontade" de todas as partes – incluindo Moscovo – de encetarem "um diálogo" para solucionar a crise na Ucrânia. “O maior desafio é o tempo. Não temos tempo a perder”, afirmou.

Mas as esperanças do presidente da OSCE não foram suficientes para que a União Europeia (UE) recuasse nas sanções. Em Bruxelas, os ministros dos Negócios Estrangeiros da UE decidiram incluir mais 13 nomes na lista de 48 indivíduos visados pelo congelamento de bens e pela proibição de entrada no espaço europeu. E Herman an Rompuy, o presidente do Conselho Europeu, de visita a Kiev, declarou os referendos como “ilegítimos”.

Em Washington, a Casa Branca e o Departamento de Estado afinaram o tom com a mesma mensagem: os Estados Unidos não reconhecem os "referendos ilegais" no Leste da Ucrânia e descrevem-nos como tentativas para criar mais divisões e desordem no país. "Estamos desapontados por ver que o Governo russo não usou a sua influência para impedir estes referendos", disse o porta-voz da Casa Branca Jay Carney.

Kiev contra a "farsa"
Da capital ucraniana chegaram várias declarações de condenação, com destaque para as palavras do Presidente interino, Olexandr Turchinov, que chegou ao poder após a deposição de Viktor Ianukovich, na sequência dos violentos protestos na Praça da Independência.

"A farsa a que os terroristas chamam referendo não é mais do que uma cobertura de propaganda para os assassinatos, os sequestros e outros crimes graves", declarou Turchinov. As autoridades interinas de Kiev "vão manter o diálogo com aqueles que no Leste da Ucrânia não têm sangue nas mãos e que estão prontos a defender os seus objectivos de forma legal", disse o Presidente interino ucraniano.

Para a generalidade dos observadores internacionais, a consulta popular é ilegal, em primeiro lugar, porque a Constituição ucraniana não prevê a realização de referendos locais. Depois, porque foi organizada e verificada apenas por separatistas pró-russos, e com base em listas eleitorais de 2012. Os boletins de voto também são considerados ilegais de acordo com os padrões internacionais, já que foram meramente fotocopiados e não certificados por uma comissão de eleições reconhecida por todas as partes.

Apesar disso, as fotografias das agências internacionais e as imagens das estações de televisão mostram filas enormes à entrada dos locais de voto. À falta de uma verificação independente, não é possível perceber quantos eleitores depositaram um boletim nas urnas, mas os separatistas dizem que a afluência chegou aos 74,87% em Donetsk e aos 81% em Lugansk.

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