Cinco trabalhadores, cinco vidas, muitas preocupações

No Porto, o PÚBLICO ouviu as histórias de diferentes pessoas que saíram à rua no 1.º de Maio.

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João Vieira, reformado Paulo Pimenta
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Diana Rede, precária com mestrado Paulo Pimenta
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Graça Nogueira, desempregada e sem perspectivas Paulo Pimenta
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Artur Gonçalves, trabalhador por conta de outrem Paulo Pimenta
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Cândido Oliveira, ex-funcionário dos CTT Paulo Pimenta

João Vieira, reformado, sente-se injustiçado
João Vieira está reformado desde 2010. Aos 69 anos, e com uma reforma de 372 euros mensais, conta que se não fosse a ajuda da pensão de viuvez que recebe pela morte da mulher não viveria com dignidade. “Provavelmente andaria aí a pedir na rua, como muitos”, lamentou. João estudou até à 4ª classe e dedicou quase toda a vida à ourivesaria. “Também fui serralheiro durante uns tempos, mas depois voltei à antiga profissão”. Ourives ou serralheiro, João descontou durante 42 anos para a Segurança Social e sente-se agora injustiçado com o pouco que recebe. “Ainda fui militar em Angola”, lembra João, com alguma mágoa – “agradecem-me com 100 euros por ano”. João sente que os reformados e pensionistas estão a ser os mais injustiçados com os cortes impostos pelo Governo, e “enganados” com o pagamento em “duodécimos”. “E parece que agora vou ter de pagar sempre uma tal contribuição de solidariedade”, desabafa João, ainda inseguro quanto aos efeitos que as medidas anunciadas na quarta-feira pelo Governo terão na sua vida.

Diana Rede, precária com mestrado
Diana Rede tem 28 anos e ainda não teve o seu primeiro emprego. Trabalha a recibos verdes a dar explicações, actividade que lhe rende cerca de 200 euros por mês. É licenciada e mestre em Engenharia química e há dois anos que está inscrita no Instituto de Emprego e Formação Profissional, elegível para estágio profissional. Para Diana, assim como para muitos outros jovens em Portugal, as oportunidades teimam em não surgir. “Comecei a mandar currículos ainda antes de terminar o mestrado e, na altura, ainda fui a algumas entrevistas. Agora, já nem entrevistas se fazem”. Diana sente-se frustrada por, aos 28 anos, se encontrar numa situação de total dependência financeira que não lhe permite sair de casa dos pais. Confrontada com a hipótese de sair do país para trabalhar, explica que, em engenharia química, como em muitas outras áreas, “pedem licenciados com experiência, mas não deixam trabalhar para ganhar experiência”. O que também é um entrave para quem quer emigrar.

Graça Nogueira, desempregada e sem perspectivas
Com 53 anos de idade e 30 de trabalho, Graça Nogueira está desempregada há três anos. Licenciada em Línguas e Relações Internacionais, já trabalhou em secretariado e como professora, mas neste momento diz não ter perspectivas futuras. Recebe mensalmente 409 euros do Rendimento Social de Inserção, que são vitais para sustentar uma família em que o marido também está desempregado (há cinco anos) e o filho, de 23 anos, não estuda, nem trabalha. “O meu filho estava na faculdade, mas deixou de estudar, porque não havia perspectivas futuras e a situação financeira não permitia”. Graça admite que a mãe é que vai ajudando a suportar as despesas mensais. Mostra-se completamente indignada com a situação actual e a postura do Governo em relação aos desempregados. “Estou inscrita no centro de emprego e estão sempre a chamar-me para formações”. Graça concorda que aprender é importante, mas garante que a iniciativa é só uma forma “de ocultar a realidade e retirar muita gente das estatísticas do desemprego”.

Artur Gonçalves, trabalhador por conta de outrem
Artur Gonçalves é empregado de armazém. Aos 38 anos, casado e com dois filhos de cinco e oito anos, mostra-se muito receoso em relação ao futuro. Artur conta que nos últimos dois anos, devido à crise, a sua empresa já se viu obrigada a despedir cinco trabalhadores e “nunca se sabe quem será o próximo”, diz. Artur confessa que apesar de se sentir contente por manter o posto de trabalho, nos últimos três anos já sofreu cortes no salário que rondam os 100 euros, numa altura em que “o custo de vida está a aumentar” e que as dificuldades são cada vez maiores. Confrontado com as medidas recentemente anunciadas pelo Governo, acredita que só vão piorar a situação dos que já levam a vida com muito esforço. “O que mais me preocupa são os meus filhos”, confessa. Artur deixa ainda clara a opinião de que, no actual cenário, funcionários públicos e trabalhadores privados sofrem da mesma forma: as “dificuldades que são para todos”.

Cândido Oliveira, ex-funcionário dos CTT
Cândido Oliveira, de 52 anos, foi funcionário público nos Correios de Portugal (CTT) até ao final do ano passado, altura em que a empresa foi privatizada. Cândido explica que, antes do processo de venda de acções, foi feita uma proposta de saída a alguns funcionários, “obedecendo a condições muito específicas”, mas poucos aceitaram. Esta situação, “que há uns anos atrás era impensável nos CTT”, é um reflexo da crise do Estado e da austeridade imposta pelo Governo e pela troika de credores internacionais, acredita o ex-funcionário público. A administração dos CTT, contou ao PÚBLICO, prometeu muita coisa que depois não se verificou. “Diziam que depois da privatização os salários iam subir” e não foi o que aconteceu. “É verdade que nunca nos cortaram no salário-base mas, com a incidência tão grande de impostos, sentimos muitas dificuldades”, explicou Cândido. O ex-funcionário público lembra que o Estado ainda detém 31% de participação nos CTT e acusa a administração da empresa de estar mais preocupada com os accionistas do que com os trabalhadores.

Editado por Hugo Daniel Sousa e Leonete Botelho

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