"Angariei pessoas a quem o dinheiro custou muito a ganhar”
Testemunhos mostram como uns ganham e outros perdem. Quanto maior for a rede de pessoas que se traz para o negócio, mais avultadas serão as comissões recebidas.
“Chegou a um ponto em que praticamente toda a gente tinha contas. Tornou-se muito apelativo, porque havia histórias de muita gente a ganhar muito dinheiro”, conta ao PÚBLICO por telefone a partir da Madeira. Circulavam informações sobre pessoas que tinham comprado apartamentos e barcos, ou outras que tinham contratado desempregados só para gerirem as contas da Telexfree. Também se ouviam histórias de quem tinha pedido empréstimos bancários para aderir ao esquema. “Infelizmente, entrei tarde. Vi toda a gente a entrar, toda a gente a ganhar dinheiro. Quando se entra mais para o fim, ninguém sabe quando vai estoirar…”
Cada um dos "colaboradores" que entrava na Telexfree recebia o produto da empresa: uma aplicação para chamadas através da Internet, não muito diferente do Skype. Em teoria, o trabalho das pessoas com uma conta no site era colocar, em sites, cinco anúncios por dia a este serviço. Por esta tarefa, a empresa pagava cem dólares semanais. O dinheiro podia ser reclamado quando a pessoa chegasse aos 300 dólares e era transferido por um sistema de pagamentos electrónicos para a conta bancária. O processo demorava umas três semanas, diz Raquel. Recrutar participantes dava direito a um bónus de cem dólares e a uma parte dos ganhos dos recrutados. Quanto maior for a rede de pessoas que se tem no nível abaixo, maiores as comissões recebidas.
Apesar dos processos judiciais, Raquel diz que “a empresa sempre foi muito correcta com as pessoas” e que o problema foi o facto de “os madeirenses e os portugueses não terem sabido aproveitar a oportunidade”. E considera que, se as pessoas não tivessem criado múltiplas contas e tentado contornar “as regras do jogo”, ainda hoje a Telexfree estaria em funcionamento. Agora, não tem esperança de recuperar o dinheiro e diz estar preocupada sobretudo com as pessoas que convenceu a abrirem contas. “No meu caso, a vida continua. Mas angariei pessoas a quem o dinheiro custou muito a ganhar.”
Liliana e Teresa* foram das que entraram recentemente na Telexfree e não tiveram tempo de reaver o dinheiro. Ambas de Lisboa e professoras de Educação Física, dizem não ter entrado assim que tiveram conhecimento do esquema. “Ninguém acredita em dinheiro fácil, esperámos para ver pessoas que conhecemos retirar dinheiro de lá. E isso aconteceu.”
As duas contam como, em Portugal, há grupos no Facebook e sistemas de chat para aliciar pessoas e esclarecer dúvidas dos interessados. E há as que, conhecidas como “líderes”, abrem muitas contas. Frequentemente, estas pessoas recebem de outros o dinheiro para abrir contas, poupando assim os recém-chegados ao trabalho de usar o sistema de pagamentos electrónicos. (*os nomes são fictícios) Testemunhos recolhidos por João Pedro Pereira