Alberto João Jardim, A Voz da Madeira em defesa do regime deposto em 1974

O actual presidente do Governo Regional declarou-se apoiante de Salazar e Marcello Caetano e chamou "bombista" a Francisco Sá Carneiro.

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Américo Tomás na última visita oficial à Madeira em Setembro de 1973 DR

“A Nação não pode imaginar, numa altura grave em que se lhe pede sacrifícios, o triste cisma entre correntes que têm responsáveis e das quais, indistintamente, espera soluções que tornarão melhor o amanhã”, escreveu Jardim em 1973, em apoio dos princípios da governação definidos por Marcello Caetano.“É, pois, esta época decisiva, a menos própria para que aquela conjugação de ideias, com o acesso ao poder do actual chefe do Governo [Marcello Caetano], se venha a cindir ou enfraquecer.”

Jardim apontou a realização do congresso de “forças políticas adversas ao Governo”, realizado sob vigilância policial em Aveiro, para “demonstrar” que “não vivemos na tal férrea ditadura que estrangeiros e portugueses por aí propagam”, mas numa “evolução política que, prudentemente, trilhamos, na aproximação dos países com maiores tradições cívicas”, países estes “onde, se também houver, como em Aveiro, manifestações não autorizadas e com distúrbios, as forças policiais intervêm”.

Ao comentar uma das Conversas em Família de Caetano na RTP, dedicada às “relações capital-trabalho”, Jardim escreveu a 13 de Fevereiro de 1974, dois meses antes da Revolução, que “por muito chocante que tal maneira de pensar seja para os que se julgam 'progressistas', a greve constitui um mal comunitário. Somos, pois, pela ilegalidade da greve”.

Antes de se confessar adepto da “evolução na continuidade” de Caetano, Jardim mostrou ter grande apreço pelo seu antecessor. “Digno sucessor da escola de Sagres que é o prof. dr. Oliveira Salazar, o nosso inteiro apoio e admiração ao que tem feito para bem da Pátria", afirmou a 3 de Maio de 1961, na Liga 28 de Maio, em Lisboa, numa sessão comemorativa do 33.º aniversário da entrada de Salazar para o Governo.

Em A Voz da Madeira, nos três anos que antecederam o golpe militar e a sua posterior nomeação pelo bispo Francisco Santana para director do diocesano Jornal da Madeira, Jardim mostrou ter ideias claras sobre o Ultramar. “A ideia portuguesa de Nação pluricontinental não se arreda das concepções democráticas. (...) Negociar com terroristas é impossível (...), seria antidemocrático partilhar o território nacional com bandos terroristas, num inventário ignominioso, após, nas últimas eleições, o próprio eleitorado ultramarino se ter manifestado esmagadoramente pela continuação dos laços da nacionalidade. Isto é que é a autodeterminação, e não as palhaçadas neocoloniais montadas pelas grandes potências”, escreveu na edição de 31 de Janeiro de 1973.

Poucos dias antes passara à disponibilidade como oficial miliciano, depois de ter sido poupado à mobilização para África e colocado no Quartel-General da Madeira desde 1970, como especialista em Acção Psicológica.

No artigo publicado no dia 28 de Maio de 1973, Jardim assinalava assim a efeméride: “Passaram quarenta e sete anos sobre o golpe de Estado, prefácio do regime instituído pela Constituição de 1933. Pronunciamento militar de nenhum modo ainda o triunfo do Integralismo Lusitano. Fundamentalmente uma reacção viril, sã e coerente de uma consciência viril, sã e coerente que se propunha extirpar a incompetência e a corrupção que maculavam a vida do país. (…) O confronto honesto do positivo e do negativo realizado, embora sempre subjectivo, permite a conclusão de que o regime serviu o País.”

É também dessa altura um episódio recordado pelo co-fundador do PPD Magalhães Mota (Vida Mundial, 2/98), a propósito da discussão na Assembleia Nacional entre Miller Guerra e o salazarista Casal Ribeiro. Na sequência da vigília da Capela do Rato, Sá Carneiro — outro dos liberais em ruptura com Marcelo Caetano, criticado por Jardim no artigo “Cisões inoportunas” — intrometeu-se no debate parlamentar sobre a guerra colonial e as bombas.

Depois da discussão, conta Magalhães Mota, “surge um editorial num jornal madeirense assinado por um senhor chamado Alberto João Jardim e com o título ‘A ANP ou a bomba’. Escrevia ele que não havia qualquer hipótese de terceira via, que só havia duas escolhas possíveis, ou era a da ANP ou a da bomba, e quem, como Francisco Sá Carneiro, que era directamente designado pelo nome, não queria ser da ANP, era bombista com certeza. O Sá Carneiro ficou muito melindrado com o artigo, mas, entretanto, chegou correspondência da Madeira a explicar-lhe que não ligasse ao escrito porque o rapaz que o assinava era tontinho e que só escrevia nos jornais porque era sobrinho de um senhor deputado local”, assinala Magalhães Mota.

Composto e impresso na mesma gráfica do Comércio do Funchal, a tipografia Minerva, o semanário A Voz da Madeira era o órgão oficial da União Nacional dirigido pelo médico Agostinho Cardoso, deputado da UN/Acção Nacional Popular, e tio do actual presidente do governo regional. Este periódico, tal como o Diário de Notícias e o Jornal da Madeira — dirigidos, respectivamente, pelo advogado Alberto Araújo e pelo cónego Agostinho Gonçalves Gomes, igualmente deputados na Assembleia Nacional —, não estava, por isso mesmo, sujeito ao “exame prévio” da censura.

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