Tsipras quer perdão da dívida de Portugal e Grécia semelhante ao dado à Alemanha em 1953

Candidato do Partido da Esquerda Europeia à presidência da Comissão Europeia reuniu-se neste sábado com Mário Soares no Porto e criticou as políticas de austeridade.

Foto
O mais novo candidato à presidência da Comissão Europeia encontrou-se com Mário Soares no Porto Ricardo Castelo

O encontro com Soares na Biblioteca Almeida Garrett do Porto, onde o ex-Presidente da República acabara de participar numa conferência sobre o 25 de Abril, decorreu na presença do coordenador do Bloco de Esquerda João Semedo e da eurodeputada Marisa Matias, a cabeça de lista do BE às eleições europeias. No Parlamento Europeu, o BE integra o Partido da Esquerda Europeia, que propõe Tsipras, líder da coligação de partidos gregos de esquerda Syrisa, para a presidência da Comissão Europeia.

Os jornalistas não assistiram à conversa e Mário Soares não prestou declarações sobre o encontro, mas não é arriscado supor que os dois políticos – um nascido em Julho do ano em que Portugal fez a Revolução dos Cravos e outro à espera de Dezembro para comemorar 90 anos – terão convergido na crítica das políticas de austeridade impostas a Portugal e Grécia.

“Foi uma honra para mim ter-me reunido com uma personalidade emblemática da social-democracia europeia, com um estadista marcante da esquerda portuguesa e não só. Discutimos a situação actual nos nossos países e concordámos que a única saída é parar com a austeridade e reconquistar a democracia, nos nossos países e em toda a Europa”, disse Tsipras.

O dirigente político que no ano passado defendeu “uma Primavera Mediaterrânica” espera ver nas europeias de  Maio as andorinhas que prenunciam esse sobressalto político. “Acredito que a única forma de ultrapassarmos a crise actual é os nossos povos votarem contra as forças políticas que apoiam as medidas de austeridade. Após quatro anos consecutivos de austeridade na Grécia e Portugal, mas também em Espanha e Itália, a situação deteriorou-se ainda mais, e agora estamos a braços com uma crise humanitária nos nossos países”.

Por isso, defendeu o político grego, horas antes de participar num comício do BE com Marisa Matias no Porto, é preciso “alterar a relação de forças nas próximas eleições europeias”. “Sabemos que na Grécia é possível termos uma grande vitória das forças de esquerda, pela primeira vez na nossa história política, o que significa que teremos desenvolvimentos vindos daí. Claro que o nosso objectivo é ganhar, além das europeias, as próximas legislativas na Grécia e formar um governo de esquerda (…) Isso terá um ‘efeito dominó’, que levará a mudanças quer na Grécia quer em toda a periferia do Sul da Europa”, previu.

De resto, Alexis Tsipras não acredita que a conclusão dos programas de assistência e a partida dos “homens dos fatos escuros da troika” signifique  o fim do “drama” de Portugal e Grécia. E alerta que o problema não se resume aos memorandos celebrados pelos governos destes países com a troika, porque, na sequência deles, foi implantado um regime de austeridade destinado a vigorar durante “anos e anos”. “Não será fácil esmagar esse establishment, mas só com o voto do povo poderemos tentar fazê-lo”.

Alexis Tsipras não se diz contra a Europa, mas apenas contra a“Europa das forças políticas conservadoras e do poder dos mercados financeiros e dos bancos”. “Acreditamos na Europa dos povos e na reconquista dos valores fundacionais da coesão social e da solidariedade”, sublinha.

E para o líder da coligação Syrisa, essa solidariedade tem que passar por um perdão de dívida nos casos da Grécia e Portugal. “Não há outra alternativa senão tentar renegociar a nossa dívida em conjunto, numa cimeira europeia como a Conferência [de Londres, a de 27 de Fevereiro] de 1953, que perdoou grande parte das dívidas da Alemanha após a II Guerra Mundial. Isso não seria apenas bom para os países endividados, mas para toda a Europa e é a única saída realista”, acrescentou Tsipras, para quem já nem merece a pena falar de eurobonds e mutualização da dívida: “Já é uma discussão velha, agora precisamos de soluções mais radicais”.

Antes, noutra sala da Biblioteca Almeida Garrett, Mário Soares acusara o Governo e o Presidente da República de preferirem o 28 de Maio ao 25 de Abril e elogiou o Papa Francisco, por este "lutar pelos pobres" e por dizer que "a austeridade mata". "A austeridade que estamos a ter mata. É certo que as pessoas protestem", disse o socialista.