Novo 25 de Abril? Não com militares

Isso mesmo defendeu o coronel Carlos Matos Gomes no painel “Militares na rua e no poder” da conferência A Revolução de Abril, que decorre até quarta-feira no Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa, e foi corroborado depois por Vasco Lourenço ao PÚBLICO.

“Não é possível pensar numa intervenção militar” para mudar o país neste momento. “Os militares são profissionais. Se vierem para a rua é para cumprir a ordem do Governo que estiver no poder”, afirmou Carlos Matos Gomes.

Vasco Lourenço acrescentou, em tom crítico, que “já há legitimidade [dos militares] para correr com esses tipos que estão no poder; não há é condições. Eles [o Governo] têm legitimidade democrática e eleitoral; perderam foi a legitimidade política por completo. Face ao comportamento que têm tido já não têm qualquer legitimidades política. E quando digo ‘eles’, digo o Presidente da República e o Governo.”

O presidente da Associação 25 de Abril diz ser necessário “vencer o medo” e, por isso, foi lançado esse lema para as comemorações. Porque “a população está com medos profundos - de perder o emprego, a pensão, a reforma. Porque estes fulanos conseguiram, de facto, instalar o medo na população".

Ao PÚBLICO, Vasco Lourenço foi depois mais resignado. “Não há condições como havia em 1974 para os militares terem a atitude que tiveram. Não estamos em ditadura, estamos formalmente em democracia, não temos guerra, as forças armadas são de outro tipo. É natural”, diz. “Hoje, nos militares, não há ainda motivação, no futuro sabe-se lá.” Mas o coronel não acredita em tal cenário. “A escapatória [da crise política e social] tem que ser dentro do mapa democrático e tem que ser o povo a fazê-la. Tem que ser o povo a impor a saída destes fulanos do poder. Não se pode pensar numa solução feita por militares. Essa solução está fora de causa.”

Os três militares que intervieram na conferência – além de Lourenço e Matos Gomes, esteve Martins Guerreiro - confluíram numa teoria: os militares fizeram o golpe para a sociedade e nunca para ficarem com o poder, ainda que tenha havido cisões e alianças de militares em diferentes grupos, como o caso do Documento dos Nove, dos chamados gonçalvistas ou do Copcon.

Vasco Gonçalves diz que os militares “avançaram para o 25 de Abril a pensar em valores e não em interesses” particulares. O que levou a que não se organizassem “para a conquista do poder, para o dia seguinte, e obrigou alguns a lutar contra os oportunismos e os vira-casacas que tentaram assaltar o poder”.

Foi nesse ponto que o Conselho da Revolução e o pacto MFA-partidos tiveram um papel fundamental: o de tentar reorganizar um Estado em que o poder foi ceifado de um momento para o outro e que precisava de novas coordenadas, diz o coronel. Carlos Matos Gomes havia de classificar o PREC como “um tempo entre marés: o velho poder ainda não acabara, o novo ainda não se implantara”.

“Os militares são os pais do estado democrático, da democracia e do Estado de direito que existe em Portugal. Tivemos a sabedoria de não nos isolarmos da sociedade”, auto-elogiou-se Vasco Lourenço. O antigo capitão de Abril haveria de rejeitar, zangado, as "provocações" de alguém da plateia que falou em ligações dos militares que organizaram o golpe do 25 de Abril à CIA ou ao KGB.

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