Rebeldes do Sudão do Sul mataram centenas em “massacre étnico”

Quando os homens que combatem o Presidente Kiir entraram em Bentiu separaram os civis por etnias e mataram os membros da comunidade rival.

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Soldados do Sudão do Sul nas ruas de Bentiu antes dos últimos ataques Simon Maina/AFP

As forças pró-Machar atacaram a cidade de Bentiu, capital do estado petrolífero de Unité, e mataram mais de 200 pessoas só numa mesquita; depois seguiram para uma igreja, uma base abandonada da ONU e um hospital, afirma a Missão das Nações Unidas no Sudão do Sul (UNMISS).

Quando as tropas do ex-vice-presidente, afastado em 2013 depois de ter sido acusado de planear um golpe de Estado, “tomaram Bentiu, dirigiram-se a um certo número de locais onde centenas de civis sul-sudaneses e estrangeiros tinham encontrado refúgio e mataram centenas destes civis depois de terem estabelecido a sua pertença étnica ou a sua nacionalidade”, descreve num comunicado a missão da ONU.

O conflito sectário que lá levou mais de um milhão de pessoas a abandonar as suas casas desde Dezembro opõe Salva Kiir, de etnia dinka, aos apoiantes de Machar, membro da minoria nuer. Em Bentiu, os atacantes separaram os sul-sudaneses não nuer e os estrangeiros para serem mortos.

“No hospital de Bentiu, os homens, mulheres e crianças nuer também foram mortos porque se esconderam e recusaram juntar-se aos outros nuer que celebravam a entrada” das forças rebeldes na localidade. “Pessoas de outras comunidades sul-sudanesas, assim como habitantes da região do Darfur foram especificamente visados e mortos no hospital”, diz a UNMISS. Machar acusa os rebeldes do Darfur, que combatem as tropas do Sudão, de colaborarem com as forças de Kiir.

Quando entraram na igreja católica e na base abandonada do Programa Alimentar Mundial, onde vários civis tinham procurado refúgio, os rebeldes pediram igualmente às pessoas para revelarem a sua origem étnica e a sua nacionalidade, matando várias. A UNMISS denuncia ainda que desde que os homens de Machar ocuparam Bentiu a rádio local tem difundido “apelos ao ódio” de alguns chefes tribais, que incitam as pessoas a capturem membros de certas comunidades ou a violar as mulheres.

O think tank International Crisis Group descreve num relatório recente “níveis terríveis de crueldade contra civis” no Sudão do Sul e diz que “as forças de manutenção de paz estão largamente ultrapassadas em poder face a milhares de soldados e milicianos bem armados”.

No dia 18, 350 homens armados atacaram uma base da ONU na cidade de Bor e mataram 58 civis, num ataque a que o Conselho de Segurança chamou “crime de guerra”. A ONU tem uma força de manutenção de paz de 8500 membros no Sudão do Sul.

Os combates começaram em Dezembro na capital do novo Estado, Juba, e têm-se alargado a outras zonas do país. Mais de 30 mil pessoas estão refugiadas em condições terríveis em duas bases da ONU em Juba e só na base da organização de Bentiu há outras 12 mil pessoas escondidas. Ao todo, há quase 70 mil habitantes refugiados em instalações da ONU em todo o país.

As divergências entre Kiir e Machar começaram na guerra civil sudanesa contra Cartum (1983-2005), que acabou por permitir a independência do Sudão do Sul, em Julho de 2011. Os dois homens eram então altos dirigentes da rebelião do Sul.

“É difícil de acreditar que até há poucos meses o Sudão do Sul estava em paz”, disse à Al-Jazira Toby Lanzer, principal responsável humanitário da ONU no Sudão do Sul. 

“Com este discurso de ódio e a violência a continuar como até aqui, vamos ter uma catástrofe ainda maior entre mãos antes do fim do ano”, antecipa Lanzer . Nas bases da ONU, já só há um litro de água por dia por pessoas e não pára de aparecer gente em fuga, “membros de todas as comunidades, mesmo os que são acusados destes crimes”.  

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