Faltam médicos nas VMER porque pagam cada vez menos à hora, diz bastonário
Bastonário da Ordem dos Médicos diz que este trabalho de "altíssimo risco" é mal pago. Ministério assegura que o falecimento de duas pessoas, em Évora, ficou a dever-se à violência do acidente e não à inoperacionalidade da VMER.
Referindo-se ao caso da VMER de Évora, que no domingo não pôde socorrer duas vítimas de um acidente de viação, as quais foram transportadas para o hospital pelos bombeiros e acabaram por morrer, José Manuel Silva recorda que “já há alguns meses” a OM pediu à Inspecção-Geral das Actividades em Saúde (IGAS) para apurar “o que se passa com esta viatura”. Em Dezembro, a VMER de Évora estava também inoperacional quando um acidente de viação vitimou quatro pessoas. No domingo, a razão avançada para a paragem da viatura foi a de que o médico que devia trabalhar faltou por motivos de saúde.
Num esclarecimento entretanto emitido, o Ministério da Saúde (MS) veio defender que o falecimento das duas vítimas do acidente de viação, na região de Estremoz, “ficou a dever-se, comprovadamente, à violência do acidente” e não à inoperacionalidade da VMER do Hospital Espírito Santo em Évora. “O socorro foi prestado com os meios mais rápidos disponíveis e com grande celeridade”, enfatiza o MS, já depois de ter sublinhado que, “quando se verifica qualquer inoperacionalidade da VMER, são sempre accionados meios alternativos que asseguram o socorro em conformidade com os protocolos há muito existentes e testados”.
A Inspecção-Geral das Actividades em Saúde já abriu um processo de averiguações "sobre a inoperacionalidade das VMER", acrescenta o ministério.
O bastonário da OM lembra que o problema da inoperacionalidade das VMER não é de agora nem é exclusivo de Évora. Há problemas noutras VMER, na de Torres Vedras e na Guarda, exemplifica. “Está a acontecer um pouco por todo o país e não é por falta de médicos. O problema é que os hospitais, que foram obrigados a receber as VMER sem um orçamento acrescido, estão em ruptura financeira e tentam poupar em tudo”, sustenta.
José Manuel Silva avança, a propósito, com o exemplo do hospital de Gaia, que “há alguns meses propôs pagar aos médicos da sua VMER 12 euros brutos à hora e sete euros brutos à hora aos enfermeiros, o que, descontados os impostos, dava metade”. “Quem é que está disposto a arriscar a vida por estes preços? Este é um trabalho de altíssimo risco”, nota.
No mesmo sentido, o vice-presidente da Ordem dos Enfermeiros, Bruno Noronha, ouvido pela Rádio Renascença, queixou-se da diminuição do valor pago aos profissionais das VMER e considerou também que esse factor poderá estar na origem dos problemas acrescidos de falta de tripulantes.
“Houve uma redução recentemente na ordem dos 20% em algumas unidades do valor/hora, o que não motiva as pessoas a, para além da sua escala normal (das 40 horas que fazem no serviço), ainda fazerem mais aqueles turnos da VMER”, disse. Bruno Noronha explicou que as escalas das VMER já tiveram vários modelos de organização. No princípio, dispunham da escala dos profissionais e faziam a gestão, mas, a certa altura, "o INEM transferiu para as unidades de saúde essa responsabilidade da gestão dos recursos humanos e colocou muitas das viaturas nas urgências dos próprios hospitais e é por causa disso que há diferentes tipos de organizações das escalas de pessoal”, explica.
O presidente da Administração Regional de Saúde do Alentejo, José Robalo, citado pela Rádio Renascença, negou que as falhas na emergência da região se fiquem a dever a motivos financeiros, mas reconheceu que faltam profissionais com formação específica para dar resposta às situações de emergência.
Esta terça-feira, Álvaro Beleza, do secretariado nacional do PS, reclamou, em conferência de imprensa, que seja imediatamente apurado o estado de funcionamento dos serviços de emergência médica no país.
Na reacção, o MS sustenta que, no passado dia 15 de Janeiro, o PS visitou o INEM, tendo então tomado conhecimento “de tudo o que este serviço faz e planeia fazer a curto, médio e longo prazo”. Reiterando os dados supostamente fornecidos ao PS, o MS lembra que 2013 foi o ano em que se registou o maior número de saídas dos meios do INEM. “Nos últimos dois anos (2012 e 2013), a inoperacionalidade das VMER diminuiu 40%”, sustenta ainda o MS, para recordar que, durante a governação socialista, a inoperacionalidade daqueles meios tinha aumentado 4%, “o que demonstra que o anterior Governo socialista ficou muito aquém do desejável”.
Voltando a 2013, o MS alega que a inoperacionalidade global das VMER foi de 4,1%, ou seja, registou-se uma operacionalidade de 95,9%; 18 daquelas viaturas tiveram uma operacionalidade superior a 99%, enquanto sete chegaram mesmo aos 99,9%.
Apesar disso, o MS reconhece que a mais baixa operacionalidade entre as VMER registou-se precisamente no Hospital Espírito Santo, em Évora, com 88,2%.
Segundo a agência Lusa, esta terça-feira a VMER de Évora está outra vez parada, agora até às 16h00, novamente por falta de profissionais.
Já no ano passado, a OM denunciara que a VMER do Hospital de Évora estava inoperacional “em 40% a 50% dos turnos”, deixando os cidadãos do distrito “sem nenhum meio qualificado de emergência médica pré-hospitalar”. Isto é “desumano e intolerável”, considerava então a ordem, em comunicado.
Reconhecendo as dificuldades que a gestão das 42 VMER suscita aos hospitais, o MS diz-se determinado a “desenvolver medidas para melhorar o sistema de socorro”, tendo por isso em finalização um diploma que definirá as competências de cada serviço hospitalar de urgência. “Em breve será publicado um despacho a regular a relação das equipas de VMER com cada hospital”, conclui o MS.