Autoridades portuguesas vão poder ordenar escutas em outros países da UE e vice-versa
Directiva foi aprovada no Parlamento Europeu há dias, mas ainda deverá demorar anos a entrar em vigor.
O objectivo da directiva aprovada há dias pelo Parlamento Europeu (com 467 votos a favor, 22 contra e 10 abstenções) é facilitar as investigações penais transnacionais, em crimes como o terrorismo, o homicídio, o rapto, o tráfico de droga, a corrupção, as redes de pedofilia e o tráfico de pessoas, entre outros. O novo mecanismo ainda está longe de estar operacional, já que terá de passar pelo crivo do Conselho da UE e de ser publicado no jornal oficial da UE. A partir dessa data, os Estados-membros terão três anos para transpor a directiva. Mesmo assim, esta aprovação constitui um marco importante na cooperação judiciária entre países da UE, pondo um ponto final num processo negocial difícil, que durou cerca de três anos.
A determinação de prazos para a análise dos pedidos, que serão realizados através de formulários-padrão, é uma das novidades deste instrumento. A aceitação ou não do pedido de obtenção de provas deverá ser feita no prazo de 30 dias. Se merecer a concordância das autoridades judiciais do país receptor, a medida de investigação deverá ser executada num máximo de 90 dias. Se não for possível cumprir estes prazos, a autoridade que deve executar o pedido terá de informar o Estado de emissão dos motivos do atraso. “A decisão relativa à aceitação bem como a execução efectiva da medida de investigação deverão ocorrer com a mesma celeridade e prioridade que em processos nacionais similares”, determina a directiva aprovada na quinta-feira passada.
“Casos mediáticos como os de Madeleine McCann ou o Freeport, para dar dois exemplos que envolveram dois países – Portugal e a Inglaterra – teriam desde logo beneficiado desta directiva pela menor complexidade administrativa e burocrática que assegurará”, afirmou num comunicado Nuno Melo, o eurodeputado do CDS que foi relator desta proposta.
Actualmente, já existem mecanismos de cooperação judiciária entre países, mas estes estão dispersos por vários diplomas, são diferentes de Estado para Estado e dependem, por vezes, de acordos bilaterais. Esta directiva uniformiza as normas dentro da UE e define as regras de funcionamento dos pedidos de obtenção de prova.
Mandado europeu "foi um fracasso"
Em Dezembro de 2008 foi aprovada uma decisão-quadro que criou o mandado europeu de obtenção de provas que regulava a obtenção de objectos, documentos e dados para utilizar no âmbito de processos penais. Mas o facto de este instrumento só ser aplicável aos elementos de prova já existentes e de não ter sido transposto para as legislações nacionais ditou o seu insucesso.
“Foi um fracasso”, resume o procurador Jorge Costa, especialista em cooperação judiciária. O magistrado considera esta directiva um passo importante na “melhoria do sistema de recolha e validade da prova”, mas nota que ainda demorará bastante até que este instrumento esteja ao dispor das autoridades judiciárias portuguesas. “Todos os documentos aprovadas na UE demoram muito tempo a entrar em vigor. Nesta altura ainda não estão transpostas várias directivas na área da Justiça que foram aprovadas em 2009 e 2010”, exemplifica o procurador.
O diploma agora aprovado prevê ainda em que situações é possível um Estado-membro recusar o pedido de obtenção de provas, o que inclui casos em que o mesmo possa prejudicar “interesses nacionais essenciais de segurança” ou se não for autorizado pela sua lei em processos nacionais semelhantes. A DEI poderá também ser recusada por existir uma imunidade ou um privilégio do visado ao abrigo da lei do Estado que irá executar o pedido ou por existirem regras sobre a limitação da responsabilidade penal no que se refere à liberdade de imprensa e à liberdade de expressão.
Admite-se ainda que o Estado a quem foi feito o pedido possa adiar a sua execução quando esta “possa prejudicar uma investigação ou acção criminal em curso” ou os “objectos, documentos ou dados em causa já estejam a ser utilizados noutro processo”. A autoridade de execução pode ainda recorrer a uma medida de investigação diferente da indicada no pedido, caso essa conduza ao mesmo resultado, “mas utilize meios menos intrusivos”.
Em princípio, o Estado que executa o pedido suporta todas as despesas relacionadas com a execução da DEI, menos das consideradas “excepcionalmente elevadas” como as decorrentes de transcrição e tradução de escutas telefónicas.
Notícia corrigida às 13h21: onde se mencionava Conselho Europeu deve-se ler Conselho da UE