Relação da Suíça com a UE vai a votos num referendo sobre limites à imigração

Os últimos anos foram de abertura à Europa, mas um partido propõe impor limites à imigração, o que pode provocar um recuo.

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Deputados e o presidente dos socialistas, Christian Levrat, em campanha pelo “não” Ruben Sprich/Reuters

A seguir ao Luxemburgo, a Suíça é o país da Europa com mais imigrantes – os estrangeiros são 23% da população de oito milhões. A maioria destes, 66%, vem de países da União Europeia (italianos, alemães e portugueses são os maiores grupos) e de membros do Espaço Económico Europeu (Islândia, Liechtenstein e Noruega).

Desde a entrada em vigor dos acordos de livre circulação da UE com a Suíça, em 2002, todos os anos perto de 80 mil cidadãos dos estados membros têm chegado ao país. Gente que para a direita nacionalista do SVP está a pôr os empregos e os salários dos suíços em risco.

Segundo um relatório da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE), a Suíça é quem mais beneficia da livre circulação. Comparando a receita fiscal obtida com os imigrantes com os custos administrativos, sociais e de infra-estruturas que lhes podem ser imputados, o saldo é positivo: pelo menos 6,5 mil milhões de francos, um número prudente por não incluir dados mais recentes, diz Thomas Liebig, o alemão autor do documento.

Com um desemprego de 3,4%, a Suíça é o país mais competitivo do mundo, diz o Fórum Económico Mundial. Quatro em cada dez novas empresas abertas são fundadas por estrangeiros, que só em 2013 criaram 30 mil novos empregos. E de acordo com o Credit Suisse, um quarto do crescimento no consumo desde 2008 pode ser atribuído aos estrangeiros. “Um posto de trabalho em cada três depende das trocas com a UE. Nas exportações, a Suíça ganha um franco em três com a Europa”, diz a Economiesuisse, organização de todos os sectores económicos do país.

Os estrangeiros, a maioria altamente qualificados, são 22% da força de trabalho. A livre circulação, afirma a Economiesuisse, “permite recrutar na Europa mão-de-obra especializada de que necessitamos e que não se encontra na Suíça”.

A reintrodução de quotas estabelecidas anualmente pelo Governo, como pretende o SVP, dificilmente ficará sem resposta em Bruxelas. “A Suíça não pode ficar só com o que gosta”, avisou Viviane Reding, comissária da Justiça Direitos Fundamentais e Cidadania, em declarações aos media suíços. A livre circulação, explicou, faz parte de um pacote de sete acordos que tanto beneficiam a Suíça, com 430 mil cidadãos a viver em estados membros, como a UE.

Cabeça e coração
O casamento da Suíça com a UE sempre foi problemático e os suíços recusaram a adesão em referendos (1992 e 2001). “A relação já tinha sido muito controversa. Depois, durante um período, normalizou. Mas nos últimos anos assistimos a um novo fenómeno de rejeição, centrado no número de imigrantes, esta direita conseguiu fazer passar a ideia de que eles são responsáveis por muitos problemas”, explica Golder.

“Peço aos suíços que votem com a cabeça e não com o coração”, disse o ministro da Economia, Johann Schneider-Amman. “Se tocarmos na livre circulação ameaçamos os postos de trabalho de cada um.”

Os responsáveis do SVP desdramatizam os riscos de um corte com a UE – o partido da direita nacionalista nunca gostou de Bruxelas. Mais: “Muitos suíços consideram que o seu posto de trabalho está ameaçado ou que estão a concorrer com um estrangeiro para o seu lugar. Isso tem consequências nos salários. É indesmentível! A livre circulação de pessoas está a afundar a classe média”, defendeu numa entrevista ao jornal La Tribune de Genève o vice-presidente, Oskar Freysinger.

Realidade e percepção
Há a realidade e há percepção da realidade. “Há cidades e estradas cheias. Há zonas onde os preços das rendas subiram muito”, diz Golder. Mas não é onde esses problemas mais se fazem sentir que a iniciativa conta com maior apoio: “Pelo contrário, o apoio ao ‘sim’ vem da sociedade rural e conservadora. Nessas zonas, as pessoas ouvem falar dos problemas, da pressão que se sente nalguns sítios, e têm a impressão que a culpa é dos europeus que vieram nos últimos anos. É realmente uma questão de percepção”, afirma o analista do think tank gfs.bern, o mesmo que realizou as sondagens disponíveis.

No país nos referendos, onde com 100 mil assinaturas se faz convocar uma consulta, o SVP especializou-se em campanhas. “A campanha do ‘não’ apostou em sublinhar os riscos de pôr em causa os acordos com a UE. É a estratégia normal, centraram-se no problema que provocas ao votar ‘sim’, não no problema que a consulta diz querer enfrentar. Neste caso pode não chegar, o SVP fez uma campanha muito agressiva”, diz Golder.

Números e minaretes
Na maioria dos cartazes do partido vêem-se macieiras: num deles, há um homem que a derruba e ao lado surge a pergunta “Abater a nossa prosperidade?”; noutro, as raízes da mesma árvore despedaçam o mapa da Suíça.

Também houve um anúncio publicado nos jornais onde surgiam números, estimativas do crescimento da população e da percentagem desta que será constituída por imigrantes nos próximos anos. Nenhum corresponde ao que diz o Gabinete Federal de Estatísticas: em 2060, por exemplo, segundo o SVP, a Suíça terá 16,3 milhões, incluindo 8,2 milhões de estrangeiros; a estimativa oficial aponta para 2,8 milhões de estrangeiros numa população de 11,3 milhões.

E o que dizem, afinal, as sondagens? Que em Dezembro eram 37% os suíços que consideram votar “sim” e que no fim de Janeiro já eram 43% para 50% que diziam ir votar “não”. Não são só os 7% de indecisos que semeiam dúvidas. “Não estamos num cenário normal. Num referendo, o apoio ao ‘sim’ tende a diminuir na campanha. Aqui, foi ao contrário”, diz Golder.

Aconteceu o mesmo em 2009, com o referendo que propunha banir os minaretes, as torres das mesquitas: o “sim” foi ganhando terreno e antes da consulta estava nos 37%. Era um não problema – os muçulmanos eram 4% da população e havia quatro minaretes no país – até à iniciativa do SVP. Quando domingo chegou, os suíços baniram mesmo a construção de minaretes. 

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