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Vacina feita à medida contra vírus infantil com resultados muito promissores

Trabalho cujo principal autor é português validou método que poderá permitir fabricar uma nova geração de vacinas contra vírus como o VIH.

Vírus como o VIH têm-se revelado difíceis de controlar através da vacinação
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Vírus como o VIH têm-se revelado difíceis de controlar através da vacinação Karoly Arvai/REUTERS
Este fragmento viral (a amarelo) encaixado numa proteína artificial construída por computador (a azul) poderá ser o ingrediente-chave de uma futura vacina
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Este fragmento viral (a amarelo) encaixado numa proteína artificial construída por computador (a azul) poderá ser o ingrediente-chave de uma futura vacina Cortesia do Instituto Scripps

Porém, não existe ainda uma vacina contra o VSR, porque os métodos convencionais de fabrico das vacinas actuais não funcionam. Mas agora, Bruno Correia, do Instituto Gulbenkian de Ciência e do Instituto de Tecnologia Química e Biológica (ambos em Oeiras), e colegas nos EUA mostraram ser possível, através de um novo método que alia a biologia molecular ao desenho por computador, desenvolver vacinas eficazes contra este e outros flagelos que até agora tem resistido à vacinação. Os seus resultados foram publicados online nesta quarta-feira na revista Nature.

As vacinas hoje comercializadas contra doenças virais actuam expondo as pessoas a um “simulacro” da infecção real (através da inoculação de um vírus morto, atenuado ou parcial). Isso incita o organismo a criar uma “memória imunitária” contra uma série de fragmentos de moléculas do vírus – e a produzir, mesmo anos mais tarde, anticorpos dirigidos contra esses fragmentos virais e capazes de neutralizar o verdadeiro vírus.

Porém, uma tal estratégia de fabrico de vacinas não funciona com vírus cujos possíveis fragmentos-alvo são muito variáveis devido à sua mutabilidade genética. É o caso do VSR – e ainda do VIH, do vírus da gripe ou do da hepatite C. Todos estes vírus “conseguem dissimular os seus fragmentos moleculares vulneráveis [aqueles que não mudam por serem vitais para o vírus] e mostrar apenas umas estruturas de engodo que se alteram a cada nova geração do vírus”, explica em comunicado o Instituto Scripps (EUA), onde Bruno Correia realizou o trabalho. É fácil perceber que esta táctica defensiva dos vírus reduz drasticamente as hipóteses de a memória imunitária gerada por uma destas vacinas ser duradoura. “Só as vacinas que conseguem estimular artificialmente a produção de grandes quantidades de anticorpos dirigidos apenas contra os fragmentos vulneráveis podem dar origem a uma protecção imunitária lata”, lê-se ainda.

“Lego” molecular
Hoje em dia, os especialistas sabem identificar esses fragmentos virais mais vulneráveis. No sangue de pessoas que foram infectadas por um dado vírus mas que o conseguiram vencer, é possível identificar os raros anticorpos realmente protectores. E a seguir, graças à técnica de cristalografia de raios X, numa espécie de engenharia molecular ao contrário, sabe-se derivar da estrutura dos anticorpos a estrutura dos fragmentos virais que deram origem à produção desses anticorpos.

Só que, por razões ainda não totalmente esclarecidas, mesmo as vacinas à base de fragmentos vitais dos vírus nem sempre incitam o sistema imunitário humano a montar uma resposta realmente protectora.

Uma solução que tem sido proposta para contornar este problema consiste em fixar esses fragmentos virais numa “ossatura” maior – uma proteína já existente – para o sistema imunitário os conseguir “ver” melhor, por assim dizer. Mas até aqui, as tentativas de pôr esta ideia em prática não foram bem-sucedidas, porque essas construções moleculares artificiais revelam-se instáveis dentro do organismo. “Não temos conseguido pegar nessa informação e traduzi-la em vacinas eficazes”, diz Bruno Correia, citado no mesmo documento.

A novidade agora introduzida pelos cientistas foi a utilização de um software especializado, por eles desenvolvido, que permite construir de raiz ossaturas protéicas artificiais de fixação, garantindo que elas “encaixam” o mais naturalmente possível nos fragmentos virais, à maneira de peças de Lego, formando estruturas estáveis.

Para testar a nova abordagem, os autores decidiram construir proteínas artificiais portadoras de um fragmento do vírus sincicial respiratório derivado de anticorpos capazes de neutralizar o VSR. O software produziu 40 mil estruturas possíveis, entre as quais escolheram quatro que pareciam particularmente adequadas.

Quando essas estruturas feitas “à medida” foram administradas a macacos Rhesus, cujo sistema imunitário é muito semelhante ao humano, bastaram cinco doses para 12 dos 16 animais produzir quantias substanciais de anticorpos que depois se revelaram capazes, in vitro, de neutralizar o VSR.

“Isto prova que a tecnologia também poderia ser muito útil contra o VIH, a gripe e outros vírus muito variáveis que têm sido difíceis de controlar com as vacinas de fabrico convencional”, diz o co-autor William Schief, do Instituto Scripps.

Mais: quando analisaram a estrutura de dois anticorpos produzidos pelos macacos, os cientistas descobriram que eram totalmente inéditos. “De facto, os macacos estavam a produzir anticorpos mais potentes que o que é usado para tratar os doentes de alto risco, que foi o anticorpo do qual partimos [para criar as estruturas artificiais], salienta Bruno Correia num comunicado da agência Ciência Viva.

“Os resultados são promissores em vários aspectos”, explicou ainda este cientista ao PÚBLICO. “Com um único epítopo [fragmento-alvo] do vírus fomos capazes de obter anticorpos que neutralizam o vírus. Por isso, penso que que temos uma larga margem para melhorar a eficácia utilizando combinações de moléculas com outros epítopos virais. E há ainda vários parâmetros que poderão ser optimizados no que toca a outros componentes e à administração da potencial vacina.” Segundo o cientista, o trabalho “também demonstra o potencial que estas moléculas têm para aproveitar as capacidades do sistema imunitário na criação de anticorpos com propriedades terapêuticas”, e não apenas preventivas, da infecção.

Quanto a ensaios clínicos, diz Bruno Correia, “são algo que queremos muito fazer, mas como ainda acreditamos que há espaço para optimização, gostaríamos de melhorar o desempenho das nossas moléculas antes de avaliar se um ensaio clínico faz sentido”.

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