Há a antecipação do primeiro acorde. Há a chegada ao palco. Há a euforia da primeira cantoria em comunhão com o artista idolatrado. E depois há os pacóvios que resolvem sacar dos telemóveis para fazer fotos ou vídeos ou o raio que os há-de partir.
Gostava que, num dia cheio de sol, me explicassem o motivo pelo qual se fazem fotografias ou vídeos de telemóvel de um concerto que tem tudo para ser incrível. Também gostava que me mostrassem essas fotos só para ver se se percebe que se trata de um espectáculo dos Metallica em vez de um acidente rodoviário. E — por favor! — deixem-me ouvir um desses vídeos, só naquela de perceber se um concerto mal gravado soa a outra coisa que não sejam sardinhas acabadas de pescar.
Chamem-me obtuso à vontadinha, mas não consigo chegar lá: por que razão se regista um momento num "aparelhócenas" de bolso se o podemos gravar com os olhos e registá-lo na mente para todo o sempre? Ao menos a memória tem uma definição melhorzinha e incomoda menos. Já para não dizer que se desrespeita cada vez mais a arte em si – publicar uma foto de um concerto no Facebook ou no Instagram ou noutro lado qualquer é mais uma promoção pessoal, ao bom estilo “eu estive lá!”, do que propriamente uma apreciação genuína da obra do músico pela qual se pagou uma boa maquia.
Badameco de telefone em riste
Sou frequentador assíduo de concertos e é raro o espectáculo onde não haja um badameco de telefone em riste para apontar à cara do pobre tipo que ali apareceu só para cantar ou dedilhar uma guitarra. Para dizer a verdade, um dos momentos que mais me impressionou aconteceu no final de Agosto de 2012. Estava-se no Coliseu dos Recreios, os tugas The Poppers tinham acabado de dar um bonito arraial de música e a malta aguardava agora pelo Jack White. Vindo de sabe-se lá de onde, surge em palco um rapaz de chapéu que pede um pequeno favor à audiência: “Por favor, não fotografem o Jack. Temos um fotógrafo profissional que faz imagens muito melhores que as vossas. Vão poder fazer o 'download' de borla no site do Jack White. Apreciem o espectáculo”. E sabem que mais? Para espanto de uma carrada de pessoal, a simpatia resultou e o pedido foi acedido. Não vi um telefone aceso nessa noite.
Até podia promover aqui a cultura do calduço a todo o bazaroco que decida erguer o telemóvel para fotografar. De qualquer modo, não gosto de violências, portanto quem estiver incomodado num concerto retribua o incómodo. Tapem-lhe a lente, guardem-lhe o telefone e devolvam-no no final do espectáculo ou simplesmente chamem-nos de azeiteiros. E relembrem-lhe a já antiga história: a tua liberdade tem fronteiras, termina onde começa a dos outros.
E a vocês, caríssimos fotógrafos "wannabe" de espectáculos, estimo bem que prefiram ficar em casa em vez de poluirem as artes com luzinhas desnecessárias. Os músicos não precisam de vós. Por isso, por amor aos deuses do Olimpo, evitem telemóveis em concerto. Quem gosta de música agradece. E a malta que vive em palco também.