Ministério Público pede absolvição para cinco dos oito arguidos no caso do Colégio Militar

Procuradora deixa cair acusação de maus tratos e fala em ofensas corporais simples, o que deixa estarrecido advogado dos queixosos

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Alegações finais do caso do Colégio Militar estão a decorrer esta segunda-feira.

Apesar de considerar provado que os castigos corporais inflingidos causaram lesões que numa das três vítimas são permanentes, a procuradora entendeu que o crime cometido é não de maus tratos, cuja moldura penal vai até aos cinco anos de prisão, mas sim de ofensas corporais simples, punível com cadeia até três anos. Seja como for, tanto o Ministério Público como os advogados que representam os queixosos defenderam, durante as alegações finais, que a pena a aplicar deve ser suspensa, tendo a procuradora sugerido a sua substituição por trabalho a favor da comunidade.

O pedido de absolvição radica no facto de o crime de ofensas corporais ter um prazo para as vítimas apresentarem queixa inferior ao prazo para o crime de maus tratos. Ora um dos queixosos, então com 14 anos, só foi à polícia mais de seis meses depois de ter sido pontapeado e obrigado a fazer exercícios até à exaustão pelos seus colegas mais velhos. Estes abusos custaram-lhe 22 dias de faltas por doença e internamento, problemas mesmo assim menores do que a perfuração do tímpano que sofreu um colega um ano mais novo na sequência de uma chapada que levou à frente dos outros alunos, e da qual ainda hoje tem sequelas. Os factos remontam a 2006, 2007 e 2008, não tendo sido constituídos arguidos nenhum dos então directores do Colégio Militar, que era quem deixava os alunos mais novos frequentemente entregues aos poderes disciplinares dos mais velhos. “Nos seus depoimentos os médicos disseram que a vida das vítimas não correu perigo”, alegou a procuradora para justificar o pedido de condenação de três dos ex-alunos apenas por ofensas corporais simples. Mas esta não foi a opinião dos advogados das vítimas. “O meu cliente teve a vida em perigo. Teve a sorte de ir parar ao hospital”, observou José António Barreiros, citando o despacho de pronúncia, no qual se diz que qualifica a violência dos alunos mais velhos, que tinham entre 17 e 22 anos, como “repugnantes e indignos”. A acusação de que desiste o Ministério Público no final deste julgamento havia sido qualificada pelo ex-Procurador-Geral da República Pinto Monteiro como tendo sido “uma acusação bem feita”.

A humilhação subjacente aos castigos corporais aplicados no Colégio Militar também não passou despercebida aos advogados das vítimas. José António Barreiros lembrou como os alunos eram qualificados como “baldes de merda” enquanto eram punidos, de modo a cumprirem os castigos até ao fim. E admitiu sentir que o julgamento pode ter sido totalmente inútil. Já o outro advogado da acusação, Garcia Pereira, qualificou como sendo “de estarrecer” a posição do Ministério Público. “É preciso o tribunal transmitir à sociedade e ao Colégio Militar que barbaridades destas não são toleráveis”, avisou, argumentando os castigos eram decididos horas antes e só depois aplicados, e não fruto de uma qualquer discussão acalorada entre os estudantes. “Havia um ambiente de terror”, descreveu, acrescentando que, depois de se queixarem às autoridades, os alunos mais novos – alguns tinham apenas dez e onze anos – e as respectivas famílias começaram a receber ameaças telefónicas em casa e a serem alvo de perseguições. “A Polícia Judiciária Militar perguntava permanentemente pelo estado do processo. Só parou quando fui falar com o Procurador-Geral da República”, contou Garcia Pereira.
 

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