Moradores contra construção de condomínio privado no bairro da Madragoa
Um grupo de moradores entregou uma reclamação à Câmara de Lisboa. Em causa está a construção de um condomínio privado, que implicará a demolição da antiga fábrica de azulejos Constância. Autarquia contesta as críticas.
O plano para aquela área, delimitada pelas ruas das Janelas Verdes, Garcia de Orta e São Domingos à Lapa, implica a demolição da Fábrica Constância, produtora de peças de cerâmica e azulejos, fundada em 1836 e desactivada nos anos 1980.
As instalações da antiga fábrica, actualmente em estado de pré-ruína, estão incluídas na Carta de Património Municipal - um documento não vinculativo, no qual constam imóveis não protegidos, mas que devem ser tidos em conta em operações urbanísticas. As previsões do plano implicam ainda a demolição de um outro edifício na Rua das Janelas Verdes, do qual será conservada apenas a fachada.
O condomínio ocupará uma área de 11 mil metros quadrados e terá, segundo o blogue O Corvo, 43 habitações duplex e 12 apartamentos. O espaço da antiga fábrica é propriedade do Fundo Imobiliário Fechado Imoconvento, gerido pela sociedade Selecta, administrada por António José de Melo. Segundo o mesmo blogue, o projecto de arquitectura já foi aprovado pela câmara, faltando apenas deferir os projectos das especialidades (fundações, redes de águas e outros) para que o processo de licenciamento seja concluído.
Os subscritores da reclamação - um extenso documento com um total de 35 páginas que foi apresentado publicamente na reunião de câmara do dia 18 de Dezembro - sustentam que esta operação não promove um “desenvolvimento urbano harmonioso” da zona. De acordo com os moradores, o projecto possui algumas características que desvirtuam a área envolvente, um bairro histórico de Lisboa, não cumprindo o Decreto-Lei 380/99, segundo o qual as unidades de execução “deverão ser delimitadas de forma a assegurar um desenvolvimento urbano harmonioso”.
Entre as razões invocadas pelos adversários do projecto está a altura dos edifícios, uma vez que o plano prevê que o condomínio chegue aos quatro pisos, quando a maioria dos prédios circundantes têm apenas dois. Além disso, os moradores e proprietários vizinhos contestam a configuração do empreendimento, que dizem ser "uma massa edificada uniforme”, que não se enquadra na “tipologia de construção da zona” histórica.
Outras das preocupações manifestadas diz respeito à construção de garagens, que implica a escavação de dez metros em profundidade, para assegurar um total de três pisos subterrâneos de estacionamento. Para os promotores da reclamação, o facto de a zona da antiga fábrica estar classificada como “complexo vulcânico” na Planta de Caracterização Física e Geológica do Plano de Urbanização do Núcleo Histórico da Madragoa significa que os edifícios que aí se situam podem ser afectados por “movimentos de terra e estrondos”.
O volume de trânsito na Rua das Janelas Verdes é também alvo de observação, uma vez que, nessa artéria, actualmente com duas vias de circulação, está prevista a abertura de uma entrada para o parque de estacionamento do condomínio, o que, para os moradores, poderá originar situações de congestionamento de tráfego.
O planeamento deste condomínio prevê ainda a criação de um espaço verde e de um equipamento público, não especificado, no interior do quarteirão. Apesar de esta ser uma ideia que os reclamantes consideram “premente e urgente” na zona da Madragoa, os mesmos entendem que não existem condições de acessibilidade para que a população idosa possa frequentar o local. Quem habita na Rua das Janelas Verdes terá que subir um conjunto estreito de escadas e quem for pela Rua de Garcia de Horta terá que passar por um caminho apertado, através de um túnel.
Em resposta à reclamação, Manuel Salgado, vereador do Urbanismo na Câmara de Lisboa, disse na reunião de câmara do dia 18 que as questões levantadas não tinham ”razão de ser”.
Em relação aos imóveis que fazem parte da antiga Fábrica Constância, o autarca afirmou que, tanto a Estrutura Consultiva do Plano Director Municipal, como a Direcção-Geral do Património Cultural, deram pareceres favoráveis “à não qualificação desses edifícios como valores patrimoniais”.
Finalmente, sobre a alegada falta de harmonia do empreendimento em relação à zona envolvente, Manuel Salgado declarou que essa é a opinião dos reclamantes, salientando que, ao contrário deles, “os serviços [camarários] entendem que ele é harmonioso”. “Está a ser preparada pelos serviços uma resposta detalhada, ponto a ponto, rebatendo a reclamação”, concluiu o vereador.