A Propósito de Llewyn Davis

Uma boa ideia para o cenário: a Greenwich Village do absoluto princípio dos anos 60, a “cena folk” estagnada, fechada em si mesma, à espera da chegada de Bob Dylan. Mas embora seja uma coisa que passe pelo filme (os jantares em casa dos amigos do protagonista, onde os Coen entram em território Woody Allen), o que interessa aos autores é menos o retrato da época ou a crítica dos meios intelectuais novaiorquinos e mais a “odisseia” de Llewyn Davis (há um gato chamado Ulisses, para deixar tudo claro), em luta contra o atavismo, a inércia e o fracasso. A sequência da viagem a Chicago, com a personagem do gordíssimo John Goodman a lembrar que afinal nunca se chega a sair do território Coen, resume o carácter digressivo e circular do filme, resolvido no off do “negro” final (quando Dylan chega a tempo de acompanhar os créditos de fecho). Se tentássemos contar a história, facilmente pareceria o mais angustiado filme dos Coen; e no entanto, no filme, isso é uma coisa que não passa, que se sente que devia estar lá, que queria estar lá, mas simplesmente não está — demasiada irrisão, talvez, mas a roer a alma ao filme. Ainda assim, nada tem de irritante, o que está longe de ser garantido por todos os filmes dos irmãos.

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