Nova vaga de prisões de apoiantes da Irmandade Muçulmana
Confrontos das últimas horas fizeram dois mortos. General Sisi avisa que os militares "eliminarão" os que querem desestabilizar o país.
As detenções começaram pouco depois de um atentado que, quinta-feira de manhã, provocou cinco feridos no Cairo. A explosão, que atingiu um autocarro, foi a primeira a visar propositadamente civis desde o golpe militar que em Julho derrubou Mohamed Morsi, dirigente da Irmandade e o primeiro Presidente democraticamente eleito do Egipto.
Dois dias antes, um atentado suicida matou 15 pessoas numa esquadra da cidade de Mansoura, numa acção reivindicada por um grupo jihadista do Sinai. O movimento islamista repudiou ambos os ataques, mas o governo interino, sob tutela dos militares, assegura que é ele quem está na sua origem, com o objectivo de desestabilizar o país.
“Não deixeis que estes actos terroristas vos afectem”, apelou o general Sissi durante uma cerimónia militar, 24 horas depois de a Irmandade ter sido oficialmente declarada “organização terrorista”. Sisi, que é em simultâneo ministro da Defesa, diz que “o Exército se sacrificará pelo Egipto” e acrescenta que só ele será capaz de conduzir o país “no caminho da estabilidade, da segurança e do progresso”.
Pouco depois, o aviso começou a materializar-se: o Ministério Público anunciou ainda na quinta-feira a detenção de 18 militantes da Irmandade, acusados de ligação a uma organização terrorista, entre eles o filho de um alto quadro do movimento em Alexandria. Já nesta sexta-feira foi noticiada a detenção de outros 14 militantes em Gizé, um subúrbio do Cairo, pelo mesmo crime e um responsável da polícia disse à AFP que 148 pessoas foram detidas em todo o país por se estarem a manifestar.
Ao abrigo da severa lei antiterrorista egípcia, aprovada em 1992 por Hosni Mubarak, a pertença a um grupo terrorista é punível com prisão perpétua, que no caso dos dirigentes pode mesmo transformar-se em pena de morte. Quem, a partir de agora, participar numa manifestação convocada pela Irmandade ou for apanhado com panfletos do movimento arrisca uma pena de cinco anos de prisão. O governo decretou ainda o arresto dos bens da rede de associações caritativas da Irmandade, a proibição definitiva do seu jornal oficial e do partido Justiça e Liberdade que criou após a revolução de 2011 e com o qual venceu as legislativas do ano seguinte.
Egipto dividido
A nova vaga de repressão – depois da que em Agosto fez mais de mil mortos e decapitou aquele que foi durante décadas o mais poderoso e organizado movimento político egípcio – arrisca desestabilizar ainda mais um Egipto já muito dividido.
Ecoando as acusações do governo, dezenas de pessoas saíram à rua após os atentados dos últimos dias aos gritos de “os irmãos muçulmanos são cães”. Nas cidades e nos bairros onde o movimento islamista mantém a influência, renovam-se os apelos à mobilização contra os putchistas. "Prossigamos com força e de forma pacífica uma nova vaga de acções majestosas contra o golpe de Estado", apela um comunicado da aliança anti-golpe, liderada pela Irmandade.
Desafiando a proibição, estudantes islamistas manifestaram-se quinta-feira à noite no campus da universidade de Al-Azhar, a mais prestigiada do Egipto, acabando por envolver-se em confrontos com moradores da zona que apoiam o governo. O Ministério do Interior adianta que uma pessoa morreu ao ser atingida por disparos de caçadeira.
Os confrontos regressaram depois das orações semanais desta sexta-feira, onde a polícia usou gás lacrimogéneo para dispersar estudantes islamistas. Um jornalista da AFP viu fumo negro a sair de um dormitório do campus, de onde estudantes lançavam pedras contra a polícia. A Reuters adianta que dois pequenos cortejos foram barrados pela polícia nos subúrbios do Cairo e há também notícias de confrontos nas cidades de Ismailia, no canal do Suez, e em Damietta, no Delta do Nilo. A agência adianta também que uma pessoa terá morrido em confrontos entre apoiantes e opositores da Irmandade na cidade de Samalut, no Sul do país.