Crítico Kenneth Frampton ganha prémio carreira da Trienal de Lisboa

Fez a primeira divulgação crítica relevante da arquitectura portuguesa no mundo anglo-saxónico.

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Kenneth Frampton em 1998 em Lisboa Dulce Fernandes/Arquivo

Autor das obras Modern Architecture, a Critical History e Studies in Techtonic Culture, Frampton nasceu no Reino Unido em 1930, onde se formou na Architectural Association School of Architecture, e é actualmente professor na Universidade de Columbia, nos EUA, onde vive. Já esteve várias vezes em Portugal, a onde regressará em Janeiro, em data a anunciar, para receber o prémio e dar uma conferência no Centro Cultural de Belém (CCB), em Lisboa.

"É um excelente desfecho para esta edição da trienal, dar o prémio carreira a alguém que tem dedicado a sua vida ao pensamento e à cultura arquitectónicos, demonstrando mais uma vez que a arquitectura não vive só de obras feitas", comenta André Tavares, director do Jornal Arquitectos e coordenador da editora Dafne, lembrando que a Trienal de Lisboa encerra este domingo depois de três meses de programação. "O prémio é justo e merecido", diz também Jorge Figueira, crítico de arquitectura do PÚBLICO.

Frampton, acrescenta André Tavares numa resposta por e-mail, teve um papel determinante no pensamento arquitectónico dos anos 80 e 90, "propondo caminhos alternativos para a arquitectura não se transformar num mero serviço técnico ou burocrático, ou numa simples feira de vaidades". Resgatou uma certa ideia de cultura arquitectónica, contribuindo "de forma decisiva para ancorar essa cultura arquitectónica à prática construtiva e à história, instigando os arquitectos a pensar a sua relação com o lugar".

O prémio, que este ano teve como júri Beatrice Galilee (curadora-geral da trienal), Gonçalo Byrne, Guilherme Wisnik, Juhani Pallasmaa, Mónica Gili, Taro Igarashi e William Menking, já foi atribuído em 2007 ao arquitecto italiano Vittorio Gregotti (co-autor com Manuel Salgado do CCB) e na última edição, em 2010, a Álvaro Siza.

A obra teórica mais conhecida de Frampton — Modern Architecture, a Critical History — foi publicada em 1980, várias vezes revista, e é nela que desenvolve o conceito de "regionalismo crítico".

Embora o termo tivesse sido cunhado por Alexander Tzonis e Liliane Lefaivre para a arquitectura grega, é Frampton que o torna célebre. André Tavares é cauteloso quando fala sobre o papel do conceito na internacionalização da arquitectura portuguesa: "O ‘regionalismo crítico’ é uma ideia difusa e presta-se a muitas interpretações e usos que nem sempre coincidem com o cunho original da expressão. Frampton usou essa noção num contexto americano para enquadrar uma arquitectura de periferia capaz de resistir a pressões mundanas, demonstrando que era possível construir arquitectura contemporânea sem negar a história, a cultura dos lugares, o conhecimento construtivo que se sedimenta ao longo do tempo."

Na entrevista que deu ao PÚBLICO na altura da Expo-98 em Lisboa, o próprio Kenneth Frampton explicou o que via na arquitectura portuguesa: "É um forte sentimento pela paisagem. Esse sentimento partilha-o, de algum modo, com Espanha — a manipulação da superfície da terra e a integração do edifício no solo. É uma característica muito própria e um elemento que se destaca no conjunto da arquitectura europeia."

Aliás, a obra Studies in Tectonic Culture, publicada em 1995, é uma reflexão sobre os modos construtivos dos séculos XIX e XX e o seu impacto na concepção arquitectónica. "O trabalho mais subtil e crítico está hoje na obra de pequena escala, relacionada com uma cultura de construção. É neste contexto que integro a obra de Siza. O interesse da periferia inscreve-se assim no seu sentido crítico e não no seu serviço ao poder", disse na mesma entrevista.

Jorge Figueira explica, também por e-mail, que Frampton "significa" uma primeira validação da arquitectura portuguesa, especialmente a do Porto, pelo mundo anglo-americano. "Faz uma distinção entre ‘lugar’ e ‘produção’, entendendo a arquitectura como ligada à ‘criação de lugar’ em detrimento da ‘produção’ cuja associação à ‘indústria’ significa uma ‘indiferença aos lugares’ que é ‘destrutiva de culturas enraizadas’."

Podemos argumentar, defende o crítico do PÚBLICO, que Siza não é um arquitecto "regionalista", mas universalista. Para Frampton, "a Escola do Porto e Álvaro Siza, em particular, representam uma ‘cultura de resistência’ que se opõe à voracidade de uma já pressentida globalização". Pragmaticamente, a obra de Siza serviu para Frampton sustentar a sua oposição crítica, nomeadamente ao pós-modernismo.
 
 
 

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