PCP e BE acusam Governo de desdenhar a pobreza em que o país vive

Passos cita Gaspar para dizer que há “hipocrisia institucional” na relação do FMI com Portugal.

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Daniel Rocha

O discurso, muito parecido, foi seguido pelo PCP, Bloco e Verdes no debate quinzenal que decorreu esta sexta-feira de manhã no Parlamento. “Intervenções como a que fez só desconsideram as dificuldades que os portugueses sentem”, começou por dizer Jerónimo de Sousa sobre o desfiar de números da intervenção inicial de Pedro Passos Coelho.

“Acha que a sua política e a execução do pacto de agressão está a ser um êxito, que estamos no bom caminho. Escolheu bem o dia: uma sexta-feira 13. Acerte o debate para o 1 de Abril, que é o dia das mentiras, que justifica melhor a sua intervenção”, disse o líder comunista ao primeiro-ministro. E acrescentou que a “propaganda distorcida confronta e afronta a realidade em que vivemos”.

Jerónimo de Sousa realçou depois, como António José Seguro fizera antes, o crescimento do número de multimilionários e, ao mesmo tempo, do número de portugueses em risco de pobreza (2,7 milhões de pessoas). “Ainda se atreve a vir aqui dizer que os sacrifícios têm sido equitativos?”

“Ontem confirmou na entrevista que o saque às pensões é para continuar e perpetuar. Depois da sua governação, os trabalhadores trabalham mais e recebem menos”, apontou o líder comunista que se lançou a enumerar as contradições do discurso de Passos com a realidade do país. “Diz que o desemprego abranda, mas não diz que a emigração de jovens cresceu. Fala da criação de emprego, mas é o seu Governo que se prepara para despedir milhares de funcionários públicos e 600 trabalhadores dos Estaleiros de Viana, e ser o autor do desemprego em massa."

O país, avisou Jerónimo, “pulsa de indignação” porque esta política está a conduzir o país para o desastre”.

Em resposta, Passos considerou que “não pode ser um desastre o facto de o país estar a caminhar para encerrar o programa de ajustamento”, garantiu que “não desconsidera a situação muito difícil em que o país vive, que é um drama extraordinário”. “É para evitar que essas situações se perpetuem, que é indispensável vencer esta crise, terminar o programa de assistência económico-financeira e partir para outra. Que não é com certeza o éden ou o céu na terra”, avisou.

Jerónimo de Sousa fez questão de vincar as diferenças entre si e o primeiro-ministro, dizendo que Passos “recusa a realidade do país” e que “fala dos sacrifícios com aquela compreensão beata, não se zangue com o termo, de que vai surgir uma fénix renascida das cinzas que o Governo está a criar”. O líder comunista pegou no facto de o primeiro-ministro ter dito que não se preocupa com as manifestações para o acusar de se preocupar apenas “com os mercados, os mega-bancos e as instituições financeiras”. E para dizer que o “desejo de final de ano de muita gente vai ser o de ver o Governo pelas costas, com a convocação de eleições antecipadas”.

Passos Coelho não se ficou: “Aquilo que nos distingue é que eu tenho a responsabilidade de governar e o senhor de fazer oposição ao Governo. Eu estou a adoptar as decisões para que Portugal saia da crise e conclua o programa. Eu não me lamento. Eu estou a fazer todos os dias alguma coisa para que a situação se altera, e isso é que nos distingue.”

Quem paga a crise é quem menos pode, dizem os Verdes
Heloísa Apolónia, dos Verdes, realçou que o “fosso entre ricos e pobres continua a aumentar”, o que significa que “quem está a pagar a crise é quem pode menos”. O país, acrescentou, vive uma bola de neve que só tem trazido mais desemprego e empobrecimento. A deputada quis saber quando o Governo tenciona repor salários e pensões.

Pedro Passos Coelho considerou a referência à bola de neve como “a nova versão da espiral recessiva”, e contrariou tal imagem, respondendo, mais uma vez, com a recuperação da economia que se vive desde o segundo trimestre. “Os ricos pagam proporcionalmente muito mais que todos os outros, o que me parece justo”, disse o primeiro-ministro, desafiando a deputada a apresentar uma proposta para “alguma taxa de imposto que considera mais justa, provavelmente superior a 50%”.

Realçando que as reformas e pensões mais elevadas são mais cortadas que as outras, Passos disse não poder, no entanto, "fazer confisco”. “O que fazemos é proporcionado e equitativo por toda a sociedade. Iremos repor salários e pensões na medida em que o crescimento da economia nos permitir.”

“Os mercados e a troika têm mostrado alguma preocupação com a pobreza em Portugal? Não. Mas o que é pior é que o Governo também não aparenta qualquer preocupação. É de pobreza que lhe estou a falar sr. primeiro-ministro. Acorde de uma vez por todas”, rematou Heloísa Apolónia.

Catarina Martins, a coordenadora do BE, orientou as perguntas ao Governo para a experiência-piloto com o cheque-ensino que diz estar previsto no Orçamento do Estado, com uma verba de 19,4 milhões de euros. Apesar da insistência da bloquista, cujo partido até fez distribuir uma página do orçamento, Passos recusou sempre que o orçamento contemple o cheque-ensino.

A deputada bloquista pediu também ao chefe de Governo que explicasse o significado de ter dito que ouviu com “estranheza” as declarações da directora do FMI, Christine Lagarde que admitiu que Portugal deveria ter tido mais tempo para a consolidação orçamental. “O senhor ex-ministro Vítor Gaspar disse um dia, a propósito de declarações idênticas da senhora Lagarde, que havia alguma hipocrisia institucional nestas instituições e não posso deixar de dizer o sr. professor Vítor Gaspar estava cheio de razão", respondeu Passos.
 

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