Nadir Afonso (1920-2013): o pintor das leis que regem as formas simples

Foi um pioneiro da abstracção geométrica em Portugal. Deixa uma obra singular e fundamental para o estudo do modernismo no nosso país.

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"Espacillimité" (máquina cinética) c.1956 Cortesia Museu do Chiado
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Nadir Afonso no Rio de Janeiro em 1952 Cortesia Museu do Chiado
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"Composição Geométrica", c. 1947, col. Fundação Nadir Afonso" Cortesia Museu do Chiado
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Nadir Afonso aos 52 anos Cortesia Museu do Chiado
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Nadir Afonso com máquina cinética em 1958 Cortesia Museu do Chiado

Nadir Afonso nasceu a 4 de Dezembro de 1920, em Chaves. Aos 18 anos ingressou na Escola de Bela- Artes do Porto, no curso de Arquitectura. Realizou a sua primeira exposição individual em 1939, e nos anos seguintes desenvolveria uma obra próxima do expressionismo e do surrealismo que, nos dizeres do historiador de arte José-Augusto França, possuía uma “atmosfera misteriosa, por vezes próxima de Max Ernst.”

Em breve, esta linha de trabalho iria mudar radicalmente. Muito próximo do grupo de artistas que, no Porto e a partir de 1945, incluía Fernando Lanhas, Artur Fonseca, Gariso do Carmo e Arlindo Rocha, introduziu a abstracção geométrica em Portugal, sobretudo através das Exposições Independentes que, na mesma cidade, os juntaram entre 1945 e 1950.

Era a resposta geometrizante à figuração neo-realista e à abstracção gestual que, dois anos depois, se veria na exposição dos surrealistas Fernando de Azevedo, Fernando Lemos e Vespeira, realizada em Lisboa.

Nadir Afonso nunca abandonou completamente estes seus começos abstractos, mesmo se a sua obra, nos últimos anos, se concentrou na representação de paisagens urbanas estilizadas por uma grelha geométrica. A formação de arquitecto e os contactos que soube estabelecer com nomes grandes da arquitectura internacional ajudam, e muito, a compreender a razão pela qual um jovem de pouco mais de vinte anos, num país que não era conhecido pela sua abertura aos movimentos artísticos internacionais, se impôs com uma obra totalmente diferente da maioria dos artistas seus contemporâneos.

Em 1946, obtido o diploma de arquitecto, Nadir Afonso partiu para Paris para estudar pintura. Aqui, por intermédio do muralista Portinari, conseguiu uma bolsa de estudo do Governo francês para ingressar na École des Beaux-Arts, e paralelamente começou a trabalhar com o arquitecto Le Corbusier, primeiro até 1948, e mais tarde, em 1951. Chegou a colaborar num dos projectos mais conhecidos do mestre franco-suíço, a Cité Radieuse de Marselha. Ao mesmo tempo, pintava no atelier de Léger, pintor francês também conhecido pela sua colaboração com Le Corbusier na revista L’esprit nouveau. Em 1952 mudou-se para o Brasil para trabalhar com outro grande protagonista da arquitectura moderna, Óscar Niemeyer. Permaneceu neste país dois anos, sobretudo para colaborar no projecto do Parque Ibirapuera, em S. Paulo.

Consagração nos anos 60

De novo em Paris, dedica-se à pintura, iniciando um período extremamente frutífero da sua obra. Na galeria Denise René, com quem trabalha, conhece artistas que possuem já nome firmado na abstracção geométrica do pós-guerra; Pedro Lapa, referindo-se a esta instituição, chama-lhe “o centro das vanguardas construtivistas do pós-guerra em Paris”. Com Vasarely e Auguste Herbin, e ainda com o músico Xenakis (que era também arquitecto), encontra o ambiente propício à criação de obras cinéticas, onde a pintura se transforma em movimento e pura impressão visual. É desta altura a série Espaceillimité, que apresenta no Salon des Réalités Nouvelles de 1958. O ano seguinte será o da sua primeira exposição antológica, na Maison des Beaux-Arts da capital francesa.

Os anos 60 são os anos da consagração. Representa Portugal na Bienal de S. Paulo (1961 e 1969), recebe os prémios Nacional de Pintura (1967) e Amadeo de Souza-Cardoso (1969), e no ano seguinte tem uma retrospectiva na Gulbenkian. Entretanto, a par da pintura, publica regularmente obras de reflexão estética. Entre as quase duas dezenas de títulos da sua autoria, salientamos La Sensibilité Plastique (1958) e Les Mécanismes de la Création Artistique (1970). Em todos, salienta a sua procura do absoluto e da harmonia através da cor e da geometria, uma demanda que partilha com muitos outros artistas modernistas – citemos apenas o Almada Negreiros dos últimos anos e a sua pesquisa sobre o Número de Ouro.

Em meados dos anos 60, já depois de amplamente reconhecida a sua contribuição para a arte moderna portuguesa, passou a dedicar-se exclusivamente à pintura. Contudo, os tempos eram já outros, e as paisagens urbanas geometrizadas que então realizava acusavam uma distância marcada em relação às linguagens desenvolvidas internacionalmente nessa época, ora na sequência da pop art, ora do minimalismo norte-americano.

Nadir tinha também por hábito refazer interminavelmente cada projecto, nunca o dando por terminado: era costume vê-lo, na montagem das muitas exposições que realizou, de pincel na mão a retocar quadros já pendurados na parede. Vivia em Cascais, isolado das mundanidades da arte.

Continuava a achar que a harmonia da pintura e a harmonia do mundo nada tinham a ver uma com a outra. Numa entrevista ao PÚBLICO em 2009, afirmava que nada o faria sair das leis que encontrara “nas formas da natureza, nas formas simples”. Considerado por todos como um nome fundamental do modernismo em Portugal, e mesmo um dos primeiros no nosso país a acertar a progressão da obra própria com a arte internacional, recebeu em 2010 o oficialato da Ordem Militar de Santiago e Espada. Teve exposições em alguns dos mais importantes museus portugueses, salientando-se a que realizou no Museu do Chiado, em Lisboa, e no Museu de Soares dos Reis, no Porto, no mesmo ano. Já no fim da vida, em 2009, deu-se início à construção da Fundação Nadir Afonso, em Chaves, cujo projecto é da autoria de Siza Vieira.
 
 

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